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Dia Mundial da Água, uma agenda urgente no Brasil

Dia Mundial da Água: estudo da UNICEF com base nos dados do Censo Demográfico 2022 revela que 2,1 milhões de crianças e adolescentes não têm acesso adequado à água no Brasil

Os 15 Estados com maior percentual de crianças e adolescentes sem acesso adequado à água estão nas regiões Norte e Nordeste (Divulgação/Prefeitura de Fortaleza)

Os 15 Estados com maior percentual de crianças e adolescentes sem acesso adequado à água estão nas regiões Norte e Nordeste (Divulgação/Prefeitura de Fortaleza)

Unicef
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Colunista

Publicado em 22 de março de 2024 às 07h00.

Por Gregory Bulit*

O acesso de crianças e adolescentes à água potável é um direito humano fundamental, instituído em 2010 pelas Nações Unidas, e considerado a base para a garantia dos demais direitos. Sem água, não existe saúde. Sem água nas escolas, não existe direito à educação. Sem água em casa, não há dignidade e redução das desigualdades e da pobreza. Ou seja: sem acesso adequado à água potável, não há garantia de direitos humanos.

No entanto, uma análise do UNICEF com base nos dados do Censo Demográfico 2022, lançada neste Dia Mundial da Água, revela que 2,1 milhões de crianças e adolescentes não têm acesso adequado à água no Brasil. É um cenário de risco que afeta diretamente o bem-estar e o pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes. É urgente, nesse sentido, mudar essa realidade e colocar a infância e adolescência no centro das políticas e programas de água e saneamento, garantindo que tenham seus direitos assegurados.

A situação é ainda mais grave quando olhamos quem são as meninas e os meninos mais afetados pela falta de água potável. Essa vulnerabilidade atinge de forma mais intensa comunidades vulneráveis, tradicionais e rurais, e crianças e adolescentes negros e indígenas, ampliando o fosso de desigualdades existentes no País. O percentual de meninas e meninos negros sem acesso adequado à água potável no Brasil é o dobro do de brancos. Entre indígenas, 25% das crianças e adolescentes não possuem acesso adequado a água potável, percentual 11 vezes maior do que entre brancos.

Olhando para as regiões, o cenário é semelhante. Os 15 Estados com maior percentual de crianças e adolescentes sem acesso adequado à água estão nas regiões Norte e Nordeste, que também enfrentam os maiores desafios relacionados à pobreza, em suas múltiplas dimensões.

O cenário se reflete, também, nas escolas. De acordo com o Censo Escolar 2023, no Brasil, 1,2 milhão de estudantes estão matriculados em 7,5 mil escolas públicas que não têm acesso adequado à água potável. Entre eles, 224 mil meninos e meninas estão em 3 mil escolas em que o acesso à água é inexistente.

Ter acesso precário ou inexistente a água potável pode gerar uma série de problemas que prejudicam o bem-estar e o pleno desenvolvimento de meninas e meninos em idade escolar, levando ao risco de doenças, abandono ou atraso escolar.

Urgência do investimento público

Essa situação requer uma ação imediata, com estratégias específicas e alocação de recursos públicos, assim como a mobilização do setor privado no marco da responsabilidade social das empresas. É crucial adotar uma abordagem integral que priorize o acesso à água potável em comunidades vulneráveis, especialmente em áreas rurais, incluindo a perspectiva de povos indígenas e comunidades tradicionais. Isso envolve não apenas investimentos em infraestrutura, mas também a implementação de programas de fortalecimento de capacidades educacionais e de conscientização para promover práticas de higiene e garantir a sustentabilidade dos serviços.

Ao priorizar o acesso à água potável em comunidades vulneráveis, especialmente em serviços sociais essenciais como escolas e unidades de saúde, o País pode não só melhorar a qualidade de vida dessas comunidades, mas também promover a manutenção da qualidade de vida, a redução de desigualdades e da pobreza.

Para tanto, há que se garantir investimentos voltados para o alcance das metas até 2033, estabelecidas pela Lei 14.026/2020, relacionadas à universalização dos serviços, de forma que 99% da população tenha acesso a água potável e 90% ao tratamento e à coleta de esgoto.

É preciso, também, aprovar o Projeto de Lei 5.696/23, que tramita no Congresso Nacional, com vistas a garantir o acesso à água potável nas instituições de ensino. É preciso, ainda, que os municípios, como titulares dos serviços de saneamento básico, priorizem o acesso seguro às escolas e unidades de saúde no planejamento e ampliação dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário.

O Brasil precisa fortalecer e ampliar a oferta de serviços e benefícios voltados a água potável e saneamento. Isso inclui, entre outros pontos, a expansão de programas de serviços de abastecimento de água potável e coleta e tratamento de esgoto.
Além do desafio de garantir o acesso de água potável e esgotamento sanitário, é necessário considerar a perspectiva das mudanças climáticas, tendo em vista as especificidades dos territórios, de forma a também incentivar a elaboração de planos de preparação e resposta, estaduais e municipais, para lidar com os riscos de escassez de água e de contaminação após desastres hidrológicos, pois os eventos climáticos extremos no Brasil são cada vez mais intensos e frequentes. Fortalecer a resiliência climática dos serviços de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário permite assegurar a segurança hídrica para a população.

Iniciativas em prol do acesso adequado à água no Brasil

Para contribuir com essa agenda, o UNICEF vem trabalhando em parceria com o poder público, sociedade civil e o setor privado, com o objetivo de apoiar o fortalecimento de políticas públicas voltadas à promoção do acesso universal à água potável para todas as crianças e todos os adolescentes.

No Brasil, o UNICEF conta com uma área de Água, Saneamento e Higiene (WASH, na sigla em inglês), que atua com especial atenção para os povos indígenas e comunidades tradicionais, nas escolas e com vistas ao fortalecimento de capacidades de municípios localizados na Amazônia Legal e no Semiárido brasileiro.

As ações desenvolvidas pelo Programa de WASH têm em vista os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), especialmente o ODS 6 que visa garantir a disponibilidade e a gestão sustentável da água potável e do saneamento para todos, com especial atenção para as necessidades das mulheres e meninas e das pessoas em situação de vulnerabilidade.

Para a área de Água, Saneamento e Higiene, o UNICEF conta com o apoio de milhares de doadores individuais e de parceiros corporativos. São parceiros estratégicos Aegea; FRAM Capital, por meio de sua plataforma de projetos ESG Samauma; Fundação Salvador Arena; Grupo Profarma; RD-Saúde; Igreja de Jesus Cristos dos Santos dos Últimos Dias; Ministério Público do Trabalho (MPT); e Takeda. São parceiros: Grupo Tigre; Instituto Alok e WEG. Apoiador: SEMPRE LIVRE® & CAREFREE®.

A estratégia conta, também, com parceiros internacionais que nos apoiam em ações emergenciais e na crise migratória: Departamento de Proteção Civil e Ajuda Humanitária da União Europeia (Echo, na sigla em inglês), Escritório para População, Refugiados e Migração do Departamento de Estado dos Estados Unidos (PRM, na sigla em inglês) e Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (Aecid).

Sabemos que o Brasil está diante de um desafio imenso: garantir o acesso aos serviços adequados de água potável para milhões de crianças e adolescentes – mas, a aprovação e implementação de leis voltadas ao tema, o investimento público no setor, e a contribuição de organizações da sociedade civil e do setor privado, mostram que há caminhos para construir um novo cenário mais saudável e sustentável para todos.

* Gregory Bulit é coordenador de Emergências e Saneamento Básico do UNICEF no Brasil

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