Gustavo Aranha, cofundador e CEO do Sfera FC (Divulgação)
Repórter
Publicado em 4 de maio de 2025 às 13h14.
Última atualização em 4 de maio de 2025 às 14h06.
Saúde financeira, conquista de patrocinadores e rentabilidade. Entre tantos desafios na gestão de um clube de futebol, o mais notório é a busca pelos melhores jogadores, preparados não apenas para grandes competições, mas também para as responsabilidades de um profissional. É aí que o Sfera Futebol Clube entra em cena, com a missão de impulsionar o futebol brasileiro não apenas com boas táticas de jogo, mas também com uma educação diferenciada.
Fundado em 2021, pelos sócios Gustavo Aranha, também CEO do clube, e Fábio Francez, o Sfera se dedica à formação de jovens atletas no futebol, de diferentes faixas etárias (do sub-11 ao sub-19) para, mais tarde, transferi-los para grandes clubes.
Sediado em Jarinú, no interior de São Paulo, o Sfera FC dispõe de uma estrutura de 600 mil metros quadrados de área, quatro campos de futebol oficiais, alojamentos para 200 pessoas e espaços administrativos e médicos. No entanto, esse centro não participa de campeonatos profissionais. Ao invés de competir com grandes clubes nos principais campeonatos, a prioridade é lançar no mercado craques que possam se destacar não apenas pelas técnicas em campo, mas também em intelecto.
Pioneiros na criação de uma Sociedade Anônima do Futebol (SAF) voltada ao desenvolvimento de categorias de base, os sócios-fundadores pretendem transformar o Sfera no principal clube formador de talentos do Brasil nos próximos dez anos.
Para chegar a esse patamar, o clube conta com recursos de investidores acionistas não-controladores. A meta da SAF é levantar R$ 50 milhões até dezembro de 2028, para quando o Sfera projeta o breakeven, principalmente com as receitas provenientes de transferências de atletas.
O clube já alcançou 57% de sua meta de captação com investidores privados, totalizando R$ 28.250.000 provenientes de 15 contratos, com cotas variando entre R$ 500.000 e R$ 10.000.000.Para Gustavo Aranha, cofundador e CEO do Sfera, o clube já se consolidou como a iniciativa de futebol mais bem-sucedida do país em termos de investimentos. Até o momento, não há cases de outra SAF no Brasil com um número igual ou superior de investidores não-controladores.
"Nenhum outro projeto de SAF ou clube associativo de futebol de alta performance arrecadou tanto capital de investidores não-controladores como o Sfera", conta em entrevista à EXAME.
E acrescenta: "Queremos ser referência em um período de 5 a 10 anos. Sabemos que é uma meta ambiciosa, mas estamos convencidos de que estamos no caminho certo. Estamos atraindo mais investidores para expandir a SAF."
Com uma longa carreira no mercado financeiro em companhias como Credit Suisse Hedging-Griffo e GEO Capital, Gustavo Aranha por muito tempo guardava o desejo de empreender no esporte, mas não enxergava segurança no setor, menos ainda em criar um clube convencional do zero. "O mercado do futebol é muito rico, mas bastante fraco em gestão, estratégia e inovação. Vários clubes brasileiros e internacionais enfrentam prejuízos, pois é um negócio com muitas instabilidades na geração de receitas".
Ao firmar parceria com Fábio Francez, da F3 Sports — empresa de gerenciamento de carreiras no esporte —, Aranha descobriu no futebol de base as oportunidades para decolar, mesmo longe dos holofotes e da agitação dos estádios.
"Os clubes de futebol são como a ponta de um iceberg, porque representam a parte que todo mundo vê. E nesse ponto, os atletas viram objetos de entretenimento. Mas, o que as pessoas não enxergam é o que fica em 'baixo da água'. É nesta base que encontramos um modelo de negócios com a formação de talentos e a inserção deles no futebol. Levá-los das escolas aos estádios se mostrou um processo bastante lucrativo, gera caixa e traz resultados consistentes".
De acordo com o CEO, o Sfera busca alcançar a autossustentabilidade por meio das receitas vindas de transferências de jogadores formados na SAF. O clube recebe uma parte do valor sempre que um atleta revelado é negociado com outro time. Normalmente, o Sfera retém entre 20% e 50% do valor da venda, dependendo do acordo com o clube parceiro.
Além dos ganhos com as primeiras transações, o clube também assegura uma parte dos direitos econômicos dos atletas ao longo de suas carreiras, por meio da manutenção de percentuais e do mecanismo de solidariedade da FIFA, que beneficia clubes formadores como o Sfera, já devidamente certificado.
Atualmente, os principais “clientes” do Sfera são times internacionais de menor porte, que não possuem os recursos financeiros dos grandes clubes brasileiros, mas buscam talentos em ascensão.
