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Daniel Brandão, da Vox Capital: "O dinheiro está aqui, vamos fazer esse dinheiro chegar até os agricultores e implementar soluções" (Egberto Nogueira/VEJA)
Repórter de ESG
Publicado em 13 de novembro de 2025 às 14h34.
Belém — Um novo fundo de investimento busca mudar a equação econômica da agricultura brasileira, tornando a recuperação de pastagens degradadas mais lucrativa do que o desmatamento. O CCAT (Catalytic Capital for the Agricultural Transition, ou Capital Catalítico para a Transição Agrícola, na tradução literal) foi lançado durante a COP30 com US$ 50,5 milhões já captados e a ambição de movimentar US$ 1 bilhão em investimentos nos próximos anos.
Gerido pela Vox Capital, gestora de investimentos de impacto no Brasil, o fundo recebeu aportes da Fundação Gordon e Betty Moore, da Iniciativa Internacional de Clima e Florestas da Noruega (NICFI), além da Margaret A. Cargill Philanthropies, Instituto Arapyaú e Porticus.
COP de Belém é a segunda maior de todas as conferências do climaO motivo que chama a atenção é a alta capacidade de restauração no país, ao mesmo tempo em que áreas são mantidas com pouca produtividade. O Brasil possui mais de 177 milhões de hectares de pastagens degradadas, sendo que 40% dessas áreas são adequadas para a produção de alimentos, de acordo com dados da Embrapa. Atualmente, essas terras operam com apenas um terço de seu potencial produtivo. A recuperação poderia atender à demanda global por carne bovina e soja — sem desmatar nenhum hectare adicional.
Práticas já comprovadas podem aumentar a produtividade da pecuária na Amazônia e no Cerrado em 3 a 5 vezes e elevar o rendimento dos agricultores em até quatro vezes por hectare por ano. No entanto, a maioria dos produtores enfrenta grandes barreiras para acessar financiamento de longo prazo, já que a recuperação de terras pode levar de sete a dez anos para gerar retorno financeiro, conforme explica o diretor de soluções baseadas na natureza da Vox Capital, Daniel Brandão, que conversou com a EXAME durante a COP30. "O fundo quer financiar a transição da agricultura para práticas sustentáveis no Brasil", explica.
"O que falta para escalar esse tipo de agricultura, que tem uma demanda específica, é o financiamento, especialmente com condições que atendam às necessidades do produtor rural. E o mercado não estava oferecendo isso", afirma Brandão.
O diferencial do CCAT está nas condições de financiamento. "São condições concessionárias. Ou seja, é um dinheiro que tem uma certa paciência, um investimento de longo prazo", conta o diretor da Vox Capital. O fundo tem prazo de 12 anos e prevê fazer entre 15 e 20 operações, com períodos de pagamento que podem chegar entre seis e oito anos.
"Nós vamos oferecer capital privado a preços abaixo do mercado. Então, o nosso foco aqui não é retorno financeiro ou ganhar dinheiro com fundo. Nosso foco é levar o dinheiro para essa agenda e colocar com esse investimento os nossos requisitos socioambientais, como o desmatamento zero", destaca Brandão.
O fundo não investirá diretamente nos produtores, mas em estruturas financeiras do mercado. "Nós vamos investir na cota chamada subordinada dessas estruturas. São aquelas cotas que são as que sofrem os primeiros eventuais problemas. Então nós vamos assumir as primeiras perdas desse fundo", explica o gestor.
Ao assumir os riscos e reduzir os potenciais impactos para essa estrutura, o CCAT espera atrair capital comercial para as mesmas estruturas financeiras. A meta é que cada US$ 1 de capital catalítico mobilize US$ 4 em capital comercial. "Com US$ 200 milhões, consigo atrair outros US$ 800 milhões do mercado privado para depositar US$ 1 bilhão no mercado", projeta Brandão.
O fundo atuará em três verticais produtivas: soja sobre áreas degradadas no Cerrado, intensificação de pecuária com integração lavoura-pecuária-floresta, e sistemas agroflorestais, sempre nos biomas da Amazônia e do Cerrado.
A meta inicial é captar US$ 200 milhões em capital catalítico e mobilizar outros US$ 800 milhões em investimentos comerciais até 2028. No longo prazo, o objetivo é ampliar o capital catalítico no setor agrícola brasileiro para US$ 2 bilhões até 2030, destravando um total de US$ 10 bilhões em investimentos.
"Com esse capital de 200 milhões de dólares, a gente quer trabalhar com mais de 500 mil hectares sob gestão sustentável, apoiando a recuperação ou a proteção dessas áreas", revela Brandão. O fundo espera evitar a emissão de 240 milhões de toneladas de CO₂ e beneficiar diretamente mais de mil agricultores até 2030.
Com base na plataforma IFACC (Inovação Financeira para Amazônia, Cerrado e Chaco), — lançada pela The Nature Conservancy, Tropical Forest Alliance e Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente durante a COP26 —, o CCAT já conta com um pipeline de mais de 50 projetos.
Para Brandão, o fundo representa uma mudança de paradigma nas discussões climáticas. "O dinheiro está aqui, vamos fazer esse dinheiro chegar até os agricultores e implementar soluções. Estou vendo que tem atores como nós chegando na COP com possibilidades concretas de realizar a implementação e fugir da retórica de um desejo futuro, de algo a ser feito. É fazer acontecer agora", celebra o diretor da Vox Capital.
Dan Ioschpe, campeão de alto nível da COP30, afirmou que o fundo colabora com o objetivo da presidência da COP de acelerar o desenvolvimento socioeconômico aliado à ação climática. “O CCAT complementa iniciativas como o Tropical Forest Forever Facility (TFFF) para proteger as florestas enquanto acelera a agricultura sustentável", explica. Para Ioschpe, maiores volumes de capital podem ajudar a recuperar terras degradadas e proteger a fronteira florestal, reduzindo emissões e desmatamento com aumento de renda para os agricultores e melhorias para a segurança alimentar.
Sabine Miltner, diretora de programa da Conservation and Markets Initiative, resume o espírito da iniciativa: "O CCAT permite que os agricultores produzam mais, ganhem mais e se protejam mais. Com o CCAT, expandir a produção em terras degradadas torna-se a decisão financeira mais inteligente”, conta.
A CEO do Instituto Arapyaú, Renata Piazzon, explica que o sucesso da iniciativa se relaciona com o potencial brasileiro. “O Brasil possui capacidades extraordinárias para avançar nas agendas de restauração, bioeconomia e sistemas agroalimentares. Iniciativas como esta podem servir como um elo para alavancar os resultados necessários nessa direção”, disse.