Economia brasileira: Prévia do PIB, mostrou recuo de 0,68% entre janeiro a março de 2019. Foto: Ingo Roesler / Getty Images (Ingo Roesler/Getty Images)
A fundadora da Portofino Multi Family Office avalia o cenário político e econômico do país e diz que o empresariado espera que o próximo governo faça as reformas necessárias. Em 2012, Carolina Giovanella fundou a Portofino Multi Family Office para cuidar do patrimônio da própria família. Hoje, com o mesmo propósito, atende a inúmeras pessoas, famílias e empresas.
Em entrevista à Esfera Brasil, a CEO faz uma análise do cenário econômico e político do país e diz que o próximo governo, independentemente de quem seja o presidente, precisa trabalhar para aprovar as reformas administrativa e tributária. Ela afirma que as privatizações não saíram do papel, em grande parte, por causa da opinião pública.
Quais as principais conquistas do empresariado e da indústria no governo Bolsonaro? E o que poderia melhorar no próximo governo?
Elencaria três conquistas muito importantes no atual governo. A primeira foi a independência do Banco Central e suas iniciativas na linha de digitalização do sistema financeiro, como a implementação do Pix, o open banking, open finance, entre outros. A segunda foi a diminuição da máquina pública. Tivemos uma ligeira queda real do gasto público através da redução da contratação do quadro de servidores e da reforma da previdência. A terceira foi a postura do BNDES atuando como banco de fomento e desenvolvimento e não como banco de benefícios, com foco maior em médias empresas, saindo da lógica da construção de campeãs nacionais. Para o próximo governo, esperamos uma atuação mais contundente nas reformas necessárias, iniciando pela tributária. E não no formato sugerido no final de 2021, mas, sim, uma proposta de reforma mais profunda e geral, buscando a simplificação do sistema e desoneração da cadeia produtiva. Além disso, que também tire o foco apenas do Imposto de Renda, olhando também para os impostos estaduais, como ICMS e demais.
Por que só a reforma da previdência foi aprovada? Acha viável a aprovação das reformas administrativa e tributária?
Acho que por uma série de fatores. É fato que a pandemia trouxe maior complexidade ao cenário e um rearranjo das prioridades, mas, junto a isso, evidenciamos uma dificuldade de articulação por parte do governo para conseguir força e buscar as reformas necessárias. Sou completamente a favor da alternância de poder e de mandatos presidenciais de apenas quatro anos, sem a possibilidade de reeleição. Acho que a decisão de buscar um novo mandato também trouxe distrações no processo das reformas. Num eventual segundo mandato de Bolsonaro, a expectativa é que as reformas que ficaram pelo caminho recebam uma ação mais categórica, em especial a tributária.
Estamos acompanhando um cenário inédito de polarização nas eleições. Acha que haverá aumento da violência política? Há, na sua opinião, possibilidade de não cumprimento do resultado das urnas?
É muito difícil prever isso. No passado, vimos muitos ataques a presidentes e candidatos não apenas no Brasil, mas em todo o mundo, como o mais recente ao ex-premiê japonês Shinzo Abe. Na minha opinião, não existe justificativa para nenhum tipo de violência. O debate e opiniões diversas, no entanto, são saudáveis para o processo democrático do país e devem acontecer. Sempre falo que o nosso país vai conseguir um caminho mais claro de evolução quando não votarmos em pessoas, mas, sim, em projetos. Como brasileira, torço pela maturidade da democracia no Brasil, para que tudo seja resolvido de maneira democrática e pacífica, como deve ser.
Havia a promessa de muitas privatizações nos últimos quatro anos. O que alterou essa previsão?
As mesmas razões para não termos executado as reformas, aplicam-se também às privatizações. Neste tema, especificamente, adicionaria a preocupação do governo em relação à opinião pública e à possível ampliação da impopularidade do presidente. Fato é que privatização sempre foi um tema pouco popular no Brasil. A cada três brasileiros, dois são contrários. E, na minha concepção, essa impopularidade está muito mais atrelada à desinformação que, de fato, a um posicionamento. O grande erro de todos os governos esteve na comunicação. Abordar o processo de privatização sem exaltar o impacto gerado sobre a capacidade produtiva das empresas e geração de eficiência para economia como um todo abre espaço para argumentos contrários, como “venda do patrimônio do povo”, tomarem força. Quem não quer melhores serviços com preços mais baixos? Empresas mais eficientes, que gerem lucros e emprego? Quando a população entender isso, não tenho dúvida de que iniciativas como essa passarão a ter muito mais apoio. Por isso, na minha opinião, o processo de privatização também se inicia com a educação da população. Obviamente que tudo isso pressupondo um processo transparente, amparado na lei e seguindo os ritos formais e necessários.
O FMI aumentou a previsão de crescimento do Brasil para 2022, mas reduziu para 2023. O que podemos esperar para a economia no ano que vem?
O mercado como um todo tem sido surpreendido com o crescimento do Brasil em 2022, bem acima das projeções iniciais. De maneira geral, três pontos explicam esse movimento. O primeiro: com a reabertura da economia, o setor de serviços recuperou-se mais rápido e mais intensamente do que o previsto inicialmente em função da demanda reprimida maior do que se esperava. O segundo: as exportações têm sido beneficiadas tanto no quantum quanto no preço, afetando positivamente nosso saldo comercial. E terceiro: a política fiscal expansionista por parte do governo vem estimulando o consumo. Foram permitidos saques extraordinários do FGTS e antecipação do 13º salário para aposentados. Recentemente, foi aprovada no Congresso a PEC dos Benefícios, a qual deverá trazer estímulo adicional à economia. O cenário de crescimento para o ano que vem, todavia, aparenta ser ainda mais desafiador. O mundo flerta com uma recessão global que certamente impactará negativamente os preços das commodities.
O impulso visto este ano dado pelas commodities às nossas exportações certamente será menor ou mesmo negativo em 2023. Do lado fiscal, o espaço para novos programas de renda ou estímulos ao consumo estarão limitados, com menor orçamento. As despesas adiadas nos últimos anos deverão afetar as contas públicas em 2023, como o aumento dos servidores públicos. Adicionalmente, os efeitos defasados da política monetária e os impactos do aumento dos juros reais impactando a atividade se farão presentes mais intensamente no início do próximo ano.
Bolsonaro e Lula já falaram abertamente da possibilidade de alterar o teto fiscal em 2023. Qual seria o impacto dessa revisão?
A rigidez das regras fiscais imposta pela PEC do Teto já vinha sendo questionada havia algum tempo. É verdade que o processo eleitoral em sincronia com a surpresa no valor a pagar dos precatórios anteciparam sua revisão. Esperamos que, independentemente do candidato, algum tipo de mecanismo de controle de gastos públicos deva ser proposto. Algo no sentido de meta de superávit primário poderá ser uma alternativa. O ponto é que, por experiência, tanto Lula quanto Bolsonaro, mesmo que intuitivamente, sabem que o descontrole das contas públicas pressiona os juros e coloca a dívida interna em uma trajetória de crescimento em relação ao PIB incompatível com um ambiente de estabilidade econômica. Mais gastos, mais juros, mais dívida pública, menor crescimento da economia, menor fluxo de investimentos, menor criação de empregos, menor aprovação do governo, maior risco político. Acreditamos que os dois candidatos, mesmo com ideologias políticas distintas, terão por necessidade seguir uma linha mais pragmática, mirando o mínimo de responsabilidade fiscal, pois do contrário há um forte risco de cairmos em uma espiral nociva ao Brasil, gerando possíveis reflexos na popularidade e, por consequência, uma pressão no governo.