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Com a COP30 em vista, Belém sedia evento de venture capital e se prepara para receber investimentos

No palco da conferência do clima da ONU, autoridades, investidores e empreendedores se reúnem para falar de bioeconomia, e governador espera US$ 30 bilhões em exportações por ano

O governador Helder Barbalho: “Temos de preservar produzindo, e produzir preservando” (Bruno Cecim / Ag. Pará/Divulgação)

O governador Helder Barbalho: “Temos de preservar produzindo, e produzir preservando” (Bruno Cecim / Ag. Pará/Divulgação)

Rodrigo Caetano
Rodrigo Caetano

Editor ESG

Publicado em 2 de agosto de 2024 às 15h50.

Última atualização em 2 de agosto de 2024 às 16h40.

Bum! A manga atingiu a capota do táxi em cheio, e o barulho fez o motorista se abaixar. “Nessa época, elas caem”, lamentou Luís Adriano, o taxista. Quem trafega pela Avenida Nossa Senhora de Nazaré, em Belém do Pará, sabe do risco. As copas das mangueiras, dispostas de maneira equidistante pelas calçadas largas, se encontram no alto e formam um túnel verde ao longo da via. É bonito e a sombra alivia o calor, ao custo de alguns amassados nos carros ou de alguém levar uma mangada na cabeça -- acontecimento não presenciado pela reportagem.

A avenida, explica Adriano, tem outros atrativos. Ela começa na Praça da República, onde está o Theatro da Paz, casa de espetáculos erguida em 1878, no auge do Ciclo da Borracha. Mais à frente estão as sedes sociais dos principais times de futebol da cidade, o Clube do Remo e o Paysandu (que Adriano esqueceu de indicar, talvez um indício de sua preferência futebolística); o Museu Emílio Goeldi, onde o visitante encontra uma pequena reserva da Floresta Amazônica e um zoológico; e, é claro, a Basílica de Nazaré.

Projetada pelo arquiteto italiano Gino Coppedè e inspirada na Basílica de São Paulo Extramuros, em Roma, a igreja de estilo neoclássico, adornada com colunas coríntias e belos vitrais, é o ponto culminante do Círio de Nazaré, uma das maiores procissões religiosas do mundo. A romaria remete a 1700, quando, reza a tradição, o caboclo Plácido encontrou uma imagem de Nossa Senhora de Nazaré e a levou para casa, apenas para vê-la, no dia seguinte, de volta ao seu lugar de origem, às margens do Igarapé Murutucu. Reconhecendo o milagre, Plácido construiu ali uma capela, posteriormente transformada na atual basílica, no início do século 20.

Pela Avenida Nossa Senhora de Nazaré também se vai do Mercado Ver-o-Peso, a atração mais conhecida da capital paraense depois do Círio, até o Hangar Convenções e Feiras da Amazônia, um lugar sem muitos atrativos, mas que se transformará no epicentro da diplomacia climática mundial quando suas estruturas abrigarem o palco principal da COP30, a conferência do clima da ONU, marcada para dezembro de 2025. Belém, entre obras e crises políticas, já começa a se preparar para o grande evento e toda população sabe o que está em jogo. “Tem muita coisa acontecendo em Belém”, atestou Adriano.

Bioeconomia e investimentos

O cidadão belenense teve, nesta quinta-feira, 1º, um vislumbre do que acontecerá daqui a pouco mais de um ano. Autoridades, investidores, empresários, executivos e a sociedade civil estiveram reunidos no Hangar para o Bioeconomy Amazon Summit, conferência focada em soluções financeiras para escalar a bioeconomia promovida pela gestora de venture capital KPTL e pelo Pacto Global da ONU no Brasil. Cerca de 800 pessoas participaram do evento.

De início, o governador do Pará, Helder Barbalho, trouxe para o debate o maior dilema da descarbonização: a conciliação com o passado. “Fizemos uma escolha pelo extrativismo, mas isso não se mostrou sustentável”, disse Barbalho. “Hoje, fazemos a escolha pelo caminho certo”. Esse caminho, na visão do governador, é o da bioeconomia. “Temos de preservar produzindo, e produzir preservando”, define.

