ESG

A governança de um contrato

O contrato é um manual do que foi combinado e, assim, contém a regra de governança da relação contratual iniciada. Convém, portanto, que essa governança contratual seja clara e útil ao objetivo do contrato

 (ilkercelik/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 11 de outubro de 2022 às 13h39.

A governança contratual ganha relevância nos contratos de prazo alongado, pois regulará o convívio das partes contratantes durante o tempo de duração do contrato. É a governança contratual que regula como permanecer e como sair do contrato existente. 

Como premissa, acredito que a redação de um contrato deve buscar ser compreensível a todos, sem jargões herméticos. É a clareza contratual que permite que as equipes das partes entendam o que foi combinado e atuem para realizá-lo, usando o texto contratual como um instrumento de apoio. O contrato é um manual do que foi combinado e, assim, contém a regra de governança da relação contratual iniciada. Convém, portanto, que essa governança contratual seja clara e útil ao objetivo do contrato. 

Quando um contrato se estende por um tempo maior do que um ano, por exemplo, muitas circunstâncias tendem a se modificar e a afetar a relação contratual. Se uma das partes contratantes for uma empresa, uma pessoa jurídica, poderá vivenciar inúmeras mudanças. Pode trocar de equipe relacional, de portfólio de produtos, de política de preços, de linha negocial, de estratégia de negócios, de dono, de saúde financeira, etc. Essas possibilidades se duplicam se a outra parte for também uma empresa.

Assim, ao longo do fornecimento contratado, a empresa cliente não tem assegurada a certeza de que a contratada manterá a mesma interface relacional, o mesmo catálogo de produtos e serviços, a mesma estratégia comercial, o mesmo padrão de qualidade e atendimento, o mesmo preço relativo, a mesma capacidade de entrega. Risco similar é vivenciado pela fornecedora com relação à sua cliente. Diante de tantas mudanças, o contrato serve também como um pró-memória do que foi combinado, entre partes em contínua transformação. 

Essas incertezas negociais podem afetar o resultado contratual inicialmente objetivado. São riscos contratuais que podem ser geridos e mitigados por meio da governança contratual, na redação e na gestão contratual.

A redação contratual pode fazer a sua parte, estipulando regras de governança contratual que incluam alçadas decisórias para escalar a solução do problema, definam parâmetros e critérios decisórios, estabeleçam o monitoramento de indicadores, níveis de serviço e métricas ESG, junto com uma lista de hipóteses rescisórias, um pacote de garantias e um regime de solução de controvérsias. 

Contudo, é na prática que está o sopro de vida para a governança contratual escrita, no convívio cotidiano das equipes de gestão contratual das partes, que são a interface humana entre as partes contratantes. É como ensina o mantra dos programas de compliance: “walk the talk” (faça o que diz). Essa prática é o fator central para o êxito de qualquer estrutura de governança, devendo ser estimulada nas culturas empresariais das partes contratantes. 

Se alguém encomenda mil camisetas azuis de tamanho médio, essa combinação não especificou o tecido da camiseta, o seu corte, o seu padrão de acabamento, o tom do azul, as suas medidas. Logo, duas partes que tenham contratado essa encomenda poderão se ver num grande problema, se a fabricante entregar à cliente as tais “mil camisetas azuis de tamanho médio” com especificações diferentes do que a cliente imaginou.

Para mitigar esse risco de descasamento de expectativas, a governança contratual recomenda um certo nível de detalhe na redação do contrato. Uma redação contratual omissa ou obscura poderá ser resolvida com a sua repactuação voluntária, por meio de um aditivo contratual, ou por meio de um litígio, que delega ao julgador interferir na redação contratual omissa. Em ambos os casos, é um custo que convém buscar evitar.

Com esses recortes, vê-se que o dinamismo dos fatores da governança contratual pode ser fonte de diferentes interpretações, interesses e movimentações, que podem se desdobrar em conflitos entre as partes contratuais, que se multiplicam nos tribunais e nas arbitragens. A clareza na avaliação e na definição da governança contratual pode minimizar os potenciais de risco e conflito aqui considerados, bem como os custos deles derivados.

Luciano Porto é especialista em governança, atento à sua dinâmica nas relações empresariais, contratuais, familiares e ESG. Advogado e Conselheiro Independente IBGC CCA+.

 

 

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