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Quais lições o Brasil pode tirar do novo mercado elétrico europeu?

Mecanismo que entrou em vigor em junho busca promover melhores previsões com mais antecedência

Brasil deve observar avanços do mercado europeu com o intuito de aperfeiçoar operação do sistema elétrico nacional (wirestock/envato)

Brasil deve observar avanços do mercado europeu com o intuito de aperfeiçoar operação do sistema elétrico nacional (wirestock/envato)

Gabriel Cunha
Gabriel Cunha

Colunista

Publicado em 6 de agosto de 2024 às 17h00.

Última atualização em 7 de agosto de 2024 às 14h18.

A operação de sistemas elétricos de dimensões continentais é algo desafiador. Este é o caso do Brasil, por exemplo, cujo Sistema Interligado Nacional (SIN) totaliza cerca de 170 mil km, o equivalente a mais de quatro voltas completas no planeta Terra.

Essa operação tornou-se ainda mais complexa com a crescente participação de fontes renováveis em todo o mundo. Ainda que a disseminação da geração solar e eólica represente um passo na direção certa para a transição energética, a produção de energia dessas fontes é intermitente.

Essa característica da energia eólica e solar é um desafio para o sistema elétrico, que deve permanecer equilibrado a cada instante. Portanto, o sistema deve dispor de recursos flexíveis suficientes para corrigir desbalanços que podem acontecer por flutuações na demanda ou na geração renovável, ou por indisponibilidade repentina de algum equipamento.

Sistemas elétricos do futuro

Diante desse cenário, os sistemas elétricos do futuro precisarão cada vez mais contemplar o valor do serviço de flexibilidade das fontes de geração, que é fundamental para acomodar esses componentes de incerteza. Uma alternativa seria contratar geradoras “clássicas” (em geral termelétricas) para atender a essa necessidade. Essa estratégia, no entanto, pode ser mais custosa do que o necessário.

Outra alternativa seria atuar do outro lado da equação, ou seja, criar incentivos econômicos adequados que permitam aos geradores eólicos e solares aperfeiçoarem a previsão da geração de seus parques. Esta solução promove uma resposta implícita aos preços de mercado e é capaz de reduzir significativamente o montante total de flexibilidade que precisa estar disponível para o sistema. Esta lógica se aplica nos mercados elétricos liberalizados de todo o mundo.

No Brasil, particularmente, apesar de existir o Preço de Liquidação de Diferenças (PLD), que traz alguma resposta implícita, há apenas uma liquidação de eletricidade consumida em tempo real. Isso faz com que não haja um incentivo para que os agentes melhorem suas próprias previsões de geração.

Como funciona o mercado europeu

O mercado elétrico integrado europeu adota, desde 2015, um mecanismo de liquidação dupla, no qual os agentes assumem compromissos vinculantes de entrega de energia no mercado do dia seguinte. Com isso, os agentes têm incentivo para fazer a melhor previsão possível. Isso ocorre porque as diferenças entre a previsão do dia anterior e a entrega física em tempo real estão sujeitas a um compromisso financeiro adicional.

Em junho deste ano, o mercado europeu adotou um mecanismo que pode melhorar ainda mais a previsão de produção de energia dos agentes. Trata-se de um mecanismo de liquidação múltipla, destacando três momentos adicionais em que os agentes podem ajustar suas previsões.

E a experiência mostra que incentivos podem reduzir significativamente o erro médio: como pode ser visto no gráfico abaixo, houve uma redução em mais de 50% do erro de previsão de geração da fonte eólica na Espanha ao longo de seis anos, depois que foram implementados uma série de procedimentos que incluem um mecanismo nacional de liquidação múltipla e uma responsabilização financeira por erros de previsão.

Este exemplo de benefício indica o imenso potencial que pode ser extraído da inteligência coletiva dos agentes ao fornecerem sinais de preços coerentes. A seu modo, o Brasil deve observar esses avanços com o intuito de aperfeiçoar o seu mercado e a operação do sistema elétrico nacional.

 

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