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COP27: reflexões de uma jovem ambientalista antirracista

Nessa conferência, percebi que temas que para mim são óbvios ainda estão na bolha. Contudo, não podemos aceitar isso! Se não tiver gente preta e de quebrada pautando o tema, como vamos territorializar a agenda climática?, escreve Amanda Costa em artigo

Amanda Costa, ativista climática, fundadora do Perifa Sustentável e jovem embaixadora da ONU na COP27 (Leandro Fonseca/Exame)

Amanda Costa, ativista climática, fundadora do Perifa Sustentável e jovem embaixadora da ONU na COP27 (Leandro Fonseca/Exame)

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Da Redação

Publicado em 20 de novembro de 2022 às 10h01.

Última atualização em 22 de novembro de 2022 às 15h35.

De Sharm el-Sheikh, no Egito

Termina neste domingo, 20 de novembro, a 27ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas da ONU (COP27), um evento que reuniu diversos países em Sharm El-Sheikh, no Egito, com o objetivo de aprofundar as discussões sobre justiça ambiental, perdas e danos e financiamento climático.

Eu sou ativista, atuo na Brasilândia, área periférica de São Paulo capital, e já participei de quatro COPs. Cada uma me marcou de um jeito diferente. Na COP23, em Bonn, na Alemanha, eu estava na delegação da YMCA com jovens de vários países e lembro de me sentir completamente perdida! Eram siglas atrás de siglas que eu não fazia ideia do significado: SUBSTA, SBI, ACE, NDC…

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Mas o bom de ir em grupo é que a gente se acolhe. Fui apadrinhada pelas pessoas mais experientes e recebi explicações exclusivas sobre o funcionamento da UNFCCC, negociações, constituintes, pavilhões e temas do Acordo de Paris, que havia sido assinado em 2015. Foi muito bom reencontrar algumas dessas pessoas no Egito e ver o quanto crescemos de lá para cá.

COP27

(Amanda Costa/Reprodução)

Já na minha segunda COP, em Katowice, na Polônia, fui com a galera do Engajamundo. Dividimos o time em lobby, comunicação e ativismo e eu estava encarregada de mapear os tomadores de decisão, acompanhar suas respectivas agendas e pressioná-los sobre os artigos do ACE - Action For Climate Empowerment, especificamente a parte de educação climática.

Nossa delegação era composta por 11 pessoas e foi a primeira vez que o Engajamundo levou uma indígena para a conferência, a Hamagaí Pataxó Hã-Hã-Hãe. Manguinha nos ensinou tanta coisa! Lembro de escutá-la dizer: “Nós não somos o futuro, somos o AGORA. Queremos contar a nossa verdade, falar das coisas que são importantes para nós e cuidar do planeta, que é a nossa casa.”

(Amanda Costa/Reprodução)

Já na minha terceira COP, em Glasgow, Reino Unido, no ano passado, montamos uma delegação do Instituto Perifa Sustentável, a ONG que fundei com o objetivo de mobilizar a juventude preta e periférica para criar uma nova agenda de desenvolvimento sustentável para o Brasil, trazendo a perspectiva de raça e clima. Levamos uma delegação de quatro mulheres negras para a COP 26: Vitória Pinheiro, de Manaus; Ellen Monielle, de Natal; e Mahryan Sampaio e eu, de São Paulo. Foi uma experiência intensa!

Hoje o Perifa Sustentável trabalha com três pilares: educomunicação, ações comunitárias e incidência climática, com foco em racismo ambiental nos territórios periféricos. Somos parte da Coalizão Negra por Direitos e em Glasgow participamos intensivamente das mobilizações e debates que envolviam juventude, raça e território.

(Amanda Costa/Reprodução)

Para participar da conferência esse ano, recebi apoio de diversas instituições, como Greenpeace Brasil, Viração Educomunicação (Agência Jovem de Notícias), Alma Preta Jornalismo e o Instituto Perifa Sustentável.

Na COP em Sharm El-Sheikh, algo ficou bem escuro: não dá mais para falar de justiça ambiental sem falar de justiça racial! Não dá mais para sustentar um debate branco, elitizado, rico, cheio de jargões técnicos e palavras em inglês que não conectam com a base da população, ou seja, a galera que já está sofrendo os piores impactos da crise climática.