O Pará é, até hoje, campeão nacional de desmatamento da Amazônia, mas Barbalho busca mudar essa realidade com incentivos a segmentos econômicos mais sofisticados e alinhados com a Agenda 2030, conjunto de objetivos estabelecidos pela ONU para o desenvolvimento sustentável do planeta. O governador garante ter sido dele a ideia de levar a COP para Belém, repassada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a COP27, realizada em 2022, no Egito. Lula, na época, ainda se encontrava na condição de presidente eleito, mas foi recebido no balneário de Sharm el-Sheikh com pompas de líder político da transição para uma economia de baixo carbono. “O Brasil voltou”, repetia o presidente ao lado de sua ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

A agenda climática, um calcanhar de Aquiles do governo de Jair Bolsonaro, quando o desmatamento amazônico aumentou exponencialmente, era um trunfo diplomático dos petistas, que se gabavam de terem conquistado o menor índice histórico de desflorestamento na primeira gestão de Lula. Barbalho também tinha um trunfo para reivindicar uma posição de liderança nessa agenda, apesar dos péssimos índices de preservação paraense. Um ano antes da eleição, o governo estadual instituiu uma estratégia para o desenvolvimento da bioeconomia.

Mauro O’de Almeida, secretário estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade, explica que o plano surgiu em 2021 e está ancorado em três eixos: o desenvolvimento de cadeias produtivas de alto valor, a valorização do conhecimento tradicional e o incentivo à pesquisa científica. Entre os equipamentos previstos há um parque de bioeconomia e um centro de inovação, que será instalado no polo de tecnologia Porto do Futuro II. Almeida destaca a importância de se ter uma política pública de incentivo ao setor. “No direito, dizemos que primeiro vem o fato, depois a lei. É importante ter o setor produtivo comprometido com a agenda, e a presença da Federação das Indústrias do Pará neste evento é um sinal disso”, afirmou o secretário, que antes de assumir o posto atuava como advogado da União.

Barbalho acena para os empresários com números. Até 2040, ele espera receber, em seu estado, 120 bilhões de dólares em investimentos na área de bioeconomia, além de exportar, por ano, 30 bilhões de dólares em produtos do setor.

Milhares de startups

Em se tratando de venture capital, o CEO da KPTL, Renato Ramalho, acredita que a forte presença de startups ambientais no Bioeconomy Amazon Summit é um indicativo da pujança desse mercado e das oportunidades para os investidores. Estiveram no evento mais de uma centena de empreendimentos, dos mais variados. Agora, diz ele, é o momento de dar escala aos negócios, o que se faz com capital de risco.

Para isso, o investidor deve ficar atento às oportunidades, e desenvolver um ferramental de análises que inclua as questões ambientais e sociais associadas às atividades produtivas. “O número de empresas aqui surpreendeu, mas há potencial não apenas para centenas de startups na Amazônia, e sim para milhares”, disse Ramalho.

Mas, enquanto no futuro palco da COP as discussões versavam sobre os bilhões de investimentos em vista, fora do Hangar a população convive com uma crise na coleta de lixo. Por problemas financeiros, a prefeitura de Belém reduziu pela metade as equipes, e o lixo se acumula nas ruas. Um novo contrato de parceria público-privada foi estabelecido com o consórcio Natureza Viva. Até que o novo prestador consiga restabelecer o serviço por completo, a impressão que se tem é de que a cidade tem problemas de zeladoria e gestão, algo que nem o governo municipal, nem o estadual, querem ver no cartão postal da bioeconomia paraense.

Para o taxista Luís Adriano, Belém tem tudo para fazer bonito na COP30, mas é preciso que as lideranças assumam a responsabilidade de colocar a casa em ordem para os visitantes estrangeiros, e que os bilhões de investimentos previstos tragam mais qualidade para os povos da floresta e da cidade.

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