Patrocínio:
Parceiro institucional:
Mahryan Sampaio: "Acreditamos em financiar a transição energética de forma equitativa, para pagarmos a conta da adaptação climática especialmente nos territórios mais vulneráveis"
Repórter de ESG
Publicado em 8 de abril de 2025 às 17h00.
Última atualização em 8 de abril de 2025 às 17h20.
"A desigualdade está presente em todo Brasil, mas quando olhamos para a Amazônia – região tão rica em inovação e tradição – e analisamos o campo das políticas públicas, encontramos um verdadeiro caos", disse à EXAME Mahryan Sampaio, ativista ambiental e presidente do Fundo de Educação Ambiental (FunBEA).
O fundo é o primeiro da América Latina a mobilizar recursos na área e funciona como uma ponte para garantir que cheguem nas comunidades mais vulneráveis. Em 2024, foram R$ 4 milhões destinados para diferentes territórios brasileiros e neste ano em que o Brasil recebe a COP30, o plano é expandir os investimentos em lideranças e coletivos locais.
Mulher negra e carioca, Mahryan conta que sua grande paixão é pela transformação e atua desde muito cedo em iniciativas voltadas à promoção de direitos humanos das minorias sociais. Delegada brasileira nas últimas quatro Conferências de Mudanças Climáticas da ONU (COP26 em Glasgow, COP27 em Sharm El-Sheikh, COP28 em Dubai e COP29 em Baku), a ativista traz a luta do racismo ambiental pela lente do Sul Global.
Enquanto o país se prepara para receber a grande Conferência do Clima da ONU em Belém do Pará, as mazelas regionais, a carência de acesso ao financiamento climático e a falta de infraestrutura emergem como preocupações centrais para quem (assim como ela) atua na linha de frente das mudanças climáticas.
A Amazônia é peça-chave para o equilíbrio climático e manutenção dos ecossistemas -- e ao mesmo tempo é o de maior vulnerabilidade social. A população carece de direitos básicos como moradia, educação, saúde e água potável, enquanto a região Norte lidera os piores índices de saneamento básico.
No FunBEA, Mahryan é presidente do conselho deliberativo e tem como papel aprovar as ações e projetos da organização, divididos em quatro programas: água, clima, biodiversidade e saúde ambiental.
Além disso, ela é cofundadora do Instituto Perifa Sustentável, com o objetivo de mobilizar juventudes periféricas para a construção de uma agenda climática justa e inclusiva, e membro ativa da Rede de Adaptação Antirracista, em que participa de diversos movimentos que visam descentralizar os recursos.
Para avançar na agenda neste ano de COP30, Mahryan acredita no financiamento justo e na promoção da justiça climática. Este conceito amplamente utilizado por movimentos socioambientais entende que as mudanças climáticas impactam as populações mais vulneráveis de forma desproporcional e é preciso lutar por igualdade.
"Acreditamos em financiar a transição energética de forma equitativa, para pagarmos a conta da adaptação climática em todos os territórios, especialmente para aquelas pessoas que mais sofrem com os impactos de eventos extremos", destacou.
A adaptação climática foi incluída em 2024 como um dos pilares do novo Plano Clima, vinculado a política nacional e metas do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). O governo federal escolheu 1.038 cidades como prioritárias para as ações, sendo que 200 delas estão na Amazônia Legal. Entre as localidades com maiores riscos, 60% estão no Amazonas e Maranhão, e em seguida vem o Pará (39), Mato Grosso (15), Tocantins (10), Acre (7), Roraima (3), Amapá (2) e Rondônia (2).
Paralelamente, há também o Programa Verde Cidades Resilientes, com a proposta de reduzir desigualdades e os riscos de desastres de origem climática nos territórios urbanos mais suscetíveis. Na última quarta-feira (2), o MMA anunciou as 50 cidades selecionadas para a fase inicial do programa que prevê 100 projetos voltados à adaptação e mitigação.
Na região Norte, Rio Branco (AC), Abaetetuba (PA), Altamira (PA), Boa Vista (RR), Cametá (PA), Caracaraí (RR), Ji-Paraná (RO), Manaus (AM), Parintins (AM) e Tarauacá (AC) serão contempladas.Mahryan celebra um maior reconhecimento da importância da adaptação nas discussões e negociações do clima. Para ela, a participação social é crucial para que as políticas públicas sejam eficazes e inclusivas e enfatiza que mulheres e lideranças locais estão à frente da implementação e aproximação com as realidades de cada região.
"A COP na Amazônia tem um peso simbólico, não só para o Brasil, mas para o mundo. Precisamos ter a predominância e a ocupação desse espaço por vozes que são muito estratégicas", destacou.
Mahryan reforça que a COP30 acontece dez anos depois do histórico Acordo de Paris, o que aumenta a pressão para que haja implementação real dos compromissos -- e "não apenas discursos". Como uma continuação da COP29, em Baku, no Azerbaijão, ela acredita que é preciso avançar no financiamento e garantir que seja de forma justa e suficiente para driblar os efeitos da crise climática.
“Eu diria que é quase como uma série, é a 'COP parte 2 de financiamento'. Porque na última não definimos o necessário. E a grana precisa ser para tudo: transição energética, adaptação climática, especialmente nos territórios mais vulneráveis", concluiu.
Por outro lado, ela demonstrou uma preocupação com os preços altíssimos de hospedagens e a falta de acomodação, além dos desafios logísticos desta edição.
"Isto poderia acabar afastando a sociedade civil - justamente quem precisa estar no centro das discussões. Muitos ativistas já estão reservando acomodações em 'cidades satélites', nos arredores de Belém", ressaltou.