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COP30 coloca afrodescendentes no rascunho, mas evita tratar racismo ambiental

No Dia da Consciência Negra, EXAME ouve especialistas na COP30 sobre avanços na inclusão da temática nas negociações e os desafios que ainda atrasam a agenda da equidade racial no clima

Fachada da COP30 em Belém  (Leandro Fonseca /Exame)

Fachada da COP30 em Belém (Leandro Fonseca /Exame)

Letícia Ozório
Letícia Ozório

Repórter de ESG

Publicado em 20 de novembro de 2025 às 08h00.

Última atualização em 20 de novembro de 2025 às 09h02.

Belém, Pará — “A emergência climática é também uma crise de desigualdades”. A afirmação, que faz parte do discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na abertura da Conferência do Clima de Belém, levantou um debate que envolve 56% na população brasileira. As pessoas negras são hoje as principais afetadas pela crise climática, mas também as que mais sofrem com seus efeitos na moradia, saúde, alimentação, economia, entre outras áreas.

O termo que explica essa desigualdade é o racismo ambiental, ou seja, quando a má distribuição de bens ambientais recai desproporcionalmente sobre populações já marginalizadas, como pessoas pretas, pardas, indígenas e quilombolas. O tema entrou em uma Declaração da presidência da COP, que recomenda que nações promovam a equidade étnico-racial nas dimensões climáticas. Até o dia da publicação, apenas 19 dos 196 países participantes, incluindo o Brasil, endossavam a publicação.

“Somos as primeiras vítimas, não só dos eventos climáticos extremos, mas de qualquer efeito das desigualdades que são agravadas por causa disso”, conta Kamila Camilo, empreendedora social e fundadora do Instituto Oyá, consultoria em ESG.

Os dados confirmam. Um estudo da Agência de Proteção Ambiental aponta que negros sofrem efeitos na saúde até 54% maiores do que a população geral. O motivo? A maior exposição a poluentes particulados, como a fuligem. As consequências chegam até mesmo na saúde das crianças: as negras apresentam o dobro da chance de desenvolver asma na comparação com crianças brancas. O risco de morte por complicações dessa doença é 10 vezes maior, segundo dados da Força-Tarefa pelo Ar Limpo.

No cenário local, um levantamento da Agência Pública aponta que os dez distritos de São Paulo com mais casos de alagamentos e deslizamentos nos últimos dez anos também são mais habitados por pessoas negras. Os bairros Jardim Helena, Vila Jacuí e São Miguel Paulista tiveram as maiores ocorrências entre 2014 e 2024 (cerca de 2 mil casos), sendo também regiões com população negra acima da média da cidade, de 37%.

Racismo ambiental

Apesar das dificuldades, a presença de mais pessoas negras nas mesas de negociação nas Conferências do Clima, segundo Camilo, segue abaixo do nível aceitável. “Grupos negros tentam inserir isso na agenda desde que a COP existe. Nos últimos quatro anos, a discussão esquenta um pouco, mas não ganha o destaque que acredito ser necessário”, diz.

Um avanço pode ser feito durante a COP30: o rascunho do documento principal da negociação menciona pela primeira vez as populações afrodescendentes, passo que pode ajudar a incluir as discussões focadas em povos tradicionais de raízes negras (como grupos quilombolas) ao redor do mundo na questão climática.

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Mariana Belmont, assessora de clima e racismo ambiental do Geledés – Instituto da Mulher Negra, afirmou à EXAME que se trata de um passo fundamental para o início dessa agenda nas negociações climáticas, levando as necessidades e urgências de negros para as discussões internacionais.

“As populações negras, indígenas e periféricas são historicamente as mais expostas a riscos ambientais, como poluição, falta de saneamento, desastres climáticos e ausência de infraestrutura pública — consequências diretas de desigualdades estruturais e raciais”, explica.

Presença de negros no rascunho da COP30

Para Belmont, discutir a emergência climática e seus efeitos para a população racializada na primeira COP realizada no Brasil seria reconhecer que os impactos das mudanças no meio ambiente não são distribuídos de forma igual entre as populações. “Esperamos o novo texto para ver como está e estamos lutando e nos posicionando para que a gente saia daqui com esse avanço histórico no âmbito da UNFCCC”, disse.

Talvez os países ainda não estejam prontos para tal “comprometimento”, como explica Camilo. “Quando chega o texto com as demandas das populações negras, o que os diplomatas de algumas nações falam é que não faz sentido descrever uma população específica se posso usar uma linguagem que abarca mais pessoas”, diz. A estratégia, afirma, é de ignorar as demais vivências. “A partir do momento que você reconhece um problema, você precisa repará-lo.”

Ela afirma que o movimento negro internacional segue empurrando a agenda e tentando manter o assunto vivo nas negociações, mas que é grande desafio para que as nações concordem com novos compromissos. “A partir do momento que citamos um tema, precisamos medir, acompanhar, ter indicadores, provar que estamos olhando para aquilo de verdade. E aí ninguém quer aceitar poque medir aumenta os custos”, explica Camilo.

Se mais de 50% da população está vulnerável aos eventos climáticos extremos, diz a fundadora, não discutir o racismo ambiental é “condenar pessoas negras a morte”. “Quando vemos um desastre climático, as pessoas mais ricas logo recebem seus seguros e reconstroem suas vidas. Famílias negras muitas vezes nem seguro de vida têm, imagine de carro, carro, plano de saúde”, conta.

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