ESG

Favela Global: em Davos, um plano para expandir a CUFA internacionalmente

Celso Athayde convida a diplomata Adriana Telles Ribeiro para escrever sobre a trajetória conjunta e o sonho de levar a organização das favelas brasileiras para todo o planeta

Celso Atahyde, fundador da Central Única das Favelas (CUFA) (EXAME/Exame)

Celso Atahyde, fundador da Central Única das Favelas (CUFA) (EXAME/Exame)

RC

Rodrigo Caetano

Publicado em 10 de junho de 2022 às 10h27.

Última atualização em 10 de junho de 2022 às 17h59.

Muitos têm me perguntado sobre um panorama geral de como foi minha ida para Davos para receber o prêmio de Empreendedor de Impacto e Inovação do Fórum Econômico Mundial 2022. Acredito que já falei muito sobre este acontecimento. Logo, quero passar a palavra pra pessoa que foi minha fiel escudeira nessa empreitada, e utilizou todo o seu know-how de diplomata para deixar a minha viagem uma uva. A mais tranquila possível. Dessa vez não vou escrever, vou deixar a minha parceira com a caneta e a tinta.  Vai que é sua, Adriana Telles Ribeiro:

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“Conheci o Celso Athayde em fevereiro de 2015, quando, juntamente com o Preto Zezé, baixou na missão do Brasil na ONU em Nova York para conversar com o meu então chefe, o ex-chanceler Embaixador Antônio Patriota, para apresentar o projeto de lançamento da CUFA Global nas Nações Unidas.

Fui chamada por acaso pela secretária do embaixador para tomar notas da reunião, e lembro da apresentação impactante que o Celso fez naquele dia. Como quem o conhece sabe, sempre começa falando de sua experiência própria, de ter morado na rua dos 6 aos 12 anos de idade com sua mãe e irmão mais velho. E de como aos 14, ao deixarem um abrigo público para morar na Favela do Sapo, se encantou - sendo esse o lugar onde considera ter sido criado - para mais tarde se dedicar à geração de oportunidades para moradores das favelas de todo o Brasil através da CUFA e da Favela Holding.

Impossível assistir àquela apresentação do Celso, com imagens de projetos da CUFA tão variados - como a Taça das Favelas, Hutúz Rap Festival, o Prêmio Anu de iniciativas sociais - entre tantos outros, e não ficar mobilizada com a revolução social que representa, envolvendo milhões de moradores de favelas brasileiras. Participei assim inteiramente nos preparativos da semana da CUFA Global, que aconteceu em setembro de 2015, e desde então colaboro de vez em quando com traduções de projetos e reuniões internacionais como voluntária.

Foi assim que me vi escalada para acompanhar os preparativos da viagem do Athayde para o Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, onde receberia o Prêmio de Empreendedor de Impacto e Inovação de 2022. Corajoso e ousado, decidiu fazer o discurso dele em inglês, e praticamos online nas manhãs que antecederam a viagem.

Uma vez em Davos, fui reparando no seu jeito de interagir com todos e todas, começando quase sempre com brincadeiras atrevidas e arrancando risadas das pessoas, para então introduzir assuntos mais sérios de possíveis agendas em comum. Quando as pessoas se davam conta, já estavam sendo gravadas dando depoimentos sobre a vontade de colaborar com a CUFA ou participando de suas inúmeras “lives” no Instagram.

Um dos encontros foi entre o Celso e o jovem queniano Kennedy Odede. Criado na maior favela da África, Kibera, que fica na capital queniana de Nairóbi, Kennedy morou anos na rua durante a infância e perdeu muitos amigos para a violência na adolescência. Estudou por conta própria e criou uma ONG que hoje lidera, a SHOFCO, em defesa dos direitos dos moradores da Kibera. Com seus vinte e cinco anos a mais de vida e conhecimentos, Celso ia contando para o Kennedy sobre as estratégias e projetos da CUFA, e o Kennedy arregalava cada vez mais os olhos, entusiasmado, enchendo ele de perguntas e puxando conversas novamente a cada oportunidade nos dias seguintes. Ficou claro ali quantas figurinhas a CUFA tem para trocar com lideranças de favelas do mundo inteiro.

Observei também traços do estilo de atuação do Celso, da abertura para o diálogo, sempre mantendo presente o papel institucional das interações e representando os interesses de seu “partido”, a favela. Em alguns momentos, parecia um jogador de futebol com ágeis habilidades diplomáticas, como quando conseguiu ser ovacionado por uma plateia inteira, transmitir recados importantes sobre seu conceito de “quarto setor” e ainda entregar uma bolsa feita por uma empresa de mulheres de uma favela de Curitiba – a Badu Design – para uma das pessoas mais poderosas do Fórum Econômico Mundial, a cofundadora Hilde Schwab, que veio lhe agradecer depois.

Também testemunhei encontros sobre iniciativas antirracistas internacionais, além de conversas do Celso com pretas e pretos de diversos países da diáspora africana, e percebi a vontade mútua de vencer as barreiras do idioma e unir esforços em lutas com tantas características comuns ao redor do mundo.

Embora tenha ido a Davos em capacidade pessoal, de férias, ter assessorado o Celso Athayde no Fórum Econômico Mundial em Davos terá sido certamente uma das experiências profissionais mais valiosas de minha carreira, uma aula de diplomacia pública que representa não apenas o Estado, mas a potência das mais de 17 milhões de pessoas que moram nas favelas do Brasil. Dessa oportunidade, e das muitas risadas com as brincadeiras malucas do Celso, nunca me esquecerei.”

*Celso Athayde é fundador da Central Única de Favelas e CEO da Favela Holding

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