Coronavírus (Predrag Popovski/Getty Images)
Por Vagner Bernal Barbeta*
O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) tem o objetivo de “financiar a inovação e o desenvolvimento científico e tecnológico, com vistas a promover o desenvolvimento econômico e social do País”. Criado em 1969 e, conforme determinado pelo decreto nº 68.748, de 15 de junho de 1971, ratificado na Lei nº 11.540, de 12 de novembro de 2007, possui a Finep (Financiadora de Artigos e Projetos), vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação, como responsável por todas as atividades de natureza administrativa, orçamentária, financeira e contábil.
Criado inicialmente como um “fundo contábil”, não possuía nenhuma receita vinculada, o que fazia com que os recursos disponíveis fossem bastante escassos. Com a criação dos chamados “Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia”, a partir de 1999, passou a contar com uma receita efetiva. Atualmente existem 16 Fundos Setoriais, sendo 14 relativos a setores específicos e dois transversais, que abastecem o FNDCT. Destes, um é voltado à interação universidade-empresa (FVA – Fundo Verde-Amarelo), enquanto o outro é destinado a apoiar a melhoria da infraestrutura de ICTs (Institutos de Ciência e Tecnologia).
As receitas desses fundos são oriundas de contribuições incidentes sobre o resultado da exploração de recursos naturais pertencentes à União, parcelas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de certos setores e de Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) incidente sobre os valores que remuneram o uso ou aquisição de conhecimentos tecnológicos/transferência de tecnologia do exterior.
Por se tratar de um fundo de natureza contábil, possuía como grande fragilidade o fato de poder ter seus recursos contingenciados, ou seja, o bloqueio de sua execução orçamentária, com objetivo de equilibrar a execução das despesas e a disponibilidade efetiva de recursos do governo federal. Assim, muito pouco do que se encontrava disponível no FNDCT era efetivamente aplicado na área de CT&I, já que no ano fiscal seguinte os recursos não executados do FNDCT retornavam para o caixa do Governo.
Ameaçado de extinção pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 187 de 2019, a qual propunha extinguir os fundos públicos vinculados a áreas específicas, direcionando seus recursos para outras finalidades, conseguiu sobreviver, sendo retirado em março de 2020 do escopo da PEC. Posteriormente foram retirados também da PEC os fundos setoriais que o alimentam.
O FNDCT tem sido nos últimos anos uma das principais fontes de recursos orçamentários e financeiros para o apoio à infraestrutura científica e tecnológica das instituições públicas, como universidades e institutos de pesquisa, e também para o apoio à inovação tecnológica nas empresas com recursos não reembolsáveis.
Somente para se ter uma ideia deste aspecto, entre 2016 e 2020, segundo dados da FINEP, o FNDCT arrecadou R$ 18 bilhões. Porém, cerca de R$ 13 bilhões deixaram de ser investidos, por terem sido contingenciados.
Com a Lei Complementar 177, de 2021, passou a ser proibido o contingenciamento dos recursos do FNDCT, uma demanda histórica dos diversos atores ligados à CT&I. Além disso, tornou-se um fundo de natureza financeira, o que fez com que passasse a contar também, como fonte de receita, com os resultados de aplicações e também os eventuais ganhos de sua participação no capital de empresas inovadoras. Outro avanço importante foi o fato de que agora pode usar os saldos financeiros do ano anterior, que normalmente seriam devolvidos para o caixa único do governo federal.
Se por um lado tivemos avanços, restam ainda muitas reclamações e pontos para serem melhorados. O primeiro ponto de reclamação da comunidade ligada à CT&I é que a expectativa era de que a lei tivesse efeito no mesmo ano de sua aprovação. Porém, pela interpretação do Ministério da Economia, ele só terá validade a partir de 2022. Assim, dos cerca de R$ 10,2 bilhões arrecadados, menos de R$ 2 bilhões foram aplicados em CT&I.
Para o ano de 2022, a Lei Orçamentária aprovou R$ 8,4 bilhões, que precisariam ser divididos em despesas reembolsáveis (operações de crédito, operadas pela FINEP) e não reembolsáveis. A decisão foi a de dividir igualmente esse recurso, o que gerou novos protestos dos diversos atores ligados à CT&I. Isso porque tradicionalmente os recursos reembolsáveis não são totalmente utilizados, já que a maioria das empresas não considera as condições atrativas ou não consegue cumprir os requisitos necessários para acesso ao recurso. Além disso, cerca de R$ 1 bilhão deverá ser utilizado na forma de juros mais favoráveis nesses empréstimos (uma forma indireta de subvenção econômica).
Para atender algumas demandas, em especial do setor acadêmico, em 30 de março de 2022 o conselho do FNDCT aprovou um plano de investimentos de R$ 6 bilhões em recursos não reembolsáveis, sendo que a diferença de R$ 1,5 bilhão foi indicada como “saldo orçamentário”. Conforme informações divulgadas pelo MCTI, este recurso excedente foi aprovado na expectativa de que ocorra uma suplementação orçamentária no transcorrer do ano de 2022.
Muitas outras questões ainda são motivo de controvérsia e discussão, como o fato de que alguns fomentos que eram realizados no passado corriam por conta da datação orçamentária do MCTI e agora dependem do FNDCT, o qual não foi originalmente concebido com esta finalidade. Resta aguardar as próximas etapas desta discussão, que apode ajudar a trazer o Brasil para níveis mais adequados de apoio às atividades de ciência, tecnologia e inovação.
*Vagner Bernal Barbeta é professor e coordenador da Agência de Inovação do Centro Universitário FEI
Fonte: Revista Pesquisa FAPESP
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