Braskem: nova etapa no TCU não afeta apetite de interessados pela empresa (Braskem/Divulgação)
Publicado em 27 de julho de 2023 às 17h09.
Última atualização em 28 de julho de 2023 às 14h25.
As tratativas entre a Braskem (BRKM5) e o poder público seguem intensas. Depois de anunciar, semana passada, um acordo de R$ 1,7 bilhão com a prefeitura de Maceió (dos quais R$ 700 milhões já estavam provisionados no balanço) a companhia enfrenta agora o desenrolar de um processo que tramita, em sigilo, no Tribunal de Contas da União (TCU). O motivo são danos causados a quatro bairros da capital alagoana pela extração de sal-gema, matéria-prima da produção de PVC.
A ação que tramita no TCU foi apresentada pelo senador Renan Calheiros em maio deste ano. Dentre outros pontos, questiona o potencial dano ambiental causado pela Braskem e a necessidade de uma compensação financeira ao estado de Alagoas e a prefeituras, segundo fontes próximas ao processo ouvidas pelo EXAME IN.
A reportagem apurou que consta no processo um pedido de medida cautelar para que seja paralisada qualquer movimentação acionária antes de a companhia resolver esses possíveis passivos. Alagoas estima que o prejuízo causado pela Braskem ao estado seria de mais de R$ 10 bilhões, montante que considera tanto perdas com a arrecadação de ICMS quanto indenizações a outros municípios que foram afetados pelo afundamento do solo. Colocando essa cifra em perspectiva, corresponde a aproximadamente 15% do PIB do Estado em 2020.
É desse pedido de medida cautelar que vem a possibilidade de o Tribunal paralisar as negociações de venda da participação da Novonor na companhia, notícia que movimentou o mercado na última semana.
Ao que tudo indica, o governo do estado está cada vez mais comprometido em fazer com que essa decisão seja tomada em breve. Nesta quarta-feira, 26, o governador do estado, Paulo Dantas, se reuniu com o ministro Aroldo Cedraz, relator do processo no TCU, e com Bruno Dantas, presidente do TCU.
O processo, importante frisar, ainda tem um longo rito a ser cumprido. Primeiramente, o relator precisa emitir um parecer que vai definir se a ação seguirá para o próximo passo ou não (aqui, não é julgado o mérito, mas sim se a ação preenche todos os requisitos necessários para ser analisada pela Corte).
Aceito o processo pela Corte, caberá ao relator decidir se acatará ou não a medida cautelar contra a empresa, que pode interromper as negociações de venda da participação da Novonor na Braskem. Depois dessa primeira etapa, o processo passa por análise de uma unidade técnica, formada por auditores do TCU, e por uma avaliação do colegiado de ministros. Só então se chegará a um veredito sobre o tema.
Com a medida cautelar batendo à porta, crescem as dúvidas sobre o futuro da Novonor, que quer uma resolução para a situação da Braskem ainda este ano – de olho em abrir a porta de saída de sua recuperação judicial. Para fontes próximas às negociações de compra da fatia da empresa na Braskem, o desenrolar do processo no TCU mexe pouco -- por ora -- no ponteiro do interesse pela compra dos papéis. Afinal, o passivo com Maceió já fazia parte das propostas. Já para analistas, a insegurança com o papel permanece, na esteira do risco de novos processos contra a empresa surgirem ao longo do tempo.
Entender a contenda entre a Braskem e Alagoas, que se arrasta desde 2018, passa por enumerar três frentes simultâneas: com o município, com o estado e com o governo federal. Em 2020, a empresa assinou um acordo com as defensorias públicas do estado e da União, com os ministérios públicos federal e de Alagoas para atender, via programa de compensação (PCF) e realocação, os moradores de áreas de risco de quatro bairros de Maceió. Um aditivo foi assinado no mesmo ano, ampliando a desocupação nos mesmos bairros.
De lá para cá, a empresa já distribuiu, só às vítimas, R$ 3,7 bilhões, por meio do PCF, isso sem contar o R$ 1,7 bilhão anunciado na semana passada, em um acordo firmado pelo município sob o comando de João Henrique Caldas. Até agora, o programa já contemplou 91% dos moradores e comércios afetados pelo afundamento do solo de Maceió.
