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A maior visibilidade ao trabalho dos catadores é, para o presidente da Ancat, um indicativo do sucesso do Conexão Cidadã
Repórter de ESG
Publicado em 5 de setembro de 2025 às 06h00.
Última atualização em 5 de setembro de 2025 às 13h36.
Desde 2023, uma parceria entre a Heineken e a Associação Nacional dos Catadores e Catadoras (Ancat) já beneficiou mais de 2 mil profissionais da cadeia de reciclagem — e quer aumentar esse número até 2026. O Conexão Cidadã, realizado a partir do Instituto Heineken, braço social da fabricante de bebidas, chega ao seu terceiro ano de operação oferecendo suporte jurídico, social e orientações sobre direitos para catadores de materiais recicláveis.
A missão é facilitar o acesso dessa população, muitas vezes invisibilizada nas cidades, aos serviços de saúde e cidadania. A iniciativa conta com uma equipe multidisciplinar, formada por especialistas como assistentes sociais e psicólogos, focados na melhoria das condições de vida e trabalho dos catadores. Tudo isso acontece em um trailer, que se locomove pelas cidades prestando atendimento de forma gratuita, desde a renovação de documentos até a implementação de políticas públicas assistenciais.
“Os catadores hoje são responsáveis por 90% de tudo que é reciclado no Brasil. Mesmo assim, ainda são um dos elos mais vulneráveis na nossa cadeia de valor”, afirma Vânia Guil, head do Instituto Heineken. Ela conversou com a reportagem e contou com exclusividade para a EXAME sobre as novidades da iniciativa, que quer chegar a 3 mil beneficiados até o próximo ano.
A ideia é não esperar até que o catador — do cooperativado ao autônomo, que se locomove pela cidade e apresenta ainda mais condições de vulnerabilidade — vá atrás de serviços de assistência por conta própria. “A ANCAT apresentou a ideia desse trailer itinerante que vai até o catador, em uma atitude mais proativa, em São Paulo”, explica Guil. A ideia foi um sucesso: a expectativa era chegar a mil profissionais impactados, número que já foi dobrado.
No último ano, o Instituto e a Ancat desenvolveram o Instrumento de Acompanhamento, uma ferramenta que permite que as informações de cada beneficiário sejam armazenadas, como renda, rotas de coleta, frequência de trabalho e rede de apoio. Assim, a equipe multidisciplinar envolvida no projeto desenvolve planos de ação personalizados, buscando melhores formas de atender cada profissional.
Para Roberto Rocha, presidente da Ancat, a iniciativa ajuda a dar reconhecimento e assistência para além do trabalho com a reciclagem. “O objetivo é dar a assistência necessária aos trabalhadores, seja no aspecto social, com equipamentos de proteção individual, uniformes, atendimento psicossocial, e até mesmo oferecer opções de lazer e cultura”, afirma. A arte também entrou no escopo do projeto: os catadores recebem visitas guiadas à museus e exposições, além de sessões de cinema gratuitas e oficinas educativas e formativas sobre gestão e reciclagem.
Neste ano, o Conexão Cidadã incorporou à sua estratégia o combate ao consumo nocivo de bebidas alcoólicas entre os catadores, uma das principais dores ao negócio do Grupo Heineken, cujo carro-chefe são as cervejas. Segundo Guil, o processo surgiu depois que o Instituto notou que, para os catadores, endereçar o bem-estar e saúde é tão importante quanto o trabalho e a remuneração. “Trabalhar esse tema é importante para que eles possam exercer o melhor trabalho, tendo as condições físicas para isso. Como indústria cervejeira, não queríamos só criar a questão, mas também trazer soluções”, explica a head.
Roberto conta que uma grande parcela dos catadores autônomos, que chegam ao trabalho com a reciclagem a partir da necessidade, enfrentam problemas com o alcoolismo. “Esse tema é muito importante para a categoria. O projeto vem abrindo a mentalidade dos catadores, trabalhando o consumo consciente das bebidas e os malefícios do álcool”, diz.
Para Vânia, o maior desafio enfrentado pelo projeto é acompanhar os profissionais que circulam de forma itinerante. Por conta da natureza do trabalho, esse desencontro é uma dificuldade para estabelecer relações de confiança. “Ver os 2 mil catadores atendidos é uma alegria, porque sabemos que não é fácil a aproximação e a continuidade dessa relação”, explica Vânia.
Roberto afirma que a união com a Ancat e o conhecimento dos territórios ajuda na conquista da confiança dos catadores. “A equipe sabe o foco dos catadores, onde estão pegando determinados materiais e onde podem entregar esses materiais. Ter nossos catadores como mobilizadores ajudam a conhecer os problemas e solucioná-los”, conta.
A maior visibilidade ao trabalho dos catadores é, para o presidente da Ancat, um indicativo do sucesso do Conexão Cidadã. “Somos nós que preservamos boa parte desse plano e que não deixamos os aterros superlotados, somos garimpeiros urbanos que fazem um serviço invisível”, afirma. Para ele, esse reconhecimento ainda precisa avançar muito, especialmente na união com o setor público: a legislação e política de resíduos brasileira colocam os catadores como eixo prioritário nesse processo, mas legislações regionais ainda carecem de arranjos que unam o trabalho das empresas, dos catadores e cooperativas.
Além de São Paulo, o projeto foi levado para Salvador, onde é realizado em parceria com a companhia de embalagens Tetra Pak. O objetivo é levar o projeto a frente como uma política pública, incorporando o tema às estratégias municipais. “Sonhamos em favorecer o diálogo maior e mais próximo entre órgãos públicos e o setor privado. Quanto mais empresas e governos nesses compromisso, melhores serão as condições de trabalho para os catadores”, afirma Guil.