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Crise hídrica: seca histórica já compromete energia, transporte e produção agrícola no Brasil.
Publicado em 26 de novembro de 2025 às 15h00.
O conceito de nexo água-produção agrícola-energia surgiu no cenário internacional na última década, como resposta à constatação de que esses três setores são inseparáveis. Trata-se de planejar e gerenciar de forma integrada esses setores para promover o uso eficiente e sustentável dos recursos. A produção de energia requer água, seja na geração hidrelétrica, seja no resfriamento de termelétricas. A produção agrícola depende de irrigação e de insumos energéticos. E a disponibilidade de água sofre pressões de ambos os setores, além de estar sujeita às mudanças no clima. No Brasil, país com matriz energética predominantemente hidrelétrica, papel central na produção global de alimentos e liderança em biocombustíveis, esse nexo afeta o bolso e a segurança dos brasileiros.
Em 2021, o Brasil enfrentou a pior crise hídrica em quase um século, em que reservatórios de usinas atingiram níveis críticos, colocando em risco o abastecimento energético e elevando a conta de luz para os consumidores. Em 2023 e 2024 o rio Negro, em Manaus, atingiu o menor nível em 122 anos, comprometendo o transporte fluvial, a pesca e o abastecimento das comunidades ribeirinhas.
Esse entrelaçamento de fatores não se restringe à água e à energia, se estendendo também a produção agrícola. Um estudo recente da FGV mostrou que a combinação de exportações crescentes de grãos com as alterações climáticas fez com que o preço dos alimentos subisse acima da inflação geral no Brasil. A crescente demanda por commodities agrícolas aumenta a necessidade de gestão dos recursos naturais (água e solo), especialmente em momentos de escassez hídrica.
Pesquisadores brasileiros vêm propondo soluções técnicas e regulatórias para lidar com o problema, com modelos de planejamento das bacias hidrográficas que incorporam restrições, simulando os usos múltiplos da água, incluindo a produção de energia, a irrigação e a preservação de ecossistemas. No setor agrícola, as práticas de irrigação de alta precisão, bem como variedades resistentes à seca e técnicas de manejo do solo capazes de reter mais água, são alternativas que ganham espaço. Do lado da energia, a diversificação da matriz, com mais solar, eólica e biogás, reduz a dependência hídrica e aumenta a resiliência do setor.
A governança, no entanto, continua sendo o elo frágil. O Brasil possui instrumentos avançados, como a cobrança pelo uso da água e os comitês de bacias hidrográficas, mas ainda carece de coordenação efetiva entre ministérios, estados e municípios. O país está em uma posição privilegiada, com abundância de recursos hídricos e solo, ampla capacidade agrícola e potencial para energias renováveis. Entretanto essa abundância está em risco, como mostram as secas históricas e a volatilidade dos preços dos alimentos.
Se o Brasil quiser liderar a transição energética, reduzindo emissões e mantendo sua relevância global na produção agrícola, terá de liderar também na gestão integrada dos seus recursos naturais. A ciência já aponta caminhos, a tecnologia oferece soluções, e o nexo não é um desafio para amanhã: ele é a agenda urgente do presente.