Apoio:
Parceiro institucional:
Di Si, presidente da Volkswagen na América Latina, sobre a indústria automotiva elétrica no Brasil: "Projeção é apostar no etanol e trazer os elétricos e híbridos como um complemento de estratégia" (Volkswagen/Divulgação)
A Volkswagen quer ser a líder em eletricidade. E quer isso para ontem. Durante a apresentação dos resultados financeiros de 2020, a montadora deixou claro que a estratégia daqui para a frente é apenas uma: modernização.
O plano da montadora é vender 1 milhão de veículos elétricos até o final do ano e dominar a indústria até 2025, superando até mesmo a líder no segmento, a americana Tesla. Para dar conta da demanda, a Volkswagen disse que vai inaugurar seis novas fábricas para a produção de baterias na Europa até o final da década.
Além dos elétricos, o grupo também corre contra o tempo para ser mais sustentável: até 2025, a meta é cortar 30% das emissões, e até 2050 o objetivo é atingir a neutralidade em carbono. O ano de 2020 também marcou o retorno oficial da empresa ao Pacto Global, aliança corporativa da Organização das Nações Unidas (ONU) em prol da sustentabilidade.
Ao passo em que se estrutura para ser líder no segmento elétrico e planeja uma ofensiva bilionária que supera o investimento de todas as outras concorrentes no setor, a subsidiária brasileira está apartada dessa realidade, e vivencia um cenário completamente diferente com a alemã.
“Vemos chances de trazer veículos elétricos ao Brasil nos próximos dois ou três anos, mas não é algo que faremos por agora” disse Pablo di Si, presidente da Volkswagen para o Brasil e América Latina. Para ele, um meio termo aceitável para a companhia — que ainda dá braçadas em busca de uma infraestrutura para a indústria automotiva do futuro — é o etanol. "Tirar proveito da matriz já limpa do Brasil e investir em novas tecnologias é a grande vantagem que temos por aqui."
A empresa se aliou à União da Indústria Canavieira (Unica) em pesquisas para o desenvolvimento de uma tecnologia que converte o etanol líquido em células de combustível capazes de abastecer carros elétricos. Se tiver sucesso, a tecnologia extinguiria a necessidade de carregamentos por tomadas e colocaria o Brasil em posição privilegiada em criação de tecnologia — tendo em vista que o país já é hoje o maior produtor da commodity no mundo. Em entrevista à EXAME, Di Si discutiu as ações que irão basear a atuação da montadora em território brasileiro nos próximos anos.
Sem os elétricos, como a Volkswagen mantém o posicionamento sustentável no Brasil?
A estratégia do Brasil está sempre muito conectada aos planos globais. Recentemente fomos reintegrados ao Pacto Global da ONU como reafirmação do compromisso com o planeta e, no Brasil, temos uma vantagem adicional quando falamos em sustentabilidade: 100% da energia elétrica que compramos e utilizamos em todas as fábricas vem de fontes renováveis. A resposta aqui é olhar não apenas para o negócio, mas para a cadeia produtiva como um todo. Temos planos agressivos para reduzir o consumo de água e, desde 2010, já reduzimos mais de 90% dos resíduos por veículo produzido.
A montadora tem metas ousadas de descarbonização. Como o Brasil se encaixa nessa perspectiva global, e quão distante a empresa está de atingir os objetivos?
Além da energia, queremos no Brasil dar um passo adiante em combustíveis limpos. Acima de 90% de nossa frota brasileira hoje é composta de veículos flex, que também utilizam etanol. Quando comparamos esse cenário ao visto na Europa, e principalmente na Alemanha, entendemos que ter uma frota flex é fundamental. Não estamos distantes de atingir as metas sustentáveis. É uma evolução.
A Volkswagen já se posicionou em prol de um futuro mais verde e quer que pelo menos 70% dos carros vendidos na Europa sejam elétricos até 2030. Como estão as projeções por aqui?
Vamos lançar 60 modelos elétricos e 70 híbridos nos próximos cinco anos a nível mundial. Temos uma das maiores ofensivas do mundo. Mas, de nada adianta se não olharmos para a energia que permite a operação desses carros. Temos dois cenários aqui: podemos usar energia nuclear e carvão, ou mirar em fontes como hidráulica, eólica ou solar, por exemplo. Para nós, olhar isso como um todo é fundamental. No Brasil, a projeção é apostar no etanol e trazer os elétricos e híbridos apenas como um complemento de estratégia "limpa".
Algum destes mais de 120 modelos elétricos e híbridos fará parte da realidade brasileira nos próximos cinco anos?
Quem vai determinar isso serão os consumidores. Mas, antes disso, a matriz energética do país e os postos de recarga de baterias. Precisamos de infraestrutura. A união de governos estaduais e marcas é o que irá eletrificar o país. Será um processo mais lento do que vemos na China e nos Estados Unidos e é por isso que os híbridos e os carros movidos a etanol serão a transição perfeita para os modelos 100% elétricos no Brasil. Apenas trazer os veículos para cá, tal como o ID.4, seria fácil. O problema está naquele motorista que não conseguirá dirigir de uma capital a outra por falta de postos de carregamento.
Essa ausência de infraestrutura é o principal entrave para o avanço dos elétricos por aqui?
Sim, e também os custos. Custaria bilhões erguer uma infraestrutura, e no momento o Brasil tem outras prioridades sociais e econômicas. Adoraríamos lançar um carro elétrico aqui no próximo ano, mas estamos cientes da realidade atual.
Como a Volkswagen quer conectar os dois extremos que temos por aqui (extinguir os combustíveis fósseis e chegar aos veículos 100% elétricos)?
Infraestrutura e tecnologia. Em 2019, fizemos uma parceria com a EDP para o fornecimento de postos de recarga rápida para os carros do grupo. Os postos iam de Espírito Santo a Santa Catarina. Ainda queremos que isso avance, mas o etanol é ainda nossa maior aposta. Estamos nos unindo à Unica, associação do setor, para criar uma tecnologia revolucionária que permite o uso de etanol nos carros elétricos. Sabemos que o carro a combustão vai acabar em algum momento, e as pesquisas em andamento com a Unica são uma maneira de acelerar a chance do Brasil de exportar não apenas a commodity mas também conhecimento e valor tecnológico. Essa seria uma ótima maneira de inserir o Brasil nessa mobilidade do futuro.