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Licenciamento ambiental: como o novo PL pode afetar a vida dos brasileiros?

A aprovação de obras em áreas sensíveis sem avaliação técnica pode comprometer não só a segurança da população, mas a capacidade do Estado de prevenir tragédias

O chamado “PL da Devastação” foi aprovado na Câmara e segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Cedro Participações/Divulgação)

O chamado “PL da Devastação” foi aprovado na Câmara e segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Cedro Participações/Divulgação)

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Publicado em 18 de julho de 2025 às 20h03.

Última atualização em 18 de julho de 2025 às 20h04.

Foi aprovado na quarta-feira, 16, o Projeto de Lei 2.159/2021, que cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental. A votação na Câmara dos Deputados foi concluída com 267 votos favoráveis e 116 contrários, e agora o texto – apelidado de “PL da Devastação” por críticos – segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os efeitos dessa mudança vão muito além dos trâmites burocráticos e podem impactar diretamente a vida da população.

O projeto flexibiliza procedimentos e amplia possibilidades de licenciamento por autodeclaração, com dispensa de análises técnicas prévias em atividades consideradas de baixo e médio impacto.

“Esse PL tem sido criticado por fragilizar esses critérios e, no caso de empreendimentos urbanos, temos o risco de não ter um controle técnico e científico sobre os impactos dessas construções que, antes, tinham que apresentar uma documentação prévia que provava o uso regular de determinados territórios, o impacto hídrico, a compensação ambiental”, explica Raquel Schenkman, presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) em São Paulo.

Ainda que algum tipo de controle permaneça, Schenkman lembra que, mesmo com as regras atuais, empreendimentos já burlam normas, apresentam documentos inconsistentes ou sequer passam por licenciamento formal. “Imagine com essa maior flexibilização. Estamos testando uma sensação de impunidade, de descontrole, quando antes era possível avaliar e equilibrar melhor tanto a fiscalização quanto o licenciamento”, afirma. 

Para ela, o argumento de que o processo é muito burocrático não deve ser usado para justificar a fragilização da regulação. “Essa burocracia garante direitos e igualdade de condições quando conduzida por órgãos técnicos fortalecidos. É essencial para o cuidado com o ambiente urbano e com a qualidade de vida da população.”

Desastres naturais

Os riscos da flexibilização também preocupam especialistas que atuam na prevenção de desastres. Segundo Pedro Camarinha, tecnologista do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), a frequência e a intensidade de eventos extremos vêm aumentando nos últimos anos, sobretudo a partir de 2020. 

“Os estudos atuais, especialmente os que associam mudanças climáticas ao padrão de chuvas, indicam que o aquecimento global tem tornado a atmosfera mais quente e dinâmica. Isso favorece eventos mais intensos, como vimos recentemente no Rio Grande do Sul”, lembra.

Mas, para além do fator climático, Camarinha reforça que há uma combinação de fatores que explica o crescimento dos desastres no País. O avanço desordenado de áreas urbanas e periurbanas sobre regiões frágeis, como encostas e margens de rios, muitas vezes sem infraestrutura adequada de drenagem, aumenta a exposição da população. “A desigualdade social força muitas pessoas a ocuparem áreas de risco, e a degradação ambiental – como o desmatamento das bacias hidrográficas – intensifica o escoamento superficial e favorece deslizamentos”, aponta.

Novos riscos

A aprovação de empreendimentos em áreas sensíveis sem avaliação técnica pode comprometer não só a segurança da população como também a própria capacidade do Estado de prevenir tragédias. “Sem dúvida que isso impacta o sistema de alerta. Já temos dificuldades mesmo com o mínimo de rigor. Com um licenciamento mais frouxo, surgem novos cenários de risco que podem não ser detectados a tempo”, afirma o pesquisador do Cemaden. 

Outro ponto crítico está nas grandes áreas impermeabilizadas por construções urbanas, que, sem planejamento adequado, aumentam o volume e a velocidade de escoamento da água da chuva. “Isso facilita o extravasamento de rios e córregos e acelera processos erosivos. Muitas vezes, a água escoa para encostas que não estavam preparadas para aquele volume, gerando deslizamentos”, explica Camarinha. O licenciamento ambiental, segundo ele, é a principal ferramenta para exigir obras de infraestrutura que mitiguem esse tipo de impacto.

Para o pesquisador, o mínimo essencial em qualquer análise de risco climático e geológico deveria incluir dados atualizados sobre o regime de chuvas e projeções de longo prazo. “Muitas obras ainda são projetadas com base em dados da década de 1970 ou 1980, mas o clima está mudando. Chuvas que antes aconteciam a cada 100 anos estão se tornando mais frequentes”, alerta. Ele defende que novos empreendimentos considerem projeções até pelo menos 2050, para que estejam adaptados ao chamado “novo normal climático”.

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