Siderurgia: sobras de uns, receita para Rolth, que some com os rejeitos empilhados no pátio das empresas (Akos Stiller/Bloomberg)
Graziella Valenti
Publicado em 15 de junho de 2022 às 09h43.
Dedicada a investimentos de impactos, a gestora GK Ventures, do ex-Tarpon e fundador do Renova BR Eduardo Mufarej, tem uma história reconhecida no setor de educação. Agora, a casa também constrói seus primeiros passos na frente de mudanças climáticas, que está aos cuidados do sócio Thomaz Pacheco.
A gestora liderou uma rodada de R$ 30 milhões na Negócios Verdes, ao lado de Daniel Goldberg, ex-Farallon, e Marco Kheirallah. Por esse valor, os investidores ficaram com uma fatia de quase 37% da empresa. A Negócios Verdes, que muito provavelmente passará por uma mudança de nome em breve, é uma holding, uma plataforma para gestão de resíduos.
Quem pensou na Ambipar, que fez IPO na B3 em 2020, errou feio. A Negócios Verdes é uma companhia industrial, que tem como matéria-prima as sobras de outros setores. A beleza do seu impacto está justamente em quais “restos” a companhia usa — e dá “fim”. Debaixo dessa holding, estão duas empresas: a Rolth e a Sulminas.
A Rolth tem uma solução que literalmente consome a escória de aciaria, uma sobra problemática da indústria do aço. As siderúrgicas hoje “empilham” esse rejeito em seus pátios e apenas fazem a gestão dessa montanha. O Brasil tem um estoque estimado de 50 milhões de toneladas de escória de aciaria, segundo Pacheco contou em entrevista ao EXAME IN. E, a cada ano, acumula mais 5 milhões de toneladas.
O que a Rolth, uma companhia com solução patenteada em 12 países, faz é transformar esse subproduto em três produtos: metais, que são separados e revendidos às siderúrgicas; agregados siderúrgicos, que servem para fazer blocos de paver (pavimentação); e óxido de magnésio de cálcio, em quantidade muito menor, que atende à indústria de fertilizantes.
A Negócios Verdes nasce com um contrato com a ArcelorMittal, para toda a sobra da unidade de Resende – cerca de 20 mil toneladas anuais. “Sabemos que estamos rabiscando um nada. Mas a questão é que esse é um problema enorme, de ordem global”, destaca Pacheco, para falar sobre o ouro que tem nas mãos. Somente no Brasil, a Arcelor responde por 40% do rejeito que sobra todo ano. Para aproveitar esse subproduto será montada uma unidade fabril na planta da ArcelorMittal, que deve estar pronta no começo de 2024. O investimento será da ordem de R$ 20 milhões.
“O contrato já prevê uma segunda unidade, em outra planta da Arcelor”, reforça Pacheco. Ele explica que não há exclusividade com o grupo e que outros interessados podem adotar a solução que, literalmente, some com essa escória, porque dá uma finalidade a esse material.
Já a Sulminas, a outra controlada da Negócios Verdes, usa como matéria-prima – pasmem – as sobras da indústria de pedras ornamentais de São Tomé das Letras (MG). Oi? Pois é. E, a partir de um segredo industrial, produz areia de sílica, algo que é hoje minerado e explorado. Como resultado, consegue oferecer para a indústria vidreira e de construção civil uma alternativa a um abastecimento monopolizado pela Jundu Mineração, da Saint-Gobain – além de evitar mais essa mineração.
“Eu não sei se já fizeram isso, mas quem olhar São Tomé das Letras no Google Earth vai ver como um deserto de sobras. E as sobras nesse segmento chegam a 85%”, conta Pacheco. Hoje, a matéria-prima para produzir algo que até agora só a natureza oferece sai de graça. “A indústria vidreira não brinca com esse assunto. A qualidade da areia de sílica é o que faz um alto-forno, principal custo dessa indústria, durar mais ou menos. Estamos trabalhando há tempos com eles para definir a melhor granularidade.” Mas Pacheco não acredita que vá continuar sempre assim. À medida que o mercado for desenvolvido, entende que surgirão concorrentes e que, mais à frente, essa matéria-prima poderá vir a ter um custo.
A realização de Pacheco ao falar sobre a Negócios Verdes é evidente. Poderia ser porque se trata de uma solução para milhões de toneladas de problemas. Mas não é “apenas” isso. A Negócios Verdes confirma a premissa do fundo.
O portfólio da GK Ventures, na frente de impacto ambiental, tem como pressuposto que o mercado de crédito de carbono não vai dar conta de resolver toda a questão climática, de toda a transformação industrial necessária, em especial da indústria de base.
A Rolth e a Sulminas, ambas, nascem da ineficiência dos negócios de lidar com suas sobras: transforma esses rejeitos em fonte de renda, margem, emprego e matéria-prima. A margem desse milagre? É industrial, de 50% para cima, conta o próprio Pacheco.
“Não temos essa curva de startup de tecnologia, em que primeiro você gasta muito dinheiro e, depois, vê se dá retorno. A margem desse negócio é de 50% para mais. A partir da segunda planta, a gente alcança velocidade de cruzeiro.”
Pacheco afirma que o investimento da GK foi feito “a valor patrimonial” e que a gestora praticamente terá co-controle do negócio, benefícios que só quem investe em uma operação tão em seu início consegue.
A expectativa é que, com a primeira planta em Resende, e mais a Sulminas - com a capacidade atual triplicada após investimentos de R$ 10 milhões - , a Negócios Verdes seja uma operação com receita da ordem de R$ 50 milhões ao ano.
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