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A nanotecnologia da Ciclopack é aplicada diretamente no material reciclado, seja bem no início da cadeia ou no transformador (Marcio nagano/Divulgação)
Repórter de ESG
Publicado em 27 de novembro de 2025 às 17h38.
Garrafas idênticas, cor e cheiro semelhantes, gosto indistinguível: a crise das bebidas batizadas com metanol já deixou 10 mortes no estado de São Paulo, além de 49 casos confirmados e outros 8 em observação. A crise teve início com a falsificação de bebidas, como whiskey e vodca.
Agora, uma nanotecnologia pode resolver o problema da fraude na cadeia. Criada pela startup Ciclopack, a solução CicloID trabalha com a economia circular ao implementar um token físico em embalagens, possibilitando que a origem e histórico de um produto ou embalagem sejam auditáveis e rastreáveis.
“Quando entendi que a proteção existente contra a falsificação de produtos era a ação da polícia e políticas públicas, decidimos criar uma deeptech com tecnologias focadas nisso”, explica Leonardo Roriz, CEO e fundador da Ciclopack, que conversou com a EXAME sobre as estratégias e oportunidades para a startup.
COP30: acesse o canal do WhatsApp da EXAME sobre a Conferência do Clima do ONU e saiba das novidades!A nanotecnologia da Ciclopack é aplicada diretamente no material reciclado, seja bem no início da cadeia ou no transformador. Assim, é possível identificar a origem do material reciclado, como o aterro de onde derivou ou se foi encontrada no litoral. A solução ainda permite que seja possível entender quanto de conteúdo reciclado está presente na composição de cada material.
Além de checar o balanço de massa do produto, também é possível identificar se a nota fiscal condiz com o material e se a embalagem é a mesma do início da cadeia. Para o CEO da startup afirma que o objetivo é apresentar uma evolução na cadeia brasileira da economia circular, que ainda se baseia na identificação manual. “Assim, conseguimos fechar a cadeia da reciclagem, evitando que fraudes e falsificações aconteçam no meio desse processo”, explica.
Atualmente, a Ciclopark trabalha com a certificação na cadeia do agronegócio, como defensivos agrícolas, filmes stretch, e embalagens de mil litros. Mas o potencial vai além: bebidas, alimentos e produtos destinados à exportação que exigem certificações rigorosas de origem e produção — como os selos kosher e halal, que precisam comprovar toda a cadeia produtiva de forma auditável para garantir conformidade com o judaísmo e islamismo.
A nanotecnologia é aplicada como um "token físico" no reciclador ou no transformador que faz a embalagem. "Sempre quando há processo de transformação, gerando uma nova embalagem, inserimos a tecnologia da Ciclopack dentro, e a informação fica para sempre no material", explica Roriz. A partir daí, é possível identificar quantos por cento de material reciclado tem o novo item, em que máquina foi feita e toda a sua procedência.
A validação acontece por espectroscopia no infravermelho próximo (NIR) — um feixe de luz "lê" a composição e compara com o modelo de referência. "É como um QR code dentro do material, mas impossível de rasurar ou remover. A análise é portátil, mais barata que métodos tradicionais e leva apenas dois segundos para validar o material", detalha o CEO.
No caso das bebidas alcoólicas, a tecnologia atua em três pontos críticos da cadeia: embalagem, envase e distribuição. "Podemos colocar o token físico na tampa, no rótulo e no selo. Se um não bater com o outro, já sabemos que houve fraude", explica Roriz. "Fomos muito acionados no setor de bebidas porque conseguiremos dizer se foi fraudada ou não sem nem abrir, uma proteção a mais para o consumidor final", explica.
A crise recente com o metanol expôs uma vulnerabilidade crítica na cadeia de distribuição. A solução passa por atuar diretamente com a indústria e não deixar a responsabilidade apenas com os estabelecimentos. "A própria indústria precisa resolver esse problema na cadeia de distribuição", conta.
A estratégia é garantir que todo produto que sai da fábrica tenha o token físico. "Todo whisky que for da mesma marca precisa dessa tecnologia. Se alguém tiver desconfiado, consegue fazer a análise. Podemos ir lá verificar e saber, sem abrir a garrafa, que é autêntico e não falsificado", explica Roriz.
Os números da falsificação no Brasil são alarmantes. Segundo dados do mercado ilícito, cerca de 30% dos produtos de alto valor agregado são falsificados. Em alguns segmentos, a situação é ainda mais crítica: charutos chegam a 95% de falsificação, cigarros a 60%, defensivos agrícolas a 36% e fertilizantes a 33%.
"Quanto mais saída um produto tem, mais interesse desperta. Se é alto valor agregado, melhor ainda. O crime hoje ficou tão organizado que consegue atuar até em produtos de baixo valor agregado, como café. Nosso supply chain está muito atacado pelo ilícito", alerta Roriz.
Tecnologia atua em três pontos críticos da cadeia: embalagem, envase e distribuição
Incubada no CIETEC-USP — centro de inovação que reúne empresas de deeptech e pesquisadores — e validada pelo Instituto de Química da universidade, a Ciclopack foi premiada em 2025 com o primeiro lugar no programa Acelera ScaleUp da FIESP. No ano anterior, a startup ficou entre as nove melhores deeptechs de meio ambiente e sustentabilidade da América Latina no Deep Tech Summit.
Os próximos passos incluem a entrada em sistemas de rastreio nacionais e internacionais, com foco em criar a simbiose entre o mundo físico e o blockchain. "Queremos levar a simbiose entre supply chain físico e blockchain digital. Isso cria um novo supply chain", afirma Roriz. A ideia é conectar ativos físicos com lastro material a sistemas descentralizados, tornando toda a operação auditável.
A tecnologia ainda não é B2C — consumidores não conseguem verificar pelo celular —, mas esse é um desenvolvimento previsto para os próximos anos. "Temos algumas fases a cumprir antes. Prevemos que a tecnologia esteja amplamente disponível em 2 a 5 anos."
"Somos o elo que conecta a cadeia, o que falta para conectar a economia circular digitalmente. Queremos ser esse elo entre mundo físico e digital", explica Roriz.