Dilma Rousseff condecora Eduardo Cunha durante cerimônia comemorativa do Dia do Exército (Roberto Stuckert Filho/PR)
João Pedro Caleiro
Publicado em 23 de setembro de 2015 às 12h44.
São Paulo - A volta da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) é a principal aposta do governo para aliviar a situação fiscal.
No começo da semana passada, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, e da Fazenda, Joaquim Levy, anunciaram um pacote de corte de gastos e aumento de receita.
O objetivo é fazer com que o Orçamento de 2016 passe de um déficit - de R$ 30,5 bilhões, ou 0,5% do PIB - para um superávit - de R$ 34,4 bilhões, ou 0,7% do PIB.
A apresentação de um Orçamento deficitário, inédita desde a entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal em 2000, foi um dos motivos que fizeram a Standard & Poor's retirar do Brasil o grau de investimento.
Ontem, o governo enviou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que recria a CPMF com alíquota de 0,20% sobre todas as transações bancárias.
Segundo o ministro Levy, a vigência seria de 4 anos com objetivo exclusivo de financiar a Previdência Social e arrecadação prevista de R$ 32 bilhões só em 2016.
Quando a CPMF entrou em vigor em 1997, a alíquota inicial era de 0,25%, elevada para 0,38% em 2002. A destinação, inicialmente para saúde, passou a incluir também Previdência e combate à pobreza.
Como diz o nome, ela era para ser provisória mas foi prorrogada 4 vezes antes de ser extinta em 2007, em uma das maiores derrotas políticas do governo Lula.
Os críticos notam que a CPMF é um imposto em cascata, já que incide sobre todas as transações envolvidas em um produto, e que também causa alta de preços e inibição de investimentos e da circulação de dinheiro.
Como a alíquota é fixa, o peso cai desproporcionalmente sobre os mais pobres (o que é predominante no sistema tributário brasileiro). A vantagem para o governo é que a CPMF é simples, rápida de cobrar e difícil de sonegar.
O xis da questão é como garantir superávit dentro de um Orçamento rígido. 90% das despesas são obrigatórias, com foco em Previdência e pessoal e tendência de crescimento vegetativo acima do PIB, o que só será contido com reformas politicamente difíceis.
Historicamente, o gasto foi ficando cada vez mais amarrado e os ajustes fiscais de curto prazo cada vez mais dependentes de uma combinação tóxica de corte de investimento e alta de imposto - especialmente quando a arrecadação desaba como na atual recessão.
O país cansou desta dinâmica, mas isso não significa que encontrou uma alternativa para fechar as contas, e não dá para fingir que cortar ministérios vai ajudar muito.
A ideia de ressuscitar a CPMF começou no final de agosto, causou atrito com o vice-presidente Michel Temer, foi abandonada e retornou no espaço de poucas semanas. Veja como está a disputa no momento:
A FAVOR
Luiz Fernando Pezão, governador do Rio de Janeiro pelo PMDB, e outros governadores
Na semana passada, governadores da base aliada foram ao Congresso para fazer um apelo pela CPMF, movimento incentivado pelo Planalto.
São eles Rui Costa (governador da Bahia pelo PT), Waldez Góes (PDT/Amapá), Camilo Santana (PT/Ceará), Renan Filho (PMDB/Alagoas), Belivaldo Chagas (vice-governador em exercício, Sergipe), Marcelo Miranda (PMDB/Tocantins), Wellington Dias (PT/Piauí) e Nazareth Araújo (vice-governadora do Acre pelo PT).
Os estados também têm dificuldade para fechar as contas da Previdência e querem um aumento da alíquota de 0,20% para 0,38% - a diferença seria compartilhada com eles.
O governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (PMDB), diz que a discussão conta com apoio de 23 governadores. 5 dos 6 governadores do PSDB se reuniram ontem e não chegaram a um consenso sobre o tema.
José Ivo Sartori (PMDB/Rio Grande do Sul) já se manifestou a favor e Geraldo Alckmin (PSDB/São Paulo) e Raimundo Colombo (PSD/Santa Catarina) já se manifestaram contra.
Partido dos Trabalhadores (PT), incluindo o ex-presidente Lula
No fim do mês passado, o ex-presidente Lula disse que o imposto nunca deveria ter acabado. O Partido dos Trabalhadores (PT) já cerrou fileiras em resolução do partido e manifestações de ministros e congressistas (o que nem sempre acontece quando o assunto é ajuste fiscal).
