Esporte

Ministério Público aponta relação entre empresários de futebol e a máfia das apostas

Conversas obtidas na investigação indicam que agentes de jogadores encontraram os apostadores e até receberam valores

Segundo o Ministério Público de Goiás (MP-GO), a quadrilha havia pago um adiantamento de R$ 50 mil a Bauermann para que ele tomasse um cartão amarelo naquela partida, em 5 de novembro do ano passado (Pedro Vilela/Getty Images)

Segundo o Ministério Público de Goiás (MP-GO), a quadrilha havia pago um adiantamento de R$ 50 mil a Bauermann para que ele tomasse um cartão amarelo naquela partida, em 5 de novembro do ano passado (Pedro Vilela/Getty Images)

Agência o Globo
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Publicado em 22 de maio de 2023 às 07h29.

Faltavam poucos minutos para o jogo entre Santos e Avaí acabar quando Romário Hugo dos Santos, o Romarinho, acusado de integrar a quadrilha de manipulação de resultados do futebol brasileiro, enviou uma mensagem, pelo WhatsApp, para Luiz Taveira, empresário do zagueiro Eduardo Bauermann, que estava em campo. “Meu Deus do céu, o Bauermann quer matar nós do coração?”, perguntou. O empresário respondeu: “Pqp, você foi comigo nele. Não sei o que falar”.

'É a linha de zaga toda, filho': Como a máfias das apostas conseguiu manipular o número de escanteios de um jogo do estadual do Mato Grosso

Segundo o Ministério Público de Goiás (MP-GO), a quadrilha havia pago um adiantamento de R$ 50 mil a Bauermann para que ele tomasse um cartão amarelo naquela partida, em 5 de novembro do ano passado — o jogador, no entanto, descumpriu o acordo. Depois do apito final, diante da revolta de Romarinho, o empresário marcou um encontro entre jogador e apostador:

“Vocês me encontram na minha casa e vamos na dele”.

Além de Taveira, que não foi denunciado pelo MP-GO, a investigação identificou outros três empresários, agentes e até amigos de jogadores que intermediaram negociações dos atletas com a máfia das apostas. Conversas obtidas pela Operação Penalidade Máxima indicam que houve casos em que os intermediários encontraram pessoalmente os apostadores, indicaram novos jogadores para o esquema e até receberam valores da quadrilha.

Taveira manteve contato com Romário de novembro até fevereiro de 2023. No jogo seguinte, contra o Botafogo, apostador e jogador combinaram que Bauermann deveria receber um cartão vermelho para compensar o prejuízo da partida anterior. Ele de fato foi punido, mas depois do apito final, por reclamação. Logo após o jogo, Taveira enviou ao apostador um print de uma notícia sobre a expulsão do seu cliente. “Vai aprender... Tirou a virgindade”, escreveu Taveira, em seguida.

O cartão, no entanto, não foi contabilizado pelo site de apostas — e a quadrilha tomou novo prejuízo. Ao longo do mês seguinte, o empresário marcou novos encontros com o apostador para tentar resolver o impasse.

“Tinha que rachar o cara no pau, ser expulso e dane-se”, enviou Taveira a Romarinho em 9 de dezembro.

Gustavo Poli: Uma fábula do apito

Ao GLOBO, o empresário negou que tenha participado de acordos de apostas.

— Tenho 30 anos de profissão. Nunca me envolvi com apostas e falei com Bauermann para que ele não se envolvesse.

Um dos intermediários de jogadores junto à quadrilha acabou denunciado pelo MP-GO: o empresário Pedro Gama dos Santos Junior, amigo do zagueiro Victor Ramos, é acusado de ter negociado com os apostadores um pagamento de R$ 100 mil para que Ramos cometesse um pênalti no jogo entre Portuguesa e Guarani, pelo Paulistão deste ano. Na semana anterior ao jogo, Bruno Lopez, o BL, apontado como chefe da quadrilha de apostadores, contou aos comparsas como foi seu contato com Gama.

“Esse cara aí é irmãozão do Victor Ramos. Mano, o cara é mil grau, ele já trabalhou assim lá na Chapecoense, trabalhou também no Goiás, entendeu? Ele falou: ‘Meu, é a primeira de muitas’. Falou que cem conto ele pega, entendeu? Metade antes, metade depois. (...)Já deu pra ver que o Victor Ramos é do game, tendeu? Aí amanhã provavelmente eu vou encontrar pessoalmente com esse assessor”, disse BL. Hoje, Ramos e Gama são réus na Justiça de Goiás.

Dois intermediários de jogadores chegaram a receber valores da quadrilha. Os investigadores encontraram dois comprovantes de pagamentos, que somam R$ 40 mil, para Cleber Vinicius Rocha Antunes da Silva, o Clebinho Fera, empresário que se descreve no Instagram como “Amigo dos Amigos”. O depósito teria sido feito por Camila Silva da Motta, mulher de BL. De acordo com as conversas, os valores eram referentes a acordos para que dois jogadores tomassem cartões amarelos: Pedrinho, do Athletico, e Sidcley, à época no Cuiabá.

Em setembro de 2022, BL disse aos comparsas que tratou diretamente com Clebinho a participação de Sidcley no esquema: “Direto com o empresário dele, sabe quem que é? O Clebinho Fera, Clebinho Fera, ele tem metade dos caras do Athlético Paranaense lá mano, cê é louco”. Clebinho não foi denunciado pelo MP-GO.

Os promotores também localizaram um comprovante de pagamento no valor de R$ 35 mil em nome de Antônio Polidoro Jr., citado pelos apostadores como intermediário do acordo com o jogador Nathan, ex-Fluminense e hoje no Grêmio. Polidoro é uma figura conhecida nos bastidores da bola. Ele é jogador, atualmente atua nas divisões inferiores da França e já namorou celebridades como Jojo Toddynho e Karol Conká.

Seu nome também foi citado num áudio enviado por BL aos comparsas: “Rapazeada, o pix tá no nome do Polidoro, não sei se cês conhece. Ele trampa comigo tem uns dias já... ele tá na França, tá ligado? E ele que intermedia bastante jogador aí pra mim, ele traz bastante jogador, ele que tá na bala direto com o Nathan aí, fechou?". Nathan acabou não sendo escalado por Fernando Diniz para o jogo seguinte e não cumpriu o acordo.

O GLOBO não conseguiu contato com Polidoro, Clebinho Fera e Pedro Gama

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