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Economia circular: Fundação Ellen MacArthur propõe mudança sistêmica na economia (Getty Images/Reprodução)
Repórter de ESG
Publicado em 24 de abril de 2023 às 11h41.
Última atualização em 24 de abril de 2023 às 12h18.
A produção em escala linear precisa ter os dias contados, em virtude da transição para a economia circular, é o que acredita Milena Lumini, gerente de comunicação para a Fundação Ellen MacArthur na América Latina. “Hoje em dia, a nossa economia é muito esbanjadora, ela desperdiça muitos os recursos naturais, materiais, tempo, energia e recursos humanos. Isto, obviamente, é a causa de muitos dos problemas ambientais como a poluição”, disse Milena Lumini, gerente de comunicação para a Fundação Ellen MacArthur na América Latina, em entrevista para a EXAME ESG.
A Fundação Ellen MacArthur tem como objetivo fomentar os caminhos para a economia circular. A instituição, que deu início às atividades em 2010, chegou ao Brasil cinco anos depois. A organização se estrutura a partir da experiência de Ellen, uma velejadora britânica.
Em 2005, a esportista deu a volta ao mundo em tempo recorde. No processo de treinamento e execução da tarefa, MacArthur tinha o desafio de balancear os recursos utilizados, como alimentos, combustível e roupas para não pesar a embarcação, o que poderia atrasá-la. Mas ter menos recursos do que o necessário também poderia ser prejudicial para a viagem.
A partir desse contexto, a esportista teve contato com várias linhas de pensamento que defendiam a economia circular: uma forma de enxergar a sociedade, como são consumidos os produtos e o que acontece com eles no pós-consumo.
Segundo Lumini, a economia circular tem três princípios: eliminar os resíduos e a poluição desde o início da produção – levando em consideração o design e o modelo de negócios – circular os produtos dos materiais no mais alto valor, reinserindo-os na cadeia produtiva e, por último, regenerar a natureza.
“A proposta da economia circular é que esses recursos não sejam desperdiçados, que eles voltem para a economia. Quando isso acontecer, eles devem permanecer na economia circulando ou voltar para a terra causando regeneração, como seria, por exemplo, o caso dos alimentos e outros materiais orgânicos”, observou Lumini.
O objetivo principal da economia circular é pensar possibilidades sobre como os materiais são retornados na cadeia produtiva, criando soluções circulares, enquanto reimagina o sistema. A economia circular tem como objetivo ser uma forma de ter uma economia em que quanto mais ela fosse implementada, melhor seria para o planeta e não o contrário, como é o que acontece atualmente.
Para que essa ‘transição’ aconteça, é necessário entender o conceito de economia circular para além da gestão de resíduos. “Não é só este o objetivo”, ressalta Lumini, “a economia circular quer repensar como são criados os produtos, os modelos de negócios para que os resíduos nem sejam gerados. Repensar o design cria valor econômico de modo a não precisar do consumo exagerado de recursos naturais”. Também é importante implementar esse tipo de economia, porque ele repensa o design e a criação de produtos desde o modelo de negócios.
A ideia dessa alternativa econômica se contrapõe à economia atual, que é linear. Ou seja, os recursos são trazidos, processados ou transformados em produtos, depois de um tempo de uso, esses recursos são desperdiçados na forma de resíduos, causando poluição – e a economia circular busca a integração entre o que é produzido e consumido.
De acordo com Lumini, há inúmeros benefícios na aplicabilidade da economia circular. Como no caso do combate às mudanças climáticas. “Só os combustíveis fósseis e a produção de energia são responsáveis por 55% das emissões totais de gases de efeito estufa. Os 45% restantes que é pouco falado tem a ver com a forma como fazemos e usamos os produtos. Só a produção de alimentos é responsável por um terço das emissões de gases de efeito estufa. E a economia circular oferece uma solução para resolver pelo menos parte dessas emissões”, observou Lumini.
A agricultura regenerativa é outro exemplo de como a economia circular pode funcionar na prática porque, seguindo essa lógica, a produção buscaria alternativas para que os solos fiquem mais ricos depois do cultivo e que funcionem para capturar carbono da atmosfera, aumente os índices de água na terra e aumente a biodiversidade. O que é o total oposto do que acontece na agricultura convencional, que degrada o solo.
Outra opção é a forma para lidar com a questão do plástico, ressalta Lumini. Segundo dados de 2016 da Fundação, em 2050 haveria mais plásticos do que peixes nos oceanos. Em 2020, outro estudo da organização afirmou que se não fosse feito nada até 2040 o volume de plástico no mercado e na economia dobraria, quadruplicando a quantidade de plástico nos oceanos chegando, assim, a 600 milhões de toneladas.
“Reciclar é uma alternativa do mercado linear. Mas acabar com a poluição, evitar que mais resíduos sejam colocados na economia é a mudança sistêmica que a economia circular se propõe a ser”, afirmou Lumini, “a princípio parece que a ideia é circular mas ela não é porque é uma matéria prima que existente, você só está postergando que ela se torne um resíduo”.
Para Lumini, a reciclagem não é o ponto mais importante. É necessário reimaginar o design. “Todo resíduo, para nós, é como um erro de design que poderíamos ter solucionado no design como produtos com maior durabilidade para a reutilização ser possível”, diz. Para ela, os shampoos em barra são exemplos de como uma mudança simples no design pode resolver questões de desperdício e uso excessivo de embalagens, por exemplo. Outro exemplo é a reutilização na indústria alimentícia com a compostagem.
“Na reciclagem, você entrega uma energia muito maior do que nesses outros processos e muitas vezes, você acaba às vezes tendo que recorrer a matérias virgens, diminuindo o valor daquele material. Então você pega uma garrafa PET e transforma em uma camiseta. Para isso, será necessário material virgem para criar outras garrafas PET. Assim, se propaga o processo de ter uma solução que parece circular, mas na verdade, ainda está no sistema linear”, comentou Lumini.
Pensando em auxiliar as empresas na transição para a economia circular, a Fundação desenvolveu seis estratégias ou áreas de foco para o design circular no relatório Da ambição à ação: uma estratégia adaptativa para o design circular. Segundo o estudo os pontos são: observar e interpretar o sistema, visualizar futuros circulares, criar as condições para colaboração, criar recursos de design, além de desenvolver ferramentas de design circular e avaliar o sistema
“Essa é uma oportunidade de mitigação de riscos para as empresas, porque, por exemplo, algumas empresas já sofrem com as questões das mudanças climáticas. Então ter modelos de negócios que são até mais resilientes, é uma vantagem que as companhias já estão de olho. Para isso, existe também uma oportunidade de tendência de mercado porque os consumidores estão mais atentos para as empresas, que têm uma responsabilidade com o meio ambiente. A economia circular, ela é tanto uma oportunidade como uma necessidade das empresas”, concluiu Lumini.