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A energia solar é a 2ª maior fonte do Brasil e representa cerca de 22% da matriz elétrica -- ultrapassando a eólica
Repórter de ESG
Publicado em 26 de maio de 2025 às 15h43.
Última atualização em 27 de maio de 2025 às 10h04.
O Brasil está perdendo uma 'oportunidade de ouro' no setor de energia solar pela dependência chinesa em tecnologia. Enquanto se consolida como potência em energias renováveis, continua importando da China boa parte dos painéis fotovoltaicos e gerando um impacto ambiental maior, além de perder bilhões em valor agregado.
É o que aponta um estudo inédito do Instituto E+ Transição Energética: as importações brasileiras de silício, componente essencial dos painéis solares - resultaram na emissão de 4 milhões de toneladas de CO₂ em 2024 -- igual às emissões anuais de quase 880 mil carros e o equivalente a 0,4% do total nacional.
A conta ambiental é pesada porque a China, que domina a produção mundial de silício, tem uma matriz elétrica 17 vezes mais poluente que a brasileira.
Por outro lado, o Brasil tem tudo para ser protagonista na cadeia do silício solar: reservas abundantes de quartzo (matéria-prima), já produz silício metálico e tem a matriz elétrica mais limpa do mundo para processos industriais intensivos energeticamente. Mesmo assim, exporta silício bruto (de baixo valor) e importa painéis prontos (de alto valor).
Edlayan Passos, especialista em Energia do Instituto E+, explicou à EXAME que seria possível reduzir a dependência chinesa internalizando parte da cadeia de valor. A organização defende uma abordagem chamada “micro-targeting industrial”, desenvolvida em colaboração com a Universidade Johns Hopkins.
A estratégia identifica o elo da cadeia mais promissor para ser nacionalizado, com base em vantagens comparativas locais. Isso inclui analisar quais itens são intensamente comercializados no mercado internacional, com forte competição e sensíveis a custos de energia e logística.
"O Brasil pode incorporar cláusulas de transferência tecnológica em acordos comerciais e de investimento, garantindo que a instalação de fábricas traga não apenas capital, mas também capacitação técnica e controle sobre tecnologias-chave", destacou Edlayan.
Atualmente, o setor solar brasileiro já representa mais de 20% da matriz elétrica nacional e a tendência é expandir. No entanto, o crescimento alimenta uma dependência externa que poderia ser facilmente revertida, segundo o instituto.
As tarifas impostas por Trump à China estão criando um efeito colateral inesperado no Brasil e podem dar um novo futuro para a energia verde. Com os EUA fechando suas portas para painéis solares chineses, o excesso de produção asiática precisa encontrar novos destinos -- e o mercado brasileiro surge como oportunidade.
"O movimento pode levar a uma inundação de excedentes chineses nos mercados latino-americanos, incluindo o nosso, dificultando ainda mais a aplicação de políticas industriais locais", disse Edlayan.
O fenômeno, conhecido como "overcapacity", transforma o país em um mercado "receptivo e vulnerável", complementou o especialista.
Paradoxalmente, a mesma guerra comercial que ameaça sufocar a indústria solar brasileira com produtos chineses baratos também abre uma janela estratégica.
Ao cortar o acesso aos fornecedores chineses de insumos como o polisilício, Trump cria espaço para novos players globalmente.
"O Brasil, com uma matriz elétrica limpa, estabilidade institucional e localização geográfica vantajosa, pode se posicionar como uma alternativa mais próxima, sustentável e geoeconomicamente amigável", ressaltou Edlayan.
O estudo também mostra que o principal obstáculo sempre foi o custo: o silício brasileiro para painéis solares custaria inicialmente cerca de US$ 15 por quilo, contra US$ 6 do produto chinês mais competitivo.
Mas as regras do jogo estão mudando. Com o mercado de carbono na Europa, o CO2 está sendo comercializado em torno de US$ 90 por tonelada e a a vantagem chinesa cai. Se o preço subir para US$ 120 por tonelada, cenário considerado provável por especialistas, o silício brasileiro passaria a ser mais competitivo que o chinês no mercado europeu.
Uma das tendências globais é o "powershoring", atração de investimentos industriais baseada na disponibilidade de energia renovável barata e limpa -- e o Brasil tem todas as condições para liderar.
A demanda nacional por silício solar está estimada em 34,5 mil toneladas anuais na próxima década e o mercado é suficiente para sustentar uma indústria local competitiva, que ainda poderia exportar para outros países com uma pegada de carbono menor.
Os benefícios seriam múltiplos: redução drástica das emissões associadas à energia solar brasileira, melhoria da balança comercial, geração de empregos industriais qualificados e fortalecimento da cadeia produtiva nacional.
Segundo o instituto, há uma oportunidade aberta: o Brasil tem vantagens competitivas naturais, mas precisará de políticas públicas coordenadas para transformá-las em realidade. No entanto, outros países com matrizes energéticas limpas também começam a se movimentar.