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A governança dos trios e trincas

Um trio não é uma pessoa, são três. Sendo assim, cada trio tem a sua relação de governança, com posições individuais para cada um de seus três integrantes e uma dinâmica de relacionamento entre eles

 (Tom Merton/Getty Images)

(Tom Merton/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2023 às 08h02.

Venho de três irmãos: uma irmã e dois irmãos. Um trio. Eu o mais velho, nossa irmã e o caçula. Cada um começou a partir desse lugar. Aliás, não. Eu comecei filho único, ganhei uma irmã. Éramos um casal de irmãos e, então, veio o caçula. Eles já nasceram acompanhados, nunca estiveram sozinhos.

E o que isso importa ao leitor? Uma resposta vem de Bert Hellinger, criador do interessante e controvertido método da “constelação sistêmica”. Nas relações, cada um ocupa uma posição. Um vem antes, outro depois. Uns vão antes, outros depois. Uns ficam mais perto, outros mais longe. Na dinâmica de um casal é assim, numa amizade é assim, numa família é assim. Numa empresa é assim.

Um trio não é uma pessoa, são três. Sendo assim, cada trio tem a sua relação de governança, com posições individuais para cada um de seus três integrantes e uma dinâmica de relacionamento entre eles.

50 anos de união de qualquer trio é muito tempo de convívio, com lembranças, saudades, cicatrizes, afinidades e individualidades. No trio que lidera as Americanas, além de líderes empresariais, são também patriarcas, provavelmente avôs, talvez bisavôs até. Cada um deles existe individualmente, olha-se no espelho, vai ao banheiro, dorme.

Em qualquer governança de trio, pode ocorrer de um deles ter alguma ascendência sobre os demais, por uma liderança moral, emocional ou hierárquica, talvez cabendo a ele um voto de minerva na solução de conflitos no trio. Os ciclos temporais da governança podem reformular essas configurações, ou não.

O fato é que um trio é composto por três partes independentes e estanques, que se conectam e se mantem conectadas por um propósito comum.

O propósito é dinâmico, bem como a conjuntura individual de cada uma das três partes. Numa tríade longeva, unida por décadas, o propósito comum da etapa inicial pode não ser mais aplicável com o surgimento de uma nova etapa.

Caso o fator determinante para a nova etapa seja um trauma grave, cada uma das três partes tende a lidar com esse trauma de acordo com a sua ecologia individual, conforme as suas crenças e valores individuais, interagindo com stakeholders pessoais seus, integrantes de seu círculo de confiança pessoal.

"As famílias felizes são todas iguais. As infelizes são cada qual à sua maneira", já nos ensinava Tolstói. Por analogia, nos momentos felizes, o voto no trio pode parecer ter sido sempre igual. Nos momentos infelizes, porém, cada voto no trio tende a vir explicitado à sua maneira individual, conforme a sua  reflexão, conduta e decisão individual, afetada também pela interação com seus stakeholders individuais.

Nessa interação, não deve ser incomum ouvirem a repetição de frases do tipo: "Eu sabia!" "Sempre desconfiei." "Tenho certeza que isso é coisa dele." "Não te falei?" "Eu avisei pra você abrir o olho." "Nunca gostei do jeito como ele falava com você." "E agora, aqui em casa, como é que fica?" "Os meus filhos não têm nada a ver com os seus problemas." É a voz da irmã, da esposa, do sogro, do filho adolescente, da nora, do genro, dos netos, do irmão, da tia, do velho amigo.

Além da governança do trio em si, existe a governança individual de cada um dos três núcleos familiares diferentes que derivam da tríade, com suas composições, momentos, dinâmicas e ritmos diferentes, afetando o momento decisório individual de cada um dos três.

Queira-se ou não, um trio inclui sempre o “eu” e o “eles”, os outros dois. Há uma insegurança do um com relação a uma potencial união da outra dupla, que forma maioria. Nessa dinâmica, cada um sempre está sozinho no seu canto do triângulo, frente a uma possível união dos dois lá do outro lado do triângulo, em oposição ao solitário observador. Na roda-vida da governança dos trios, cada um dos três é um solitário frente à dupla de outros.

Uma grave crise pode ser um game changer na governança de qualquer trio, impondo a revalidação e repactuação de um propósito comum atualizado. Nas circunstâncias de crise, aflora um potencial conflito na governança da tríade, pois a atenção ao interesse jurídico individual e ao legado reputacional individual pode preponderar com relação à união de propósitos que caracterizou a etapa pré-crise.

Na governança de uma crise grave, há um fluxo contínuo de decisões estratégicas a serem tomadas. E, nesse ritmo de gravidade, é recomendável que as decisões do trio possam ser tomadas por unanimidade, sem desvio de foco para a conciliação de divergências.

Nesse contexto, o êxito da governança de trios tem um agravante com relação à governança de duplas. Numa dupla, basta obter uma concordância para que haja uma decisão unânime na dupla.  No trio, é preciso agregar dois votos, convencer duas cabeças pensantes individuais e independentes, para que surja unanimidade decisória.

Em circunstâncias normais, a unanimidade da tríade não é imprescindível. Contudo, numa grave crise, ter no palco a imagem blindada de um trio unânime é tão imprescindível, quanto é improvável que essa unanimidade siga pujante nos camarins.

Há um mês atrás, veio o relato de que foi encontrada uma inconsistência, uma fenda, uma rachadura na blindagem da barragem contábil de uma das principais e mais tradicionais companhias do país.

“Trio, tríade, tróica, trinca” parafraseia a musicalidade do verso inicial da música do trio Tribalistas. São todas palavras sinônimas. Porém, a palavra “trinca” tem uma multiplicidade de sentidos que merece atenção. Além de significar um trio, “trinca” significa um tipo de jogada de sorte num jogo de cartas e, também, uma rachadura em algo que tinha uma aparência una, firme e constante.

No presente, a governança do trio deve estar lidando com o risco das trincas que possam se expandir entre eles e com a adição de seus sucessores. Em paralelo, o cotidiano dessa governança segue atento às próximas cartadas, em mais essa intensa e decisiva rodada do longo jogo, que os três iniciaram unindo-se na juventude.

*Luciano Porto é especialista em governança, atento à sua dinâmica nas relações empresariais, contratuais, familiares e ESG. Advogado e Conselheiro Independente IBGC CCA+.

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