"Alguns clientes pertencem a grandes ligas e outros são grandes clubes de ligas menores. Além do Brasil, nos relacionamos com times pequenos de países como Portugal, Espanha, Bélgica e da região da Escandinávia", explica Gustavo Aranha. "São mercados que gostam de jogadores inexperientes para prepará-los com todos os seus recursos e, finalmente, levá-los para grandes campeonatos e clubes superiores".
Além da segurança na divisão dos lucros, Gustavo Aranha ressalta que esse processo respeita as etapas de progresso de cada atleta: "É fora da realidade que um atleta de 18 anos saia do Sfera direto para um time como Barcelona e Real Madrid por milhões de euros, pois não está pronto para esse desafio. Por isso, focamos nesses clubes que são intermediários. São nesses ambientes que eles darão os maiores saltos".
Essas transações iniciais não envolvem os valores astronômicos que frequentemente aparecem nas manchetes, como aquelas que equivalem a dezenas de milhões de euros. No entanto, essas vendas oferecem aos jogadores do Sfera uma exposição que pode aumentar o valor de seus contratos e gerar retornos significativos no futuro – algo vantajoso também para o clube de Aranha.
"Ao transferir jogadores para players de 'Série B', conseguimos fazer boas parcerias de percentual dos direitos econômicos para a segunda transferência. Se o processo de formação for eficaz, o jogador se destacará, atraindo interesse de outros clubes, e o Sfera continuará recebendo um bom percentual nas próximas negociações", ressalta.
No início de 2025, após a Copinha, o Sfera negociou a transferência de sete jogadores para equipes do Brasil e do exterior. Por aqui, muitos jovens migraram para clubes como Ceará, Operário-PR, Cuiabá e Guarani. Na última janela de transferências, um jogador formado pelo Sfera foi negociado com o time Torreense, de Portugal. Enquanto outro seguiu para o MFK Karvina, da República Tcheca, como um empréstimo. Outro atleta que passou pela SAF foi transferido ao New York RedBull, dos Estados Unidos, pela negociação de empréstimo com opção de compra.
Com quatro anos de operação, o Sfera também conseguiu diversificar sua fonte de receita a partir do patrocínio com a companhia alemã Melitta. "É uma posição de vantagem, porque, além de ser uma marca com uma relação tradicional com o esporte, o Sfera e o Manchester United são os únicos a contar com investimento da Melitta. Mesmo assim, estamos em busca de novos patrocinadores".
Embora não se trate de um projeto social, a preocupação do Sfera é proporcionar uma formação completa, que englobe tanto o aspecto físico quanto o psicológico dos atletas. O clube aposta nesta estratégia como diferencial e como suporte à longevidade das carreiras dos jogadores.
Segundo Larissa Li, Diretora de people & culture do Sfera, o braço educacional da SAF visa lançar indivíduos com habilidades que deem aos jovens condições de trilhar diversos caminhos, não apenas dentro do esporte, mas também em outros setores.
"Acreditamos que formar o indivíduo de maneira integral é o que tornará o atleta muito melhor. Isso o capacita a tomar decisões mais acertadas e a se adaptar de forma mais eficiente a qualquer contexto".
A iniciativa atrai jovens jogadores entre 11 e 18 anos (muitos deles de baixa renda), oferecendo ajuda de custo, plano de saúde e alojamento na sede do clube em Jarinu. O Sfera também iniciou recentemente investimentos no futebol feminino, mas as jogadoras ainda não têm alojamento.
Atualmente, o clube possui mais de 80 atletas residentes, que recebem treinamento físico, alimentação e apoio psicológico. De acordo com Larissa, os jovens são incentivados a estudar, com reforço escolar, aulas de inglês e educação financeira. O clube se responsabiliza pela matrícula de atletas a partir do sub-14 em escolas da rede pública da região, além de cuidar do transporte e de todo o acompanhamento da grade escolar. Para os atletas da categoria sub-19, a SAF conta com a parceria com a Universidade Anhembi Morumbi para bolsa de estudos em cursos da instituição.
"Queremos que os atletas compreendam a importância da educação em suas vidas e consigam se dedicar de forma adequada à parte acadêmica. Isso faz muita diferença não apenas nas transferências para clubes brasileiros e estrangeiros, como também no rendimento deles em uma rotina dura e no desenvolvimento humano", explica.
A metodologia do Sfera não deixa de lado a formação cidadã. A SAF oferece aos jovens palestras e atividades sobre temas como racismo, dependência química, redes sociais e machismo, com o propósito de incentivar entre eles o senso de responsabilidades e direitos.
"Queremos que eles reflitam sobre uma sociedade que continua machista e na maneira como lidam com o racismo e a homofobia. São estímulos que ajudam os atletas a entenderem seu papel como cidadãos, por isso acreditamos no potencial da educação no desenvolvimento pessoal", reforça Larissa.