FERNANDO VELOSO: este é o momento de pensar em soluções mais duradouras / Divulgação
Letícia Toledo
Publicado em 29 de junho de 2016 às 17h51.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h48.
Dentre todos os fatores que atravancam o crescimento brasileiro, nenhum é tão importante quanto a crise de produtividade, segundo o pesquisador Fernando Veloso, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). Veloso afirma que é preciso corrigi-la já, com reformas nas agências reguladoras, uma nova lei de falências e um choque de governança dos fundos de pensão. Este é o tema do livro “A Crise de Crescimento do Brasil”, lançado em junho por Veloso em parceria com o pesquisador Regis Bonelli e com artigos de economistas convidados. Veloso concedeu a seguinte entrevista a EXAME Hoje.
Em seu livro, o senhor afirma que a crise atual tem um enredo mais preocupante do que a política: a perda de capacidade da economia brasileira, nas últimas décadas, de crescer no ritmo necessário. Como isto aconteceu?
O país está atravessando não só uma crise conjuntural, mas também estrutural. Isso é o que torna a crise atual tão forte. Isso acontece porque a nossa produtividade cresce muito pouco desde os anos 1980. Em algum momento nos anos 2000 a produtividade acelerou, mas por volta de 2011 ela já começou a ficar estacionada e no ano passado caiu quase 4%.
Por que ainda não conseguimos resolver este problema?
Aumentar a produtividade exige um esforço permanente. Nos anos 90 tivemos as privatizações e a criação de agências reguladoras. Em 2000 foi criada a lei de falências. Foram várias medidas que contribuíram para aumentar o crédito no Brasil e aumentar a produtividade. Mas há ainda outros problemas, como a reforma tributária, que é um tema que a gente nunca atacou de frente. Foram feitas tentativas de contornar estes problema, como a criação do Super Simples, mas ficou claro que elas não tiveram o resultado desejado, que era aumentar a produtividade, e acabaram resultando em um ônus fiscal muito grande que contribuiu pro déficit primário. A lei de falências foi criada em 2005 e deveria ser aprimorada.
E o que o atual governo precisa começar a fazer para que a produtividade volte a crescer?
Várias medidas deveriam atuar para reduzir o risco regulatório. Ou seja: o risco de uma empresa investir e se deparar com a intervenção do governo no mercado. O Investimento é sempre algo de longo prazo e as empresas não vão investir se elas não tiverem segurança. Recentemente foi aprovada no Congresso a nova lei das estatais, que ajuda muito. Outra medida que tramita pelo Congresso é a governança nos fundos de pensão, que responsabiliza os dirigentes e reduz o poder de indicações políticas. É preciso também conferir maior autonomia de decisão para as agências reguladoras. Isso sem falar da reforma tributária. Nós temos um sistema tributário muito complexo, com inúmeras regras especiais, que precisa ser simplificado.
A maior parte dessas reformas é considera de difícil aprovação. Como é possível avançar nesta discussão?
De fato são temas difíceis. A questão das agências reguladoras e da reforma tributária já se discutiu muito no país. Os estados, por exemplo, usam o ICMS pra atrair empresas e isso cria uma enorme insegurança e complexidade do sistema. Com uma reforma tributária, alguns estados vão ganhar e outros vão perder receita. Por outro lado, dado que a situação está muito difícil, este é o momento que temos que pensar em soluções mais duradouras, de caráter mais estrutural.
O número de pedidos de falência vem crescendo mês após mês. Se não houver mudanças a lei de falências pode agravar mais a crise do país?
Um aspecto importante dessa lei é conferir maior segurança jurídica para os credores. No caso da telefônica Oi, por exemplo, grande parte da sua dívida não tem garantia real. Ou seja, os credores, tirando o BNDES, pouquíssimos têm garantia de receber o dinheiro de volta. A ideia da lei é justamente permitir que os credores recuperem uma parcela mais elevada possível de seu investimento para que eles tenham incentivo de manter o crédito para as empresas. Mas o que acontece é que, aparentemente, em várias dessas garantias existe uma insegurança e isso leva os bancos a suspender novos empréstimos por medo. Dificulta mpréstimos inclusive para empresas que são saudáveis, mas que precisam de capital para ajeitar a casa em meio à crise. Rediscutir essa lei é uma necessidade nova também, já que os pedidos de recuperação aumentaram muito recentemente. Mas a reforma é importante para evitarmos um desgaste ainda maior na economia.
(Letícia Toledo)