Aprovações da reforma tributária e do voto de qualidade do Carf na Câmara são sinalizações positivas para a economia brasileira. (Moment/Getty Images)
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Publicado em 12 de julho de 2023 às 09h00.
Última atualização em 12 de julho de 2023 às 12h45.
Por Mariam Dayoub*
O ano de 2023 começou nublado. As incertezas e os riscos eram elevados; as promessas políticas sobre a aprovação de reformas, duvidosas. A desconfiança e o ceticismo permeavam as análises sobre as perspectivas para o País. Porém, as surpresas ao longo do primeiro semestre foram, no geral, positivas, levando a revisões passíveis de serem caracterizadas como goldilocks, ou seja, uma economia em pleno emprego, com expansão da atividade, moderação da inflação e estabilidade macroeconômica.
Nas últimas semanas, ademais, três avanços merecem destaque:
a) Na reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) de 29 de junho, momento temido pelos analistas ao longo do primeiro semestre, a decisão foi um primor: meta para a inflação contínua e permanente em 3%, com uma banda de variação de 1,5 ponto percentual (p.p.). Aperfeiçoou-se o regime de metas, eliminando incertezas com relação ao seu valor em horizontes mais longos.
b) O esforço conjunto da Câmara dos Deputados, liderada com uma maestria política que há tempos não se via pelo presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-AL), pelo governo federal, com destaque para os esforços do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pelo secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, e por entes subnacionais, destacando-se o papel conciliador do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para a aprovação histórica da reforma tributária.
É sabido que o País tem um dos sistemas tributários mais complexos do mundo, que prejudica seu ambiente de negócios. A aglutinação de forças políticas e econômicas para, após mais de 30 anos, aprovar a reforma tributária na Câmara é um divisor de águas que conduzirá a reduções do custo de conformidade tributária, do custo dos investimentos e do litígio tributário, mas ao aumento da competitividade e à correção de distorções alocativas. Isso levará a ganhos de eficiência e produtividade a serem auferidos ao longo das próximas décadas.
Appy, por exemplo, em sua jornada para amadurecer a reforma perante a sociedade, enfatizava que sua aprovação aumentaria o Produto Interno Bruto (PIB) potencial em ao menos 10% ao longo de uma década. Já o estudo de João Maria de Oliveira, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado em 6 de julho, encontrou que, ao final do período de transição (2036), o PIB crescerá 5,75% a mais em comparação com o cenário sem reforma.
c) A votação simbólica do Projeto de Lei 2.384/23, do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) na Câmara, embora não concluída, foi importante para dirimir incertezas sobre o cumprimento da meta fiscal em 2024. Conforme anunciado pelo ministro Haddad em 12 de janeiro, o retorno do voto de qualidade tem potencial de elevar as receitas fiscais significativamente, reduzindo a incerteza sobre o cumprimento da meta de resultado primário. O governo estima que, desde o fim do tal voto em 2020, o impacto aos cofres públicos foi de R$ 59 bilhões.
A votação do arcabouço fiscal, que voltou para a Câmara após alterações no Senado, ficou para agosto. Porém, não são esperadas mudanças que impactem a trajetória das contas públicas de forma significativa e levem à reprecificação dos preços dos ativos.
Desta forma, as perspectivas para a economia, os investimentos e as contas públicas neste segundo semestre se tornaram mais claras e positivas. No curto prazo, essa confluência de fatores deve dar mais confiança ao Banco Central para embarcar em um processo de distensão da política monetária. No médio e no longo prazos, o foco é nos impactos dessas mudanças no potencial de crescimento da economia. Ressalta-se que, tudo o mais constante, o aumento de 1 p.p. em tal crescimento seria suficiente para equilibrar a relação dívida-PIB ao longo do tempo.
O pragmatismo e a confluência de lideranças públicas e privadas no encaminhamento de uma agenda econômica reformista podem, sim, mudar nossa economia e nossa trajetória fiscal de patamar. É com mais otimismo e menos incertezas que o segundo semestre se inicia.
*CFA charterholder e mestre em Administração Pública pela Universidade de Columbia