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Danos: hoje, há 500 zonas mortas ao longo das costas e quase não resta vida marinha (Getty Images)
Jornalista
Publicado em 8 de junho de 2024 às 07h30.
O Dia Mundial dos Oceanos, 8 de junho, estabelecido oficialmente pela ONU em 2008, teve como embrião a Conferência da Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ECO-92, realizada no Rio de Janeiro em 1992, quando foi feita a proposta para a criação da data. Foi uma forma de chamar a atenção para as ameaças aos Oceanos Atlântico, Pacífico, Índico, Ártico e Antártico.
Mesmo depois do alerta feito há 32 anos pelos participantes do evento sediado pelo Brasil, a situação só se agravou, como mostram os alertas feitos periodicamente pelos organismos internacionais, cientistas e ONGs ambientais.
A data deveria marcar muitas reverências - seja pela beleza, rica vida marinha, por ser fonte de alimentação e de renda. Mas formado por tanta água, responsável por cobrir mais de 70% da superfície do planeta, o oceano se torna a cada dia uma fonte crescente de preocupação para ambientalistas, governantes e estudiosos.
Sob sinal de alerta, os oceanos refletem o rápido agravamento das mudanças climáticas. Em 2023, a temperatura das suas águas chegou ao maior nível histórico, segundo o estudo State of The Ocean, divulgado pela Unesco. As suas águas estão com temperatura 1,45ºC mais alta do que o registrado nos níveis pré-industriais. Em algumas áreas, como no Mediterrâneo e na parte tropical do Oceano Atlântico, este número já ultrapassa os 2ºC.
Em 20 anos, segundo a Unesco, a taxa de aquecimento do oceano duplicou. Um os reflexos foi o aumento do nível do mar em 9 centímetros ao longo de 30 anos. O processo acontece porque a água mais quente se expande mais e ainda colabora para o derretimento das camadas polares.
A área ocupada pelos oceanos concede a eles um papel fundamental no ciclo hidrológico. Neste processo, a água é permanentemente transferida do oceano para as nuvens, para os continentes e de volta para o oceano, como explica em publicação Edmo J. D. Campos, professor do Departamento de Oceanografia Física, Química e Geológica do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP). "Isso faz dele um componente fundamental no ciclo hidrológico – o processo pelo qual a água é continuamente transferida do oceano para as nuvens, para os continentes e de volta para o oceano", descreve.
Apesar da importância, o estudo da Unesco mostra que a piora tem sido acelerada e cumulativa. O documento mostra ainda que, nos últimos anos, a taxa de aquecimento dobrou. "Enquanto as temperaturas da atmosfera flutuam, o oceano está está aquecendo de forma constante, como uma panela de água no forno", diz o relatório. Desde a década de 1960, o oceano perdeu 2% de seu oxigênio. Atualmente, há 500 zonas mortas ao longo das costas - quase não resta vida marinha.
Para tornar a situação ainda pior, entre 1,1 milhão a 4,9 milhões de toneladas de plástico se acumulam no mar. No Atlântico e no Índico, a principal origem do material produzido a partir do petróleo são redes e outros materiais de pesca descartados. No resto do mundo, o lixo vem dos utensílios e embalagens de uso único, principalmente as garrafas feita com PET.
Além do acúmulo de plástico, o impacto das emissões de combustíveis fósseis - entre 25% e 30% são absorvidas pelo oceano, com o CO2 acelerando o processo de acidificação do mar. O fenômeno cresceu 30% desde os tempos pré-industriais e deverá chegar a 170% em 2100, sinalizam os pesquisadores.
Em abril, cientistas da NOAA (sigla em inglês para Administração Nacional Oceânica e Atmosférica), informaram que o mundo enfrenta atualmente o quarto evento global de branqueamento de corais - o segundo dos últimos 10 anos. O evento é classificado como global quando o branqueamento significativo acontece nas três bacias oceânicas - Atlântico, Pacífico e Índico - em um período de 365 dias.
A causa é o estresse térmico, como foi monitorado remotamente pelo Coral Reef Watch (CRW), da NOAA. O levantamento, feito desde 1985, se baseia em dados da temperatura da superfície do mar, obtidos a partir de uma combinação de satélites da entidade e de parceiros. De fevereiro de 2023 a abril de 2024, o branqueamento significativo de corais foi registrado nos hemisférios Norte e Sul de cada grande bacia oceânica, segundo Derek Manzello, coordenador da NOAA CRW.
"À medida que os oceanos continuam a aquecer, o branqueamento dos corais está a se tornar mais frequente e grave", afirmou Manzello, em nota. "Quando estes eventos são suficientemente graves ou prolongados, podem causar a mortalidade dos corais, o que prejudica as pessoas que dependem dos recifes de coral para a sua subsistência."
Desde o início de 2023, o branqueamento em massa dos recifes de coral foi confirmado em todos os trópicos, incluindo na Flórida, nos EUA. nas Caraíbas; no Brasil; no Pacífico Tropical Oriental (incluindo México, El Salvador, Costa Rica, Panamá e Colômbia); na Grande Barreira de Coral da Austrália; em vastas áreas do Pacífico Sul (incluindo Fiji, Vanuatu, Tuvalu, Kiribati, as Samoas e a Polinésia Francesa); no Mar Vermelho (incluindo o Golfo de Aqaba); no Golfo Pérsico; e no Golfo de Aden.
As vegetações interdependentes, é claro, também sentem o impacto. Florestas marinhas, como os manguezais, absorvem até cinco vezes mais carbono do que as florestas terrestres. No entanto, desde a década de 1970, entre 20 e 35% dessa vegetação desapareceu. O estudo da Unesco alerta: “As espécies marinhas enfrentam hoje uma tripla ameaça: aumento da temperatura, acidificação e desoxigenação da água.”
Em maio passado, a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, sigla em inglês) divulgou que metade dos ecossistemas de manguezais do mundo está em risco de colapso devido à mudança climática, o desmatamento e a poluição. Ao todo, 50% dos ecossistemas dos manguezais analisados correm risco de colapso e 20% dos casos é grave.
Os manguezais são ameaçados pelo desmatamento, a poluição, a construção de barragens, o aumento do nível do mar e a maior frequência de tempestades devido às mudanças climáticas.
Em torno de 15% das costas do mundo são cobertas por manguezais, que revestem uma área de 150 mil quilômetros quadrados. Um terço dos ecossistemas analisados estão ameaçados pelo aumento do nível do mar.
Estimativas apresentadas pela IUCN mostram que 25% da área ocupada por manguezais ficará submersa em 50 anos se o ritmo atual continuar, afirma a IUCN. O noroeste do Oceano Atlântico, o norte do Oceano Índico, o Mar Vermelho, o Mar da do Sul da China e o Golfo de Aden são as áreas que podem ser mais afetadas.
Outro risco enfrentado pelos oceanos é a pesca ilegal - não declarada ou não regulamentada -, que ameaça os ecossistemas e comunidades em todo o mundo. Segundo a ONU, as atividades representam 26 milhões de toneladas de pescado por ano e movimentam algo como US$ 23 bilhões.
Como alerta a ONU, além de ameaçarem o equilíbrio dos ecossistemas aquáticos, as práticas ilegais de pesca comprometem o futuro da alimentação. Ao todo, 89% da produção total de animais marinhos (incluindo algas) é usada na alimentação humana.
O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 14, da ONU, busca “regular de forma eficaz a captura e acabar com a sobrepesca, a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada e as práticas de pesca destrutivas”.