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Europa declara guerra ao desperdício: moda e comida pagarão por descarte

Novas regras na UE atacam perda anual de 132 bi de euros em alimentos desperdiçados e forçam indústria fast fashion a arcar com reciclagem

UE perde anualmente o equivalente ao PIB da Hungria com alimentos que vão para o lixo. (Freepik/Freepik)

UE perde anualmente o equivalente ao PIB da Hungria com alimentos que vão para o lixo. (Freepik/Freepik)

Lia Rizzo
Lia Rizzo

Editora ESG

Publicado em 19 de fevereiro de 2025 às 17h03.

Última atualização em 19 de fevereiro de 2025 às 17h28.

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A União Europeia estabeleceu um acordo para implementar novas regras abrangentes sobre resíduos alimentares e têxteis, atribuindo os custos do descarte às empresas e impondo novas obrigações ambientais às plataformas de comércio eletrônico do continente.

A atual presidência do Conselho da UE, exercida pela Polônia, alcançou o avanço após intensas negociações nos últimos dias, focando especialmente os objetivos de redução do desperdício alimentar e nas medidas para conter a cultura do vestuário descartável — o que afeta diretamente as chamadas fast fashion.

O setor alimentício gera aproximadamente 60 milhões de toneladas de lixo anualmente na UE, enquanto o setor têxtil adiciona 12,6 milhões de toneladas.

Juntas, estas indústrias representam parte considerável dos resíduos municipais e industriais, além das emissões de carbono provenientes dos processos de produção e descarte.

O acordo provisório fixará metas compulsórias com força de lei, para diminuir as perdas de alimentos. E obrigará produtores de vestuário a arcar com os custos de coleta, triagem e reciclagem de têxteis, após as negociações entre o Parlamento Europeu e o Conselho, finalizadas na noite desta última terça-feira, 18.

As medidas estabelecerão encargos financeiros e regulatórios adicionais às empresas, incluindo marcas de fast fashion e varejistas online, em um contexto que intensifica o monitoramento do impacto ambiental das indústrias de consumo.

Descarte estimado em 132 bilhões de euros

Um dado alarmante revelado pelas estatísticas da UE indica que aproximadamente 11% dos alimentos são desperdiçados antes mesmo de saírem das propriedades agrícolas.

Com o acordo, os Estados-membros da UE precisam reduzir o desperdício de comida em 10% na fabricação e processamento, e em 30% per capita no varejo, restaurantes, serviços de alimentação e residências até o final de 2030, calculado a partir de uma linha de base média de 2021-2023.

As grandes empresas do setor alimentício terão a obrigação de viabilizar doação do que não for vendido, mas apropriado para consumo, em um esforço adicional para minimizar o descarte desnecessário.

Este aspecto é particularmente relevante considerando que mais de 59 milhões de toneladas de alimentos são descartadas anualmente na UE, representando uma perda econômica estimada em 132 bilhões de euros.

Fast fashion na mira

Atualmente a União Europeia gera aproximadamente 5,2 milhões de toneladas de resíduos têxteis anualmente, dos quais apenas um quarto é reciclado. O restante tem como destino aterros sanitários ou incineradores, resultando na liberação de poluentes prejudiciais ao meio ambiente.

As novas medidas ampliam a responsabilidade dos fabricantes (REP), determinando que todos os produtores têxteis — independentemente de estarem baseados na UE ou comercializando via e-commerce — deverão pagar uma taxa para financiar todo o processo de reciclagem de seus produtos desde a coleta, com base no grau de sustentabilidade dos mesmos.

O prazo estabelecido é de 30 meses a partir da implementação da diretiva, com 12 meses adicionais para pequenas empresas com menos de dez funcionários.  E a nova legislação se insere em um contexto mais amplo de esforços da União Europeia para combater o fast fashion e seus impactos ambientais.

Em setembro de 2023, o bloco já havia estabelecido objetivos para o setor, determinando que até 2030 todos os produtos têxteis comercializados na UE devem ser produzidos com fibras recicladas, além de apresentarem características de durabilidade, reparabilidade e reciclabilidade.

No entanto, os desafios técnicos e logísticos são consideráveis. Atualmente, menos de 1% das roupas passa por processos de reciclagem fibra a fibra, e as tecnologias necessárias ainda estão em desenvolvimento.

Entre os principais obstáculos está a complexidade da separação de diferentes tipos de fibras para criar matéria-prima adequada para reciclagem. E apesar dos compromissos de sustentabilidade da indústria e de diversas iniciativas de reciclagem existentes, a redução significativa do desperdício de vestuário continua sendo um gargalo que demanda uma resposta regulatória coordenada.

Freio no marketing agressivo

O texto acordado reconhece explicitamente que o rápido crescimento do mercado do comércio eletrônico, embora traga oportunidades, representa um desafio significativo em termos de proteção ambiental.

Esta preocupação se reflete nas disposições que permitem penalizar estratégias de marketing que promovam o consumo excessivo de produtos têxteis e, consequentemente, geração excessiva de resíduos.

Neste sentido, a legislação prevê, por exemplo, taxas mais altas para empresas que estimulem compras através do marketing agressivo. Os governos da UE poderão aumentar a cobrança para marcas que lançam muitos produtos em pouco tempo, e reduzir para aquelas que ofereçam serviços de reparo e incentivem o uso prolongado das roupas.

Embora não existam penalidades específicas para a produção em massa de vestuário com ciclo de vida curto, está previsto que custos de conformidade recaiam principalmente sobre as empresas que saturam o mercado com ítens de moda descartáveis de baixo custo. O que significa que marcas que vendem grandes volumes de roupas baratas e descartáveis, a exemplo da Shein, pagarão as maiores taxas.

Celebração ponderada

Embora tenham celebrado a iniciativa da União Europeia, organizações ambientais expressaram preocupações quanto à efetividade do acordo, criticando especialmente a ausência de medidas mais rigorosas para redução de resíduos no nível da produção.

Essas entidades argumentam também que a meta de 10% para fabricação e processamento de alimentos deveria ser significativamente mais elevada, por estar aquém do compromisso estabelecido pela ONU.

Para as plataformas de comércio eletrônico, o acordo representa uma transformação regulatória significativa. Os varejistas online, incluindo aqueles sediados fora da UE mas que comercializam para o bloco, estarão sujeitos às mesmas obrigações que os negócios físicos tradicionais.

A implementação dessa medida promete ser desafiadora, especialmente devido à proliferação de plataformas de fast-fashion com sede na China, no Reino Unido e nos Estados Unidos, que realizam envios diretos para consumidores europeus.

Europa pode ditar ritmo global?

Embora o acordo ainda precise de aprovação formal do Conselho da UE - etapa considerada protocolar devido ao amplo apoio político já obtido — a nova regulamentação sinaliza uma mudança fundamental na forma como as empresas devem abordar suas responsabilidades ambientais.

A implementação dessas medidas marca ainda um momento histórico na política ambiental europeia, de compromisso concreto com a sustentabilidade e estabelece um precedente importante para outras regiões do mundo.

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