A provisão total da empresa para o incidente em Maceió é de R$ 13 bilhões, dos quais R$ 6 bilhões já foram pagos, resultado dos acordos feitos pela empresa com o poder público desde 2020. Há três anos, vale lembrar, a Braskem firmou, além do acordo para indenização das vítimas, um aditivo, com o Ministério Público Federal e MP de Alagoas para reparação socioambiental das áreas afetadas pelo afundamento. De acordo com as informações disponíveis no site da empresa, o acordo prevê a execução de medidas relacionadas à estabilização e monitoramento, até 2025, do fenômeno geológico e ações direcionadas à mitigação e reparação dos impactos ambientais, urbanísticos e sociais dessa região.
Em nota, a companhia afirma que: "No Termo de Acordo Socioambiental firmado com o Ministério Público Federal, com participação do Ministério Público do Estado de Alagoas, a Braskem se compromete a não edificar nas áreas desocupadas, para fins comerciais ou habitacionais. Discussões futuras sobre a área e sua utilização poderão ser feitas a partir do Plano Diretor do Município, instrumento amplamente debatido pelas autoridades e a sociedade, ou seja, em nenhum momento a decisão sobre o futuro da área caberá exclusivamente à Braskem".
A visão de fontes próximas ao EXAME IN é que esses acordos foram insuficientes para indenizar o Estado pelo prejuízo. Em 2020, o governo (então chefiado por Renan Filho) conduziu estudos para dimensionar o impacto que a empresa teve para além da esfera municipal. De acordo com fontes próximas a esse processo, a conclusão foi a de que a Braskem gerou um impacto negativo de R$ 3 bilhões em ICMS com o afundamento do solo na região, isso sem falar em danos às estações de tratamento de água e de gás na região, bem como nos trilhos da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU).
A alegação do estado é que mais de 100 municípios foram afetados negativamente. E o argumento estadual é o de que o acordo firmado pelo município foi muito menor do que o necessário para cobrir todas as perdas. Portanto, ainda haveria espaço para compensações.
Atualmente, três interessados já se manifestaram para comprar a participação da Braskem detida em garantia por cinco bancos. Primeiro, os fundos Apollo e Adnoc, que ofereceram, na proposta mais atualizada, R$ 47 por ação, e planos de estender a oferta tanto à Petrobras (a outra sócia relevante) quanto aos minoritários. A oferta é a única que não impõe cortes na dívida da Novonor com os bancos.
Depois, veio a petroquímica Unipar, com oferta de R$ 10 bilhões por 34,3% da participação da Novonor detida na Braskem, com outros 4% sendo destinados à própria Novonor. Ainda não há uma definição a respeito do desenho final da operação, como esse valor será financiado pela empresa de cloro-soda, mas existem algumas opções. Segundo pessoas próximas ouvidas pelo EXAME IN, a empresa já conseguiu cartas de apoio de financiamento de cinco instituições financeiras, entre elas Itaú e Citi. Outra parte dos recursos viria da própria geração de caixa futura da Braskem.
Para quem acompanha os papéis da Unipar, a visão é de que uma boa opção seria a empresa comprar uma Braskem “fatiada”, com só alguns ativos que interessam à empresa, em vez de partir para a compra da companhia por inteiro.
E, por último, veio a holding J&F. A oferta também está sendo analisada pelo mercado e vista como atraente, na terceira vez que a empresa tenta adequirir a Braskem.
Esse é só o contexto mais recente de um ativo que está à venda desde 2017. Desde então, a holandesa LyondellBasell já esteve a ponto de fechar negócio, antes mesmo da recuperação judicial da Novonor. A coisa não andou por uma avaliação de que os papéis pudessem ficar mais baratos no futuro. Nos últimos cinco anos, as ações da Braskem caíram pela metade, na bolsa. Em meio à acirrada disputa por uma fatia relevante na empresa, o imbróglio entre Braskem e o Estado permanece cada vez mais indefinido.