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Técnicas alternativas de datação têm sido utilizadas para investigar a variabilidade climática natural. (Envato)
Publicado em 29 de janeiro de 2025 às 14h00.
Última atualização em 29 de janeiro de 2025 às 16h00.
No final de 2023, Manaus sofreu a pior seca dos últimos tempos, de acordo com as medições de nível d’água feitas no rio Amazonas em mais de um século. As margens do rio revelaram artefatos e sítios arqueológicos, visíveis pela primeira vez devido ao baixo nível da água. Esses eventos de seca se repetiram na bacia amazônica em 2024, superando recordes negativos em diversos locais.
Por outro lado, chama a atenção o fato de que metade das cheias emergenciais registradas em Manaus ocorreu depois dos anos 2000. A intensificação desses eventos nas últimas décadas está relacionada tanto às mudanças climáticas provocadas pelo homem como à variação natural do clima. No entanto, os postos de medição mais antigos têm pouco mais de 100 anos, e suas informações não são suficientes para investigar os ciclos naturais.
Por isso, técnicas alternativas de datação têm sido utilizadas para investigar a variabilidade climática natural no período anterior ao início das medições. A dendrocronologia – ciência que busca definir a idade de uma árvore conforme o padrão de anéis em seu tronco – também fornece dados sobre o clima do passado, e pode ser usada para reconstruir eventos extremos. Nesse sentido, essa técnica deve ser combinada com pesquisas de registros históricos do clima e dos níveis d’água dos rios.
Dessa forma, com um instinto protetor similar ao dos Ents – espécie humanoide de árvores da Terra Média, da série Senhor dos Anéis – as árvores amazônicas, por meio de seus próprios anéis, acabam nos ajudando a “contar” uma parte da história sobre a qual não temos acesso direto.
Um exemplo é a “seca esquecida” de 1865, que teria tido a menor precipitação total na estação chuvosa conhecida. Cheias excepcionais, como a de 1818, também foram identificadas com essa abordagem, e respaldadas por registros históricos. Outros eventos reconstituídos incluem a inundação completa da antiga Primeira Rua em Santarém, em 1859, e o galgamento da Ponte Bittencourt em Manaus, em 1892.
Talvez a referência específica mais contundente seja a inundação da Primeira Rua, hoje Rua 24 de Outubro, pois sabe-se que a cheia teria “profundidade suficiente para fazer flutuar canoas”. Neste caso, a cota de inundação estimada foi superior à observada na enchente de 2009, quando o rio Amazonas atingiu o maior valor registrado na régua de medição de Santarém.
Como os registros das réguas dos postos hidrométricos no rio Amazonas apresentam boas correlações, pode-se avaliar que o nível d’água estimado para Santarém em 1859 resultaria em um nível equivalente ao da inundação de 2021 em Manaus.
Assim, uma análise das inundações e secas sem registro oficial, através da combinação da dendrocronologia com a pesquisa de documentos históricos, pode ser muito útil para compreender a influência antrópica sobre os ciclos naturais e orientar a elaboração de planos de adaptação.