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Integração lavoura-pecuária-floresta: o setor agrícola do Brasil tem dado exemplos de práticas que demonstram ser possível aliar produção com preservação ambiental (Divulgação/Divulgação)
Leo Branco
Publicado em 17 de agosto de 2020 às 12h42.
Última atualização em 17 de agosto de 2020 às 13h28.
As crises nos dão oportunidades únicas de agir. Ao longo dos últimos meses temos visto a dimensão ambiental ascender gradativamente às pautas política e econômica. Diante da evidente incapacidade do Executivo frente à destruição ambiental, o Congresso Nacional tem a chance de ser o protagonista que afirmará a sustentabilidade e a defesa do meio ambiente como condições fundamentais para a retomada do desenvolvimento socioeconômico.
Movimentações recentes de executivos de grandes empresas, de ex-presidentes do Banco Central e de ex-ministros da Fazenda, dos três principais bancos que atuam no país e, ainda, a pressão de investidores externos carregam uma mensagem clara: meio ambiente importa para as pessoas, para a economia e para os negócios. Afinal, a economia de baixo carbono pode gerar imensos benefícios socioambientais e pelo menos 26 trilhões de dólares em benefícios econômicos até 2030, de acordo com relatório da iniciativa The New Climate Economy. A mobilização se soma ao green deal europeu, novo contrato social em torno de uma economia verde assentada no combate às desigualdades. É um caminho sem volta.
E agora é a vez do parlamento brasileiro fazer as escolhas que impactarão as próximas décadas. Deputados federais e senadores têm hoje a chance de auxiliar a construção de um futuro melhor, a começar por uma reforma tributária que vá além da simplificação.
Uma reforma tributária conectada aos novos tempos deve estar centrada em dois pilares: o do combate à desigualdade, escancarada principalmente na regressividade do sistema atual que tributa de maneira mais acentuada os mais pobres e encontra um teto baixo quando se trata de arrecadar dos mais ricos, e o pilar da promoção de um novo modelo de desenvolvimento, em que o crescimento econômico não seja um fim em si mesmo, mas que signifique uma mudança sobre como crescer e que implique a distribuição mais justa dos ganhos, orientado, por exemplo, pela produção sustentável.
Esses dois pilares não esgotam os movimentos que precisamos fazer — Brasil e seus pares na América Latina — em direção ao futuro que queremos. O urgente combate ao desmatamento e à grilagem é a condição número 1 para que coloquemos fim a uma economia baseada na destruição da natureza.
O setor agrícola tem dado exemplos de práticas que demonstram ser possível aliar produção com preservação ambiental. Um exemplo é o Sistema Campo Limpo, programa brasileiro de logística reversa de embalagens vazias de defensivos agrícolas, que garante que 94% de todas as embalagens plásticas produzidas pelo setor sejam encaminhadas para reciclagem ou incineração. Outro exemplo é o Plano ABC, ou Agricultura de Baixo Carbono, que propõe levar ao agricultor tecnologias de remoção e incorporação do carbono atmosférico por meio da adoção de sistemas sustentáveis de produção, como a recuperação de Pastagens Degradadas; a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta e Sistemas Agroflorestais; o Sistema Plantio Direto; na Fixação Biológica do Nitrogênio; as Florestas Plantadas; e o Tratamento de Dejetos Animais.
Junto a isso, é preciso mudar a maneira como nos inserimos no mercado global. Devemos migrar do modelo atual, quase exclusivamente ancorado na exportação de matérias-primas agrícolas e minerais, para um modelo baseado no que existe de mais atual e promissor: o mercado do carbono. Nesse contexto, é primordial a criação de um mecanismo de precificação e negociação de emissões de carbono no âmbito do Partnership for Market Readness (PMR) — programa das Nações Unidas conduzido, no Brasil, pelo Ministério da Economia.
Ainda que não estejam concluídas as diretrizes técnicas para a criação de um mercado de emissões no Brasil, há iniciativas interessantes. É o caso do investimento de 5 milhões de euros da empresa alemã Bayer em um projeto que pretende conectar 500 agricultores brasileiros (e uma área experimental de 60.000 hectares) a esse mercado.
Foi esse mesmo modelo, baseado em uma economia de baixo carbono, que estimulou o Brasil a criar a Política Nacional de Biocombustíveis, por meio da qual será possível aumentar a participação do etanol, do biodiesel, da bioquerosene e do biogás na matriz energética brasileira.
É importante também olharmos para o potencial da biodiversidade brasileira, que é a mais diversa do mundo e que deve ser colocada no centro da inovação científica e tecnológica. A celulose bacteriana, por exemplo, possibilita a produção de biomateriais para a área da saúde. Resíduos sólidos, como a fibra do açaí, podem ser utilizados na confecção de ecopainéis para substituir aqueles à base de resinas sintéticas. Até o caju surge como uma opção para a substituição da carne na alimentação vegana.
Como podemos constatar, há caminhos, conhecimento e tecnologia para firmar o Brasil na trilha do desenvolvimento sustentável. As escolhas atuais são, essencialmente, escolhas políticas. Como sempre, é na arena política que se dará o enfrentamento das opções que podem significar a manutenção de nossos problemas históricos, agora agravados com a pandemia, ou a liderança em soluções menos extrativistas e predatórias que nos coloquem como referência e façam jus à potência verde que somos. Está nas nossas mãos e da sociedade brasileira.