Pavilhão da COP27, que acontece nesta e na próxima semana em Sharm el-Sheikh, no Egito (Leandro Fonseca/Exame)
Rodrigo Caetano
Publicado em 10 de novembro de 2022 às 11h37.
Última atualização em 10 de novembro de 2022 às 11h47.
Para Izabella Teixeira, ex-ministra do Meio Ambiente , a questão ambiental é o caminho para o Brasil propor uma nova ordem nas relações internacionais globais, que estão num processo de reformulação. A partir da ideia de associação entre preservação ambiental e desenvolvimento humano, essa nova diplomacia está baseada em um multilateralismo renovado, no qual a cooperação entre os blocos econômicos não se dá apenas no sentido Norte e Sul, mas também Leste e Oeste. A tradicional política Sul-Sul, adotada nos governos petistas, expande-se para o leste, onde encontra terreno fértil para uma agenda de desenvolvimento centrada no clima.
O primeiro passo para essa nova política externa pode já ter acontecido na COP27, a conferência do clima da ONU, realizada este ano em Sharm el-Sheikh, no Egito. Teixeira foi peça-chave na elaboração de uma aliança entre Brasil, Congo e Indonésia para proteção e desenvolvimento de florestas tropicais – os três países possuem as três maiores áreas tropicais do planeta.
A ex-ministra dos governos Lula e Dilma falou em um painel organizado por entidades climáticas no Brazil Climate Hub, o estande da sociedade civil na COP27. Ela teve ao seu lado Ève Bazaiba Masudi, vice-primeira ministra e ministra do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da República Democrática do Congo, e Agus Justianto, diretor geral de Manejo Florestal de Produção Sustentável do Ministério do Meio Ambiente e Florestas da Indonésia.]
“São as florestas que fazem parte do desenvolvimento, não sua retirada, que só gera pobreza”, afirmou Teixeira. “O Brasil precisa assentar sua nova visão sobre floresta, que tem de pactuar com a sociedade.” A aliança foi costurada durante a campanha eleitoral, com aval do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Coordenador do programa de governo do petista, Aloizio Mercadante afirmou que o plano era montar a coalização para pressionar os países desenvolvidos por financiamento na COP27, em caso de vitória de Lula.
Teixeira, no entanto, rechaça essa ideia. Sua visão é mais abrangente, inclui mudanças nas regras de engajamento entre as nações ricas e pobres e o acesso a recursos tecnológicos, tão importantes quanto os financeiros (ou até mais). “Essa pauta não é apenas financeira”, afirmou a ex-ministra, que também é conselheira da Presidência da COP27.
O multilateralismo, que sempre esteve no centro da política externa de Lula, acaba ganhando um aspecto global nessa nova configuração proposta por Teixeira. A questão ambiental aparece como interesse comum de todos os países, e ponto de partida para negociações. “O clima é uma agenda de desenvolvimento”, afirmou Teixeira à EXAME, após o evento. “Esse é o futuro que já está no presente.”
A nova ordem se faz necessária diante do desafio de resolver a crise climática, cuja resposta está na transição para a economia de baixo carbono, e diante do contexto atual de retrocesso em função da Guerra na Ucrânia. “A dinâmica de cooperação do mundo está mudando”, define Teixeira.
O histórico da busca por uma coalização como a anunciada na COP27 mostra o quanto essa dinâmica está, de fato, se alterando, e o quanto pode favorecer o Brasil. Essa ideia foi aventada pela primeira vez em 1992, na Rio 92, conferência que deu início aos encontros climáticos posteriormente batizados de COP. “Na época, países que não tinham florestas não aceitaram”, disse Teixeira. “Tentamos novamente em 2012, mas não avançou.” O jogo mudou.
É consenso, atualmente, que sem a proteção das florestas em geral, e as tropicais, como a Amazônia, em particular, não é possível atingir a meta do Acordo de Paris de manter o aquecimento global em 1,5 grau Celsius. Ter floresta, desde que esteja em pé, obviamente, se tornou um ativo e moeda de negociação.
A ex-ministra, porém, rechaça uma postura “chantagista” que condicione a preservação ambiental a vantagens ou recursos obtidos de terceiros. A soberania do Brasil na Amazônia se manifesta na capacidade do país de decidir sobre o futuro desses territórios, e ela se fortalece com o compartilhamento sustentável dos recursos e conhecimentos provenientes da floresta. “O desmatamento não é solução para ninguém. Estamos propondo uma questão política inovadora, voltada para o desenvolvimento humano”, define Teixeira.
A ex-ministra, que chefiou a delegação brasileira na COP de Paris, quando foi assinado o Acordo de Paris, é cotada para assumir um cargo no novo governo petista. Umas das apostas é que ela chefia a nova secretaria de autoridade climática, que foi uma sugestão da também ex-ministra Marina Silva – na verdade, uma exigência de Silva para apoiar Lula. Teixeira, no entanto, desconversou quando questionada sobre sua participação no governo.