"É muito pouco o que estamos pedindo para a sociedade, principalmente para aqueles que acumulam volumes altos de movimentações financeiras", disse José Guimarães, líder do governo na Câmara.
Mauro Leos, responsável pela classificação da América Latina na agência de classificação de risco Moody's
Em evento da Americas Society-Council of Americas, em Nova York, nesta terça-feira, Leos disse que o novo imposto pode não ser a solução mais eficiente, mas parece ser a única: "É difícil ver o Orçamento sem CPMF."
O Brasil já perdeu o grau de investimento pela S&P e está no limite da nota na Moody's. Muitos fundos exigem o selo de bom pagador de pelo menos duas das três grandes agências para alocarem seus recursos.
"A aprovação ou não [da CPMF] seria um indicativo de quão forte ou quão fraca é a habilidade do governo de alcançar consenso. Não acho que por causa disso mudaríamos o rating, mas levaríamos em consideração em termos de análise", disse Leos.
Federação Brasileira de Bancos (Febraban)
A Federação disse em nota que "[a CPMF], tendo em vista sua ampla cobertura, menor impacto inflacionário, simplicidade e maior rapidez de implantação em relação a outros tributos, facilita o reequilíbrio das contas públicas, enquanto o governo elabora medidas estruturais de adequação das despesas".
CONTRA
Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp)
Na calçada da Avenida Paulista nesta segunda-feira, Paulo Skaf lançou uma campanha contra o aumento de impostos ao lado de um pato gigante, referência ao slogan #naovoupagaropato.
Elee disse que o ajuste fiscal deve ser feito apenas pelo gasto: "A sociedade já disse 'não' à CPMF. O que a sociedade quer é que o governo reduza os seus gastos, melhore a sua gestão, acabe com os desperdícios, acabe com a corrupção".
Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados
Na semana passada, Cunha disse que a proposta da CPMF estava "fadada a uma derrota fragorosa". Ontem, disse que quem decide é a Câmara, mas que na sua opinião a chance de aprovação era "zero".
Uma vez apresentada ao Congresso, a PEC da CPMF tem a sua tramitação iniciada na Câmara, onde precisa ser aprovada previamente pela Comissão de Constituição e Justiça. Depois, deve ser analisada por uma comissão especial, com prazo de tramitação próprio, e só então é encaminhada para votação em dois turnos no plenário da Casa. Após todo esse trajeto, a proposta segue para o Senado.
Renan Calheiros, presidente do Senado pelo PMDB, já disse que aumento de imposto o preocupava e era "tiro no pé", mas suavizou sua posição nos últimos dias.
Michel Temer, vice-presidente pelo PMDB
Figura-chave em meio a tensão sobre um possível afastamente da presidente Dilma, Temer foi deixado de fora das primeiras tratativas sobre a volta do imposto e negou apoio à proposta: “O que a sociedade não aplaude é o retorno repentino de um tributo”.
Há uma semana, disse apenas que "vocês conhecem minha posição".
Parlamentares de oposição e da base aliada
Na semana passada, parlamentares do Democratas, PSDB, PP, Solidariedade, PSC, PPS e do PMDB lançaram o movimento "Basta de Imposto. Não à CPMF".
O senador Agripino Maio, do DEM, disse que o novo imposto é “o preço que a sociedade está pagando pela reeleição da presidenta Dilma”. O líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), afirmou que "o aumento de imposto sugerido pelo governo já nasceu morto".
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Confederação Nacional da Indústria (CNI), Confederação Nacional do Transporte (CNT), Confederação Nacional de Saúde (CNS) e Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL)
Em nota conjunta divulgada na última quinta-feira, as entidades dizem que "ao elevar a pressão fiscal sobre os contribuintes com a recriação da CPMF, o governo está transferindo para a sociedade e o setor produtivo o custo do ajuste fiscal."
Representantes do agronegócio
Marcos Montes (PSD-MG), líder da Frente Parlamentar do Agronegócio na Câmara dos Deputados, disse que eles já fecharam oposição à CPMF, mesma posição do presidente da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), Antonio Alvarenga.
O setor preferia que a CPMF fosse acompanhada de um aumento da Cide, imposto da gasolina, que não precisa de aprovação do Congresso e deixa o álcool mais barato em comparação, o que favorece o setor sucroenergético.