Fui para o evento com a missão de produzir conteúdo sobre justiça climática e incidir politicamente no tema de racismo ambiental.

Nessa conferência, percebi que temas que para mim são óbvios ainda estão na bolha. Contudo, não podemos aceitar isso! Se não tiver gente preta e de quebrada pautando o tema, como vamos territorializar a agenda climática?

Chega de ter gente da bolha, falando para a bolha e sendo aplaudido pela própria bolha.

Mas avanços estão acontecendo e diferente das COPs anteriores, vi uma diversidade maior em relação aos atores que participaram da conferência, como indígenas, quilombolas, mulheres, jovens, pretos periféricos, nortistas e nordestinos.

É só eu olhar para a minha própria trajetória. Quando que eu, uma mulher preta da Brasilândia, poderia imaginar viajar até o Egito para participar de uma conferência da ONU?

(Amanda Costa/Reprodução)

Daí penso nas palavras de Emicida: “Eu sou o sonho dos meus pais, que eram o sonho dos avós, que eram o sonho dos meus ancestrais.”

Esse é o primeiro passo, mas não pode ser o único. É necessário fazer questionamentos e levantar provocações: “Quais são os espaços que estamos ocupando?” Será que são espaços de transformação reais ou apenas lugares figurativos para receber palminhas e alimentar o ego?

Essa COP me chacoalhou e me fez refletir sobre bastante coisa.

Participei de alguns eventos como speaker, a convite da Secretaria Municipal de Relações Internacionais de São Paulo, Pacto Global da ONU e Instituto de Estudos da Religião (ISER). A diversidade que eu citei acima não está em todos os espaços, mas se restringe a alguns grupos específicos da sociedade civil.

Então eu pergunto: cadê a galera indígena e quilombola ocupando cargos de liderança no governo? Cadê a população preta representando as grandes empresas? Quem são os atores que estamos formando para participar das negociações internacionais e lutar pelos direitos dos mais vulnerabilizados?

Se não mexermos na estrutura, não vamos ver uma transformação real, mas sim a reprodução da lógica patriarcal heteronormativa de supremacia branca, onde a figura do homem branco hétero cis gênero rico e muito experiente está sempre no topo, e atores como eu, mulheres pretas e periféricas ocuparão sempre a base da pirâmide social.

Já falei lá em cima, mas ouso repetir:
NÃO EXISTE JUSTIÇA AMBIENTAL SEM JUSTIÇA RACIAL.

É extremamente necessário falar de justiça climática e racismo ambiental, desenvolver projetos, campanhas e ações que realmente possibilitem uma transformação territorial e que vão além de um discurso pomposo.

Tá na hora de criar acessos para que aqueles que são os mais impactados pela crise climática possam pensar em soluções decolonizadas para os desafios que atravessam seus corpos e territórios.

Agora me conta, querido leitor:
Você já parou para pensar no seu papel na causa climática? Espero que você não seja apenas a pessoa que assiste ao rolê acontecer, mas que esteja realmente disposto a ser um aliado da luta ambientalista antirracista.

Um ótimo primeiro passo é espalhar a mensagem da emergência climática. Você pode compartilhar esse artigo com pessoas que são importantes para você e trazer questionamentos para os lugares que você transita, como seu trabalho, faculdade, roda de amigos, almoço de família ou mesmo numa mesa de bar com aquele gato/a climático/a <3

E aí, posso contar com seu apoio?

(Amanda Costa/Arquivo Pessoal/Reprodução)

*Amanda Costa é ativista climática, jovem conselheira da ONU, delegada do Brasil no G20 Youth Summit — Italy e fundou o Instituto Perifa Sustentável. Formada em Relações Internacionais, Amanda foi reconhecida como #Under30 na revista Forbes, LinkedIn Top Voices e Creator, Global Shaper (Fórum Econômico Mundial), TEDx Speaker e hoje atua como apresentadora do #TemClimaParaIsso? um programa sobre crise climática.

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