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Produção da AVB começa na floresta: de seus 160 mil hectares de terra, 90 mil hectares são utilizados para o plantio de eucalipto, enquanto os 70 mil hectares restantes são de área nativa e áreas preservadas (APPs) (AVB/Divulgação)
EXAME Solutions
Publicado em 26 de maio de 2023 às 09h00.
Última atualização em 26 de maio de 2023 às 11h29.
A indústria do aço é uma das que mais sofrem pressão pela descarbonização. Considerada uma das mais poluentes do mundo, a siderurgia responde por até 9% das emissões antropogênicas globais de CO2 na atmosfera, de acordo com a WorldSteel Association. Com o compromisso de zerar as emissões de carbono até 2050, o setor enfrenta um grande desafio. Será possível alcançar as metas estabelecidas pelo Acordo de Paris?
Para Sandro Raposo, diretor de ESG e Novos Negócios da Aço Verde do Brasil (AVB), a resposta é sim. “O Brasil tem um potencial muito grande de energia renovável. É um país que pode ser um hub de produtos de baixo carbono, seja em aço, seja em cimento, seja em alumínio”, avalia.
Além disso, o momento é propício – e urgente, claro. Ao mesmo tempo que há um relevante movimento de stakeholders visitando o Brasil, explica o executivo, a Europa já dá sinais que entendeu que, para descarbonizar na velocidade necessária, precisará de parceiros externos.
“Acreditamos estar em curso uma nova Revolução Industrial silenciosa a nível global. Onde se produz não é mais a questão. A questão agora é como se produz e o nível de emissões de CO2 associado. E as empresas vão ter de se estruturar em razão do local onde é possível produzir com baixa emissão. Os próximos anos serão decisivos. Daqui dez, 20 anos, acreditamos que tudo será diferente”, diz Raposo.
"Acreditamos estar em curso uma nova Revolução Industrial silenciosa a nível global. Onde se produz não é mais a questão. A questão agora é como se produz e o nível de emissões de CO2 associado.” Sandro Raposo, diretor de ESG e Novos Negócios da AVB"Sandro Raposo, diretor de ESG e Novos Negócios da AVB
O caminho para a descarbonização, no entanto, não é único. Enquanto algumas soluções técnicas estão sendo estudadas, duas práticas têm sido amplamente exploradas pela indústria: via sucata ou via biocarbono.
No primeiro exemplo, é realizado o aumento do mix ou do percentual de sucata na carga para a produção do aço. Na prática, uma alternativa considerada simples, mas com pouca aderência para o cenário brasileiro. “Não temos a mesma cultura de descarte como a dos Estados Unidos”, explica Raposo. O mesmo não pode ser dito sobre o biocarbono. “A AVB é um exemplo de que a solução funciona e que pode ser uma das opções para a descarbonização do Brasil”, afirma.
A produção do aço verde da AVB começa na floresta. Nos seus 160 mil hectares de terra, área um pouco maior do que a da cidade de São Paulo, 90 mil hectares são utilizados para o plantio de eucalipto, enquanto os 70 mil hectares restantes são de áreas nativas e áreas preservadas (APPs).
É da árvore de eucalipto que é extraída a biomassa que será transportada para Açailândia, no sul do Maranhão. Nos altos-fornos da siderúrgica, o biocarbono é utilizado para a produção do ferro-gusa, que então será a principal matéria-prima metálica utilizada na fabricação do aço verde.
Do ponto de vista da sustentabilidade, a produção de aço verde à base de biocarbono tem como grande vantagem a redução significativa de CO2 para a atmosfera. De acordo com WorldSteel Association (“WSA”), a média mundial de emissões do setor siderúrgico em 2022 foi da ordem de 1,91 t de CO2 para cada tonelada de aço.
“Na AVB, para cada tonelada de aço, são emitidos 0,02 tonelada de CO2, ou 20 quilos. Ou seja, nós temos um indicador de emissão que é 100 vezes menor que a média mundial, sendo o melhor indicador climático brasileiro nos últimos cinco anos”, pontua Raposo, utilizando-se dados da WSA. Já para a economia, o uso de matéria-prima nacional, como o biocarbono, torna o país mais independente das oscilações do preço do coque no mercado internacional.
Outro ponto a ser destacado é o seu potencial de escalabilidade. Com vasta extensão territorial e grande quantidade de florestas de eucalipto, o Brasil tem uma capacidade significativa para aumentar a produção de biomassa e, consequentemente, de produção de aço verde.
Um bom indicativo pode ser observado a partir da indústria de produção de papel, que também utiliza a biomassa de florestas de eucalipto para a produção de celulose – com a diferença de que consome mais madeira, são 3,8 m3/t para a produção de biocarbono ante 4,0 m3/t para a produção de celulose.
Em 2022, a produção brasileira de celulose foi de 25 milhões de toneladas, um resultado recorde. “O Brasil é atualmente o maior produtor de celulose do mundo. Se eu consigo ser recordista mundial de produção de celulose e exportar para o mundo inteiro, por que eu não consigo usar a madeira produzida por essa mesma floresta de eucalipto plantada para a produção de biocarbono, e que posteriormente será empregado na produção do aço verde a ser exportado para o mundo inteiro?”, questiona.
Para alcançar todo o potencial de produção de aço verde no Brasil, alguns passos precisam ser tomados. Há tecnologias e soluções em desenvolvimento globalmente. Mas para Sandro Raposo, “a produção de aço verde no Brasil à base de biocarbono já é uma solução que existe há mais de 50 anos. É uma solução consolidada em relação a outros métodos que estão ainda em teste e que têm um custo de produção mais alto. Temos uma tecnologia local que funciona muito bem para o Brasil”, diz Raposo.
