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Preservação pode trazer US$10 bi por ano ao Brasil, diz Walter Schalka

Presidente da Suzano diz que o Brasil depende de resultados concretos para voltar a atrair investimentos

"O Brasil tem potencial ambiental inacreditável, com uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo" (Patricia Monteiro/Getty Images)

"O Brasil tem potencial ambiental inacreditável, com uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo" (Patricia Monteiro/Getty Images)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 26 de agosto de 2020 às 07h28.

A pressão do setor privado fez o governo federal mudar de postura em relação à questão ambiental, afirma o presidente da gigante de papel e celulose Suzano, Walter Schalka. No entanto, o executivo diz que o País depende de resultados concretos para voltar a atrair investimentos. "Os números são claros: os desmatamentos aumentaram em 2019 e 2020 e precisamos voltar a patamares anteriores aos de 2012. Isso vai gerar credibilidade ao Brasil e um grande volume de investimentos."

Na visão de Schalka, a captação de créditos de carbono deve trazer US$ 10 bilhões extras todos os anos para a economia - dinheiro que pode ser distribuído para a população em geral e, em especial, aos povos amazônicos. Para ele, está na hora de o Brasil abraçar a vocação para potência de desenvolvimento sustentável: "O Brasil tem potencial ambiental inacreditável, com uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo".

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Há dois meses, os empresários se uniram para pedir ações concretas do governo para a Amazônia. Houve evolução?

A responsabilidade ambiental é uma questão de toda a sociedade. Tem a responsabilidade do governo de combater o desmatamento ilegal de forma incessante na Amazônia. É inaceitável o que acontece (hoje). O discurso do governo evoluiu. Ainda não temos ações profundas nesse combate, mas espero que a implementação da GLO (Garantia da Lei e da Ordem) comece a gerar resultados em breve.

Temos de estimular o governo a tomar essas ações. Não menos importante é ter a noção de como nós vamos poder monetizar (o ativo ambiental) para a população da Amazônia. Isso pode ser feito pela venda de créditos de carbono pelo governo brasileiro.

Tivemos de chegar ao ápice da crise para o tema passar a ser debatido com seriedade?

O Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebdes) liderou esse movimento. Começamos com 38 empresas e hoje temos mais 70. Estamos mostrando a cara. Isso dá clareza de que o empresariado acordou para a questão ambiental e repercutiu com o governo.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, sabiamente disse que não precisamos de novas áreas abertas para agricultura e pecuária. Precisamos, sim, reduzir o desmatamento ilegal. Os números são claros: os desmatamentos aumentaram em 2019 e 2020 e nós precisamos voltar a patamares anteriores aos de 2012. Isso vai gerar credibilidade ao Brasil e um grande volume de investimentos.

As comunidades na Amazônia devem ser recompensadas?

Além de um problema ambiental, temos de resolver um problema social. A forma de fazer isso é pelo Acordo de Paris (capítulo 6): permitir a utilização de créditos de carbono. Se o Brasil fizer isso e combater o desmatamento, abre um mundo de oportunidades, que calculamos em US$ 10 bilhões por ano. É dinheiro para beneficiar o povo brasileiro, em especial a comunidade amazônica.

Como grande exportadora, a Suzano está rediscutindo o papel do setor de celulose no mundo?

Sim. Acho muito importante. A gente tem um leque de oportunidades pelo fato de a celulose ser um produto que pode substituir outras matérias-primas, como o plástico, que é derivado de combustível fóssil. A transição vai ser longa, mas algumas substituições já podem ser feitas. E a celulose é o melhor produto. Tanto a gente quanto outras empresas estão trabalhando nisso.

Os bancos estão limitando o crédito para as empresas que desmatam. Como a Suzano pode usar a escala que tem para ajudar o movimento ambiental?

Não existe nenhuma empresa que forneça à Suzano que tenha questões ambientais. Mas é responsabilidade da Suzano olhar fora da sua cadeia para ajudar a fazer uma sociedade mais justa. Temos de dar saúde, educação e oportunidades. Uma das metas que colocamos é retirar 200 mil pessoas da pobreza num prazo de dez anos. São as comunidades que vivem nas áreas onde atuamos. Vamos fazer isso de duas formas: investindo em renda sustentável e em educação.

É importante pensar o meio ambiente também com os critérios de governança e impacto para a sociedade?

Muita gente faz o discurso ESG neste momento porque é conveniente. A Suzano vem fazendo a prática disso há décadas. Não somos perfeitos, mas temos foco na questão ambiental, social e de governança. Temos oportunidade de ir além do carbono, com a reposição do plástico, com menor utilização da água. Na governança, podemos dar mais transparência às ações que temos.

 

Podem surgir ideias de negócios pelo conceito ESG?

A Suzano já é negativa em (emissão de) carbono. Isso pode ser fonte de monetização no futuro. Outra questão é a substituição ao plástico. Há o exemplo da evolução da nossa matriz energética que pode ser ainda mais limpa no futuro. Podemos reduzir (a distância entre as plantas produtoras e as florestas), emitindo menos CO2.

Qual vai ser o papel do consumidor nessa mudança?

O consumidor sempre dita as regras. As empresas são movidas porque são forçadas pela sociedade. A cada dia entra no mercado de trabalho uma pessoa que pensa de uma forma mais moderna. As pessoas que pensam que o objetivo de uma empresa é só a maximização do lucro não têm mais lugar na sociedade. A questão de equidade de gênero e de raça não era debatida com a qualidade e profundidade que se tem hoje. A Suzano tem a meta de, até 2025 ter 30% de líderes mulheres e 30% de líderes negros.

É importante uma empresa colocar metas ambientais e sociais para aos poucos chegar a uma atuação mais consciente?

As metas fazem as empresas se moverem. Todos os anos colocamos uma meta específica, tanto financeira quanto de transformação da sociedade. Se a gente não atingir essas metas, vai afetar o financeiro de cada uma das pessoas. Isso faz com que as pessoas revistem as metas todos os meses.

Como o sr. tem participado de debates sobre a reconstrução da economia brasileira?

Temos uma multiplicidade de problemas no País. O Brasil tem um problema fiscal crônico, agravado pela pandemia. Temos de passar por reformas profundas, ter um modelo econômico que gere oportunidades de emprego, que distribua renda, com modelo de tributação adequado. Nosso Estado é ineficiente, mesmo arrecadando quase 40% do que o País produz. A iniciativa privada deve liderar essa discussão e mostrar para sociedade e governo que essas reformas devem acontecer mais rápido. E as reformas significam abrir mão de privilégios. Temos de taxar os mais ricos e deixar de tributar os mais pobres. Temos de reduzir o custo do Estado brasileiro, com aumento de produtividade, em pelo menos 20%.

 

A Retomada Verde pode ser uma forma de direcionar a reconstrução da economia?

O Brasil tem um potencial ambiental inacreditável, com uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo. Temos a maior floresta. E temos o potencial de usar o gás natural em substituição a outros combustíveis fósseis. O Brasil bateu recorde histórico de produção de energia eólica no Nordeste. Podemos ser uma megapotência ambiental.

 

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