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Gerd Leonhard (Bloomberg/Getty Images)
Editor ESG
Publicado em 15 de agosto de 2023 às 07h00.
Uma das mais célebres frases de Millôr Fernandes, autor e cartunista que completaria 100 anos neste ano, versa sobre a produção de notícias. “Imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados”, disse Millôr, um dos maiores cronistas da literatura brasileira. A ideia de que boas notícias não são notícias norteia do trabalho da imprensa profissional nos quatro cantos do mundo – good news, no news, dizem os britânicos.
Há um sentido utilitário nessa postura, que confere ao gênero literário da produção de notícias um caráter profissional, como se descrever fatos e acontecimentos fosse um trabalho braçal e objetivo. Ao mesmo tempo, coloca o jornalismo em uma posição de independência rebelde, garantindo ao escritor o direito de não fazer compromissos além do que sua consciência permite.
O objetivo é fazer do jornalista um fiscal da sociedade e defensor da democracia. Ao revelar as injustiças e os perigos do mundo, a notícia profissionalmente produzida mobiliza a sociedade na direção do correto – a informação, devidamente contextualizada, liberta. Mas, e se essa postura opositora, em vez de mobilizar, provocar um medo paralisante diante de uma catástrofe iminente?
Essa pergunta preocupa jornalistas e cientistas envolvidos com o tema das mudanças climáticas, talvez a maior crise global já enfrentada pela humanidade. Qual é o nível de alarme adequado que fará a sociedade temer o fim do mundo e acreditar na salvação ao mesmo tempo? Para o futurista alemão Gerd Leonhard, a questão é central, inclusive, para o entendimento da dimensão dos riscos associados ao aquecimento global. “As pessoas precisam acreditar em um futuro possível”, afirmou Leonhard à EXAME.
Palestrante, autor e criador do projeto The Good Future, Leonhard busca convencer as pessoas de que o futuro é promissor e que há uma saída estabelecida para resolver a crise climática, apesar de toda a negatividade presente nas notícias e das previsões catastróficas da ciência -- ele estará no Brasil, nesta semana, para participar do Anbima Summit, evento promovido pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).
Não é tarefa fácil, mas as ideias de Leonhard ganham cada vez mais ouvidos, em especial no setor de tecnologia. Empresas como IBM, Microsoft e Google já contrataram suas palestras, que se tornaram notórias no Vale do Silício -- talvez porque o futurista credita boa parte do seu otimismo ao avanço tecnológico. “Não precisamos ser alarmistas em relação às mudanças climáticas, precisamos agir”, disse Leonhard. “Já temos a tecnologia para solucionar o problema.”
De fato, o que está entre a humanidade e a descarbonização da economia, principal linha de combate contra as mudanças climáticas, é a transição energética, cuja base tecnológica -- as energias renováveis – está bem consolidada. Há ainda avanços no horizonte, como a fusão nuclear, que não só resolveriam o problema, como aumentariam o acesso à energia e o nivel de qualidade de vida da população.
Leonhard, em nenhum momento, se mostra alheio ao tamanho do desafio ou demonstra traços de negacionismo. Sua visão otimista se deve à capacidade humana de superar adversidades, conquanto que os indivíduos trabalhem em conjunto. Ele não está sozinho nessa. Existem outros pensadores com a mesma visão otimista do mundo e da humanidade.
O holandês Rutger Bergman, autor do livro Utopia para Realistas, também critica o sensacionalismo midiático e defende um olhar utópico para o futuro. Ainda que essa utopia não seja alcançada em sua totalidade, sua busca movimenta as engrenagens econômicas da prosperidade. “O verdadeiro progresso começa com algo que nenhuma economia do conhecimento pode produzir: sabedoria sobre o que significa viver bem”, escreveu Bergman em seu best-seller. “Temos que fazer o que grandes pensadores como John Stuart Mill, Bertrand Russel e John Maynard Keynes já defendiam 100 anos atrás: “Valorizar mais os fins do que os meios e preferir o bom ao útil.”
Em sua sabedoria, Leonhard acredita que uma sociedade educada em bem informada encontra a motivação necessária para se unir em torno de um objetivo e trabalhar nele, processo que salvaria a humanidade dos efeitos catastróficos das mudanças climáticas. Para isso, é preciso comunicar bem o problema, sem escondê-lo e sem exageros alarmistas. O próximo passo é promover as mudanças que vão gerar o progresso. Mas, aí, esbarra-se em outro grande “frasista”, Mark Twain: “Eu sou totalmente a favor do progresso; é da mudança que eu não gosto.”