Porém, as usinas siderúrgicas ainda precisam se adaptar. O maior problema atualmente, do ponto de vista da sustentabilidade, é o uso de carvão mineral, que é utilizado para fazer o coque, que depois é carregado nos altos-fornos para a produção do ferro-gusa que será empregado na produção de um aço intensivo em carbono (altas emissões de CO2).
“Cerca de 75% da produção mundial usa rota à base de coque”, pontua. E diferentemente do biocarbono, o coque tem uma alta emissão de carbono enquanto o biocarbono é uma matéria-prima carbono neutro (zero emissões de CO2) conforme definição do IPCC.
O Brasil produziu em 2022 cerca de 34 milhões de toneladas de aço, sendo que o parque industrial é composto majoritariamente de indústrias siderúrgicas que usam o coque como redutor nos altos-fornos.
“Ao todo, mais de 75% da produção de aço no Brasil é feita do coque. Temos um parque com alta emissão de carbono que precisa de uma grande remodelação, e para que essa mudança seja feita no setor até o ano de 2050 serão necessário grandes investimentos, desenvolvimento de novas tecnologias, estruturação do mercado de créditos de carbono e adoção de políticas públicas de incentivos à descarbonização etc.”, opina Raposo.
A usina com capacidade instalada de 600 mil/t, alcançou a produção máxima histórica de cerca 360 mil toneladas de laminados de aço.
Além dos investimentos a serem realizados pela iniciativa privada, Raposo acredita ainda que seja essencial o fomento de incentivos governamentais. “O governo pode ajudar através da liberação de linhas de financiamento verde com baixas taxas de juro para investimentos na produção de biocarbono por exemplo, facilitar os financiamentos florestais e a compra de terras para o plantio de florestas que atualmente respondem por menos que 1,0 % do território brasileiro.
Com os incentivos governamentais adequados e os investimentos privados orientados para o crescimento de nossa área florestal plantada, o Brasil teria capacidade de produzir anualmente mais de 26 milhões de toneladas de aço verde”, conta.
Com 50 anos de expertise na produção de biocarbono (carvão vegetal), e oito anos de experiência na fabricação de aço verde, a AVB é uma empresa idealizada para ser uma siderúrgica sustentável e ambientalmente responsável.
Além de produzir aço evitando as emissões de gases de efeito estufa, recuperando áreas florestais previamente antropizadas e com energia totalmente oriunda de fontes renováveis, a AVB prioriza a economia circular e a redução de desperdícios de matéria-prima.
Entre as iniciativas para 2023, Raposo destaca a inauguração de uma termelétrica de 11 MW com reaproveitamento dos gases de processo produzidos nos altos-fornos para a produção da energia elétrica renovável – o que, segundo o executivo, proporcionará uma economia de um terço da compra de energia elétrica externa feita anteriormente.
Além disso, evidencia ainda a implantação de uma planta de briquetes a frio que dará novo destino para os resíduos sólidos gerados no processo produtivo. A redução esperada de consumo de minério de ferro e de biocarbono nos altos-fornos é de até 10%, com 100% do reaproveitamento dos resíduos sólidos gerados na usina.
“Não temos conhecimento de players no Brasil que consigam atualmente produzir esses briquetes a frio à base de resíduos sólidos para emprego nos altos-fornos de forma consistente no Brasil. Até o primeiro trimestre de 2024, teremos desenvolvido uma patente para esse processo”, conta.
Ainda para este ano, o executivo enfatiza um dos grandes focos da AVB: a autossuficiência. “Queremos atingir a nossa maturidade de produção do aço verde alinhada ao crescimento de nossa produção florestal. Estamos em ramp up, e queremos continuar crescendo para ter a nossa capacidade total de produção de 600 mil toneladas por ano, com emprego de 100% de biocarbono”, detalha Raposo. Crescimento sustentável sem descuidar das boas práticas em ESG, é claro.
O plantio de florestas de eucalipto e a produção de biocarbono em áreas do Brasil de baixo Índice Desenvolvimento Humano (IDH) contribuem para o aumento da geração de emprego e renda nestas regiões.
Para isso, a AVB procura sempre estar alinhada às determinações dos órgãos oficiais reguladores. “Nós nos cercamos de uma série de certificações nacionais e internacionais para termos também a credibilidade do trabalho que estamos fazendo. Temos a certificação do nosso inventário de emissões de CO2 pela SGS Brazil, fazemos a divulgação do nosso inventário pela Fundação Getulio Vargas e via a organização internacional Carbon Disclosure Project (CDP), bem como validamos nossas metas climáticas via Science Based Targets (SBTi) e publicamos nosso Relatório de Sustentabilidade há mais de três anos”, enumera Raposo.
Para o diretor de ESG e Novos Negócios da AVB, o investimento em sustentabilidade hoje é mais do que uma questão ambiental, é uma questão de sobrevivência no mercado.
“Hoje não tem mais discussão, não se discute mais sobre a existência de problemas climáticos no planeta. Já existem na Europa tarifas de carbono sobre produtos intensivos em emissões de CO2 em implantação como o Carbon Border Adjustment Mechanism (CBAM). A partir de 2030, o aço que for importado pela Europa e que não for verde (baixas emissões de CO2) irá pagar uma tarifa adicional de carbono estimada hoje em torno de 100 euros por tonelada. Esta tarifa de carbono será um diferencial competitivo para as usinas produtoras de aço verde, ao mesmo tempo que impactará negativamente o custo de produção das empresas produtoras de aço de carbono intensivo”, diz
Raposo conclui dizendo que a adoção de políticas públicas de incentivos pelos diversos governos e países, como a disponibilidade de gás natural com preço baixo (gás de transição), biocarbono e de sucata, será fundamental para acelerar a descarbonização do setor siderúrgico.