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A agricultura regenerativa pode ser 20% mais produtiva usando 40% menos insumos e 60% menos água (Tom Werner/Getty Images)
Rodrigo Caetano
Publicado em 25 de novembro de 2020 às 18h19.
Última atualização em 25 de novembro de 2020 às 19h04.
O avanço das tecnologias de plantio sustentável anima os adeptos da alimentação orgânica. Com novas técnicas de uso do solo e manejo da vegetação, aliadas à utilização intensa de tecnologias, a máxima de que é impossível alimentar a humanidade sem o uso de agrotóxicos vem sendo questionada por empreendedores e inovadores.
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No décimo episódio do podcast ESG de A a Z, Felipe Villela, Mariana Vasconcelos e Guilherme Raucci, fundadores das startups ReNature e Agrosmart, explicam como a agricultura regenerativa pode ser uma solução para a barreira da escala na produção sem o uso de produtos químicos. Para eles, se livrar dos agrotóxicos é questão de tempo.
O termo “agricultura regenerativa” foi cunhado pelo americano Robert Rodale, que utilizou teorias de hierarquia ecológica para estudar os processos de regeneração nos sistemas agrícolas ao longo do tempo. Ela já é utilizada por empresas como Patagonia, Danone, Natura e General Mills. A técnica busca imitar os processos da natureza, ao contrário da agricultura tradicional, que depende de insumos externos para sua viabilidade. Dessa forma, é possível reduzir o consumo de água em 60%, de insumos em até 40%, aumentar a produtividade em até 20% e sequestrar entre 36 e 45 toneladas de carbono por hectare.
Segundo Mariana Vasconcelos, CEO da Agrosmart, o que impulsiona essa revolução é a capacidade de monitorar e coletar dados no campo. “Essa é a base da agricultura regenerativa”, afirma. Ao compreender os ciclos naturais dos ecossistemas, é possível aproveitar as proteções naturais da vegetação para garantir um plantio livre de pragas: diversos cultivos são organizados no mesmo local, de forma que um tipo de vegetação proteja o outro.
ReNature e Agrosmart firmaram uma parceria, recentemente, para dar escala a esse tipo de agricultura. Os primeiros projetos em conjunto terão como foco as cadeias de produção de café, cacau, algodão, palma, borracha natural, madeira, soja e pecuária. As duas empresas se complementam. A ReNature atua no “design” de plantações regenerativas, enquanto a Agrosmart é especializada na coleta e análise de dados no campo.
“A integração de tecnologias na escalabilidade de sistemas regenerativos permitirá trazer mais cases economicamente viáveis que motivará agricultores na transição para um sistema resiliente e que se adapte aos impactos das mudanças climáticas”, afirma Villela, fundador da ReNature.
A bióloga Rachel Louise Carson foi uma das primeiras a relacionar os pesticidas a desequilíbrios ambientais, nos anos 1970. Seu livro Silent Spring ("Primavera Silenciosa") mostra como o DDT, usado em larga escala no combate a mosquitos no período do pós-guerra, era responsável por reduzir a espessura das cascas dos ovos, provocando elevados índices de mortalidade entre as aves. A obra marcou o início do ativismo ecológico e segue influente até hoje.
Nos últimos 50 anos, a má fama dos agrotóxicos só cresceu. Em mercados desenvolvidos, a demanda por produtos orgânicos, sem produtos químicos, disparou. O problema é que o preço desses produtos continua alto e a disponibilidade, baixa, o que leva a indústria do agronegócio considerar injusta a vilanização dos defensivos.
No livro Agradeça aos agrotóxicos por estar vivo (Record, 2017), o jornalista Nicholas Vital argumenta que, não fossem os defensivos, a humanidade não teria sido capaz de produzir a quantidade necessária de comida para suportar o aumento populacional dos últimos 100 anos. Provavelmente, ele está certo. Porém, assim como no mercado de capitais, os ganhos passados não são garantia de retorno futuro.
A revolução dos orgânicos começou com a produção de produtos premium, voltados para jovens de classe média alta preocupados com a saúde. A agricultura regenerativa, por sua vez, foca na produção em escala a partir da compreensão de como funciona a natureza. Entender os ciclos naturais, por sinal, é fundamental para garantir o futuro da humanidade, não só em termos de alimentos.
A natureza é bela. E perfeita. O mundo funciona em ciclos de vida e morte. O que acaba serve de combustível para o que renasce, e assim acontece há 4 bilhões de anos. A humanidade é parte dessa equação. Os seres humanos apareceram há 50.000 anos, uma fração de segundo, em comparação à idade do planeta.
Apesar de sua recente presença na Terra, a humanidade tem grande influência sobre a natureza. Cientistas como Johan Rockström, da Universidade de Estocolmo, consideram que, nos últimos 50 anos, os humanos se tornaram sua própria era geológica, capaz de determinar se, no futuro, o planeta será habitável ou não.
Rockström foi o líder de um grupo de pesquisadores que publicou um trabalho revolucionário denominado Fronteiras Planetárias. O estudo, de 2009, apresenta nove critérios ambientais que tornam possível a vida humana. Esses critérios, ou fronteiras, funcionam em conjunto. Um desvio em qualquer um deles influencia nos demais.
A metodologia desenvolvida por Rockström quantifica, numa linguagem universal, a interferência da humanidade no funcionamento do planeta. Não é uma surpresa que os dados não são bons. Duas fronteiras já apresentam indicadores acima do limite. Outras três nem sequer puderam ser quantificadas. A conclusão a que todos chegaram é: precisamos salvar o planeta da humanidade.
O problema para os humanos, no entanto, está na perfeição da natureza. “O planeta não dá a mínima importância para o que está acontecendo”, afirmou o cientista, em entrevista exclusiva à EXAME. “A Terra vai continuar a existir independentemente do que a humanidade faça. Nós não.”
As últimas cinco décadas são parte de um ciclo. Se alguma coisa precisa acabar para servir de combustível para o novo, assim será, mesmo que essa coisa seja a humanidade. Mas há uma solução. Se os seres humanos se adaptarem aos ciclos da natureza, podem evitar o destino dos dinossauros. A agricultura regenerativa é parte desse processo.