Ficou definido que a autorização judicial deve ser exceção, exigindo prova de pedido formal ao plano e consulta a especialistas independentes antes de conceder liminares (Natee Meepian / EyeEm/Getty Images)
Plataforma de conteúdo
Publicado em 26 de setembro de 2025 às 19h58.
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que procedimentos e terapias não incluídos no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) só poderão ser cobertos quando cumprirem critérios técnicos específicos. A lista da ANS, atualizada periodicamente, reúne mais de 3 mil serviços médicos obrigatórios — como procedimentos odontológicos preventivos e exames de rastreamento para câncer — mas vinha sendo questionada desde que o Congresso aprovou, em 2022, uma lei que ampliou as possibilidades de cobertura.
A decisão, relatada pelo presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, em 18 de setembro, fixou cinco requisitos cumulativos: prescrição por profissional habilitado; inexistência de negativa expressa da ANS ou de pendência de análise; ausência de alternativa terapêutica adequada já contemplada na lista; comprovação de eficácia; e segurança do tratamento à luz de evidências científicas de alto grau.
Além disso, ficou definido que a autorização judicial deve ser exceção, exigindo prova de pedido formal ao plano e consulta a especialistas independentes antes de conceder liminares.
Decisões administrativas
Na prática, o novo entendimento restringe o acesso a terapias fora do rol, mas também estabelece parâmetros claros para sua autorização. “Todos os cinco requisitos definidos pelo STF deverão ser preenchidos de forma cumulativa, o que significa que se um critério não puder ser preenchido, o pedido será negado ainda que todos os demais tenham sido demonstrados”, pontua Carla Moraes, advogada sênior da área de Life Sciences do Trench Rossi Watanabe.
“Então, é possível que a ANS tenha negado a incorporação do tratamento ou procedimento com base em uma análise mais geral, mas, para a situação clínica de um paciente específico, o tratamento ou procedimento seria a melhor opção”, acrescenta.
O advogado sanitarista Paulo Benevento, diretor executivo da Benevento Sociedade de Advogados, lembra que, antes, as decisões da ANS sobre incorporação de medicamentos e outras tecnologias eram relevantes, mas o juiz não estava obrigado a segui-las. Agora, essas decisões administrativas tendem a prevalecer na maioria dos casos.
“A decisão adotada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7265 deixa uma brecha para discutir a legalidade do processo de avaliação das tecnologias, mas é uma discussão complexa, já que o STF atribuiu ao beneficiário o ônus da prova. O grande desafio será fortalecer as associações de pacientes, porque são estas que podem fazer a diferença. A decisão do STF desloca a discussão do plano judicial para o plano administrativo. É nesse espaço que as associações devem atuar pela incorporação de tecnologias e pelo acesso a tratamentos”, avalia Benevento.
Com a exigência de uma prescrição médica mais detalhada e baseada em evidências científicas, Carla Moraes enfatiza que os médicos deverão estar preparados para a elaboração de relatórios mais robustos, demonstrando, também, “ausência de alternativa terapêutica adequada para a condição do paciente no rol de procedimentos da ANS”.
Freio à judicialização
As operadoras, por sua vez, enxergam a decisão como um freio à escalada de judicializações. De acordo com a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), desde a mudança de 2022, o setor desembolsou cerca de R$ 16 bilhões em ações judiciais relacionadas a pedidos de cobertura fora do rol, valor que sobe a R$ 25 bilhões quando somadas despesas com fraudes.
Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que o número de processos cresceu 77% em dois anos: de 170 mil casos em 2022 para mais de 303 mil em 2024. À imprensa, o presidente da Abramge, Gustavo Ribeiro, declarou que os novos critérios podem reduzir os custos operacionais e, no médio prazo, aliviar a pressão sobre os reajustes das mensalidades.
Para Paulo Benevento, no curto prazo, a decisão deve reduzir a judicialização relacionada a medicamentos e tecnologias em saúde. “Porém, pode ampliar a insatisfação dos usuários com os planos e abrir espaço para um aumento de ações sobre outros pontos, como descredenciamento de prestadores, políticas de reembolso e reajuste de mensalidades”, afirma.