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Análise: jogada de Macron mostra que a democracia depende mais do debate do que do consenso

O presidente segue em posição difícil, mas pelo menos agora os políticos franceses serão obrigados a chegar em algum acordo se quiserem um governo funcional

Os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da França, Emmanuel Macron: diálogo é o caminho para a democracia (Ricardo Stuckert / PR/Divulgação)

Os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da França, Emmanuel Macron: diálogo é o caminho para a democracia (Ricardo Stuckert / PR/Divulgação)

Rodrigo Caetano
Rodrigo Caetano

Editor ESG

Publicado em 8 de julho de 2024 às 15h17.

Última atualização em 8 de julho de 2024 às 15h34.

O medo está no ar. Para onde se olha, profetas alertam para o perigo da incerteza. O que será da França sem um governo de coalizão, perguntam os incautos. Emmanuel Macron, o presidente responsável por jogar a grande nação nas garras do imponderável, pode até ter se safado da humilhação de uma derrota acachapante, mas não escapará do julgamento implacável da história, depois que sua aventura democrática de chamar eleições sem ter a certeza da vitória produzir o esperado fracasso.

Como ousa um líder perguntar ao seu povo, diante de evidentes mudanças no cenário interno e externo, se o caminho traçado continua válido? A quem interessa promover um debate inevitável, cujo desfecho é a única solução para a longa indefinição política, quando é possível adiá-lo indefinidamente e prolongar, por tempo semelhante, essa indefinição? Macron fez o óbvio e é criticado porque, na política, o óbvio nunca é o caminho correto.

Para a democracia, no entanto, muitas vezes é. A ascensão da direita mais à direita, nos últimos anos, fez surgir uma miríade de livros sobre o fim da era democrática – período em que, diga-se de passagem, mais pessoas saíram da extrema pobreza do que em qualquer outra época. Há diversas teorias, mas a premissa básica é a seguinte: por meio de táticas políticas e comunicacionais, com uso massivo de redes sociais, os direitistas estariam sequestrando a mente dos eleitores para promover a erosão das instituições, tomar de assalto o poder e eliminar qualquer possibilidade de debate democrático.

O que fez Macron, quando a direita mostrou força ao conquistar um número inédito de cadeiras no Parlamento Europeu? Convocou eleições. Ninguém entendeu por que, diante da evidente ameaça de se perder a liberdade de discutir sobre o que bem entender, o presidente decidiu partir para o debate. No primeiro turno, com a vitória expressiva da direita, deu-se o que todos esperavam. No segundo, quando ficou claro que o silêncio e a omissão não são táticas efetivas para se ganhar uma discussão, a esquerda decidiu reagir. O resultado foi óbvio: assim como o resto do mundo, a França é um país polarizado, com parte dos eleitores do centro à esquerda, e parte do centro à direita.

Macron foi o único vencedor. Ele já vinha governando de maneira frágil, apoiado em manobras constitucionais para, na prática, governar por decreto, e sendo severamente criticado por isso. Era tachado de impopular e acusado de covardia ao não permitir a ascensão de forças contrárias potencialmente predominantes. Provou que não há força dominante e que, enquanto os políticos franceses não se entenderem ao menos em relação a uma plataforma mínima de governo, não haverá governante popular.

Democracia, no fundo, é debate. Consenso mesmo, daqueles inabaláveis, só existe em ditaduras. Ou na imaginação de alguns analistas.

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