ESG

Roberto Campos: mercado de carbono será uma das maiores conquistas do BC

Presidente do Banco Central afirma que mudar a cultura da entidade em relação às mudanças climáticas é prioridade

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central: “Estamos na maior crise da história e a sociedade demanda soluções sustentáveis e inclusivas” (Ueslei Marcelino/Reuters)

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central: “Estamos na maior crise da história e a sociedade demanda soluções sustentáveis e inclusivas” (Ueslei Marcelino/Reuters)

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Rodrigo Caetano

Publicado em 2 de junho de 2021 às 12h36.

Última atualização em 2 de junho de 2021 às 20h58.

Para o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a criação de um mercado de carbono regulado a partir de regras internacionais será uma das maiores conquistas da sua gestão. Neto destacou a necessidade de se precificar corretamente as externalidades negativas da emissão de carbono, mecanismo mais eficiente para modificar o comportamento das empresas.

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“O que temos em mãos é um problema de externalidades negativas”, disse o presidente, durante painel na Green Swan Conference, evento realizado pelo Banco Internacional de Compensações (BIS). “A melhor maneira de lidar com isso é conectar os fatos causadores do fenômeno indesejado com os agentes prejudicados por eles. Criar um mercado para esse fenômeno é o instrumento mais eficiente para lidar com a questão.”

A conferência que contou com a presença de Neto foi criada para debater maneiras práticas de combater as mudanças climáticas usando o sistema financeiro. O nome do evento se refere a um conceito cocriado pelo brasileiro Luiz Awazu Pereira da Silva, vice-gerente-geral do BIS. Awazu define como “cisnes verdes” eventos climáticos não previstos que podem funcionar como gatilhos de uma nova crise financeira global.

O presidente do BC destacou a agenda climática lançada pela entidade em setembro do ano passado. Ela contempla desde ações imediatas, como a incorporação de cenários de riscos climáticos em testes de estresse do BC, como medidas de longo prazo, como exigências regulatórias para as instituições financeiras que deverão valer apenas a partir de 2022.

A questão das mudanças climáticas, de acordo com os planos do presidente, passará a fazer parte da cultura do BC. “Criar um departamento, geralmente, não funciona, pois gera resistência das outras áreas”, justificou Neto. “O que precisamos é mudar a cultura, mas isso é muito mais difícil.”

O tema permeia todos os aspectos do sistema financeiro atualmente, disse o presidente. Essa agenda já está na sua terceira onda, na qual o assunto começa a orientar os fluxos financeiros. “Vemos isso acontecer até no crédito”, disse Neto. As duas ondas anteriores foram os investimentos em energia limpa e na produção sustentável de alimentos. “Tudo está mudando, por isso a importância de realizar testes de estresse climáticos”. O BC iniciou esses testes no ano passado e estabeleceu um critério de dois anos, mais curto do que o período considerado na Europa, de cinco anos.

Demanda da sociedade

Em grande parte, a urgência no combate às mudanças climáticas se relaciona com mudanças comportamentais na sociedade. “Estamos na maior crise da história e a sociedade demanda soluções sustentáveis e inclusivas”, disse Neto. “Não é somente tratar sobre o clima, mas também sobre questões sociais”. Os impactos decorrentes dessas externalidades precisam ser considerados na definição da política monetária, segundo o presidente.

“O primeiro passo para entrar nessa agenda é se colocar nos sapatos das gerações mais jovens”, afirmou. “Precisamos descobrir o que é sustentabilidade para eles.”

Cisnes Verdes

A ideia de que é preciso se preocupar com riscos sistêmicos para a economia gerados por eventos climáticos tem ganhado adeptos há alguns anos. O estudo original de coautoria de Awazu aponta que “abordagens tradicionais de gerenciamento de riscos, baseadas na extrapolação de dados históricos e em suposições de normalidade, são amplamente irrelevantes para aferir os riscos futuros relacionados ao clima.”

Um dos líderes mais vocais nesse tema é o ex-presidente do Banco da Inglaterra, Mark Carney, que, durante o seu tempo no cargo, conclamou outros bancos centrais a dar atenção ao problema. “Uma vez que as mudanças climáticas se tornem um risco real e imediato para o equilíbrio financeiro, pode ser tarde demais para estabilizar o aquecimento da atmosfera em 2 graus”, afirmou o Carney, em discurso proferido em março de 2019.

Em 2017, oito bancos centrais — de Inglaterra, França, Holanda, Alemanha, Finlândia, Singapura, México e China — criaram a Network of Central Banks and Supervisors for Greening the Financial System, uma rede de reguladores cujo objetivo é a troca de informações e práticas que favoreçam a mobilização de capital para setores de baixo carbono. Hoje, mais de 50 instituições fazem parte da iniciativa, inclusive o Banco Central brasileiro.

As medidas práticas começam a despontar. Desde o ano passado, o Banco da Inglaterra conduz testes de estresse climático com bancos e seguradoras do país. Estão sendo considerados três cenários. O mais severo prevê uma elevação de 4 graus na temperatura global até 2080. Os resultados serão divulgados em 2021.

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