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Do plantio à venda, negócio com café tem negros no protagonismo e busca reparação histórica

Com iniciativa no campo, empreendedor do Café di Preto se insere no movimento Black Money, que promove o comércio entre pessoas negras como uma ferramenta de progresso social

Reparação: com a marca Café di Preto, Brandão leva ao mercado grãos cultivados por agricultores negros (AFP Photo)

Reparação: com a marca Café di Preto, Brandão leva ao mercado grãos cultivados por agricultores negros (AFP Photo)

AFP
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Agência de notícias

Publicado em 20 de maio de 2024 às 17h26.

Raphael Brandão contempla orgulhoso os grãos que saem de seu torrador: seu café de alta qualidade foi produzido por agricultores negros no Brasil, um país onde esse produto ainda está associado aos sofrimentos da escravidão.

Ao abastecer-se exclusivamente em fazendas pertencentes a afrodescendentes, este homem de 31 anos quer "inverter a lógica" segundo a qual pessoas negras como ele seriam limitadas a ser "mão de obra barata".

É "tentar da maneira que eu posso fazer uma reparação histórica no café [...], um produto da África. É um produto que veio para o Brasil. E que por meio da mão de obra negra escravizada fez com que o Brasil se tornasse o maior produtor do mundo", diz à AFP este jovem de cabelo afro, óculos de armação fina sobre o nariz.

Em sua torrefação artesanal em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, ele dá o toque final aos produtos de sua marca Café di Preto, lançada em 2020. Seu logo: um punho negro levantado segurando um ramo de café.

O Brasil foi o último país da América a abolir a escravidão, em 1888, e as desigualdades permanecem muito fortes neste país onde mais da metade da população se declara preta ou parda.

Primeira geração

Determinado em demolir o "estigma de que pessoas pretas não produzem qualidade", este microempreendedor produz apenas "café especial", uma denominação controlada de prestígio.

"No início não foi fácil achar esses produtores [negros]", conta ele, já que a grande maioria das plantações de café no Brasil pertence a famílias brancas.

"É sempre o produtor herdeiro, é sempre um produtor que está cinco gerações fazendo café. E essa galera que eu trabalho geralmente é a primeira geração trabalhando com café", continua Brandão.

Com mais de 18 mil seguidores no Instagram, ele usa as redes sociais não só para promover seus produtos, mas também para conscientizar as pessoas sobre questões raciais.

Brandão se defende de qualquer comunitarismo. "Me perguntam: 'E se fosse o contrário? E se torrefações brancas só trabalhassem com produtores brancos?' Não é o que acontece no dia a dia?", rebate. Ele se insere assim no movimento "Black Money", que promove o comércio entre pessoas negras como uma ferramenta de progresso social.

Da produção à xícara

Nas embalagens de seu café, vendido online, pode-se ler um breve texto sobre a história da família que produziu os grãos, que chegam em grandes sacos empilhados em sua pequena oficina de cerca de vinte metros quadrados antes de serem torrados.

Cada linha de café é batizada em homenagem a uma mulher negra, às vezes uma personalidade como Dandara, companheira de Zumbi dos Palmares, líder quilombola e da resistência dos escravos contra a opressão portuguesa no século XVII.

O café "Auxiliadora" leva o nome da cunhada de Neide Peixoto, 49 anos, uma das primeiras a fornecer seus grãos para Brandão. A 500 km de Nova Iguaçu, sua plantação de 19 hectares está localizada em Santo Antônio do Amparo, Minas Gerais, um importante polo de produção de café.

"Meus pais eram colhedores de café nas fazendas da região e eu sempre ia desde pequenininha com eles", relata Peixoto, usando um chapéu de palha para se proteger do sol.

Mas, ao contrário de seus pais, ela cultiva café em terras que pertencem à sua família, em uma fazenda comprada por seu marido e seus irmãos,  que antes trabalhavam em plantações que pertenciam a donos brancos.

"No passado, nós, negros, a nossa história foi uma história muito difícil, muito sofrida. Então, hoje, eu poder ser uma produtora e ser reconhecida é algo muito bom. A gente fica muito feliz", diz ela.

A maior parte de sua produção é destinada à exportação, mas os grãos fornecidos ao Café di Preto têm um sabor especial: "É emocionante saber que o café que eu produzo, que é um café produzido por negros, também é um café torrado por negros. Eu fico muito feliz de saber que a gente está fazendo essa conexão, desde a produção, aqui na lavoura, até na xícara".

O conceito deu certo. As vendas do Café di Preto não param de crescer, passando de 800 kg em 2022 para 1,3 tonelada em 2023. Raphael Brandão espera vender mais de duas toneladas este ano, após um aumento de 20% nas vendas no primeiro trimestre.

Acompanhe tudo sobre:Equidade racialCaféAgriculturaNegros

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