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Sede da SAP na Alemanha: empresa suspende programas nos Estados Unidos, em decisão que afeta 17 mil funcionários americanos (Krisztian Bocsi/Bloomberg)
Publicado em 12 de maio de 2025 às 12h23.
Última atualização em 12 de maio de 2025 às 14h34.
A SAP, multinacional alemã de software empresarial, tornou-se o mais recente exemplo de como empresas globais ainda estão navegando no cenário geopolítico fragmentado, em que políticas de diversidade e inclusão estão em xeque.
Um porta-voz oficial da companhia disse à AFP nesta domingo, 11, que a companhia encerrará diversos programas de diversidade nas operações americanas, confirmando rumores que já circulavam em reportagens locais.
Embora o mesmo porta-voz tenha garantido que compromissos diferenciados serão mantido em outras jurisdições, a revisão - que afeta diretamente 17.000 funcionários nos Estados Unidos - impacta 16% da força de trabalho total da empresa, de cerca de 120.000 colaboradores.
Entre as mudanças mais significativas está a suspensão da meta global de alcançar 40% de representação feminina até 2030, atualmente em 35,2%.A SAP também anunciou a remoção de indicadores de equidade de gênero dos critérios de remuneração executiva, além da reestruturação do departamento de Diversidade e Inclusão, que será integrado a outras áreas operacionais.
A situação da SAP é mais uma a ilustrar um dilema enfrentado por corporações multinacionais: como conciliar políticas globais com exigências regulatórias locais divergentes.
Em agosto de 2024, poucos meses antes das mudanças americanas, Supriya Jha, Chief Diversity & Inclusion Officer global da companhia, defendeu publicamente a expansão dos investimentos em DEI, como um imperativo de negócios, não apenas uma iniciativa de responsabilidade social.
Contudo, desde janeiro de 2025, o governo americano tem exercido forte pressão regulatória sob as empresas, questionando a legalidade de programas corporativos de diversidade, equidade e inclusão (DEI).
A postura cada vez mais restritiva em relação a iniciativas DEI incluiu o envio de notificações formais através de embaixadas para corporações estrangeiras que operam no país.
O que foi confirmado pela Câmara de Comércio Germano-americana (DIHK), que explicou que os documentos solicitam uma autocertificação de conformidade com as novas diretrizes.
O movimento da SAP se insere ainda em uma tendência mais ampla, observada sobretudo no setor de tecnologia.
Relatórios setoriais indicam redução generalizada de investimentos em programas de diversidade entre empresas do segmento.
Por meio de sua subsidiária T-Mobile, a Deutsche Telekom, por exemplo, foi outra a implementar ajustes similares em abril deste ano.
O histórico de lideranças femininas à frente de grandes operações da SAP no Brasil e no mundo, traz um contraste particularmente notável na decisão de agora.
No Brasil, a empresa alcançou 31% de representação feminina em cargos de liderança, quase o triplo da média do mercado de tecnologia. A subsidiária brasileira foi ainda a primeira no mundo, a publicar relatório próprio de sustentabilidade, documentando iniciativas em diversidade, inclusão e impacto social.
E a liderança regional - feminina - explica o histórico de sucesso na materialização destes compromissos. Cristina Palmaka comandou as operações brasileiras por sete anos, antes de assumir a presidência latino-americana por quatro anos.
Dentro e fora da SAP, Palmaka se tornou símbolo de uma atuação pautada por firmes passos na jornada de inclusão de grupos minorizados, sem perder de vista a entrega de resultados.
A executiva deixou a companhia em meados de abril de 2025, quando passou o bastão para Adriana Aroulho, sua sucessora já como Presidente da SAP Brasil desde 2020, que hoje lidera a regional América Latina.
Procurada, a operação brasileira da SAP se manifestou por meio de nota.
A companhia diz estar "ajustando atividades na área de Diversidade & Inclusão para refletir os desenvolvimentos atuais, garantindo conformidade legal enquanto mantém um ambiente de trabalho seguro e inclusivo".
Segundo o texto, os programas de D&I existentes continuarão no futuro, com "igualdade de oportunidades e uma cultura inclusiva e permanecendo como objetivos centrais".
E sobre a administração local, explicou que a métrica sobre mulheres em liderança sênior será adaptada para excluir os Estados Unidos, focando em níveis de gestão abaixo do Conselho Executivo.
A multinacional também informou que deve realizar uma reestruturação organizacional, unindo as áreas de D&I e Responsabilidade Social Corporativa, formando assim uma nova equipe de "Responsabilidade Social, Inclusão e Comunidades".
Sobre a meta global de 40% de mulheres na força de trabalho, classificada na nota como "voluntária", a SAP Brasil diz que "não será mais perseguida de forma unificada, sendo substituída por uma medição diferenciada considerando metas específicas para cada local de atuação".
Empresas globais enfrentam um ambiente cada vez mais complexo para equilibrar políticas corporativas com exigências locais divergentes, enquanto investidores, funcionários e consumidores mantêm expectativas variadas sobre compromissos de diversidade.
A decisão da SAP reflete de forma clara essas tensões estruturais. E reforça a tendência de multinacionais adotarem abordagens cada vez mais regionalizadas para políticas de diversidade.
Entre iniciativas globais que, segundo a companhia, devem ser mantidas em outras jurisdições, estão o programa Women to Watch, focado no desenvolvimento profissional de mulheres em níveis médios de gestão, e o Talent to Watch, com escopo voltado para minorias sub-representadas.
Outro programa em que a SAP foi pioneira parece estar a salvo por enquanto: o Autism at Work, considerado referência no setor, que já integrou mais de 240 profissionais no espectro autista desde sua criação.
Contudo, há nesta mudança de paradigma questões fundamentais a serem observadas, sobre a universalidade de valores corporativos e a capacidade das organizações de manter sua coerência institucional.
*A matéria foi atualizada com o posicionamento da companhia.