Espanholas Abengoa e Isolux não levaram as obras de Belo Monte adiante por problemas financeiros (Divulgação/Divulgação)
Reuters
Publicado em 4 de julho de 2018 às 17h38.
Última atualização em 4 de julho de 2018 às 17h40.
São Paulo - A hidrelétrica de Belo Monte poderá enfrentar anos consecutivos de perdas milionárias de faturamento devido à falta de capacidade do sistema de transmissão para escoar toda a produção da usina, segundo alegações da Norte Energia, que reúne os sócios do empreendimento.
Orçada em mais de R$ 35 bilhões, a usina no Pará não pode gerar a toda carga no período de chuvas do rio Xingu, onde está instalada, principalmente devido a atrasos na construção de projetos de transmissão atribuídos às espanholas Abengoa e Isolux, que não levaram as obras adiante por problemas financeiros, segundo carta da Norte Energia à Aneel.
A empresa, que tem como sócios a estatal Eletrobras, as elétricas Neoenergia, Light e Cemig e a mineradora Vale, além de fundos de pensão, disse ao órgão regulador que a situação "impõe prejuízo de centenas de milhões de reais por ano" e gera "grave ineficiência e destruição de valor" para o empreendimento.
O leilão da concessão para a construção de Belo Monte foi realizado em 2010 e vencido pela Norte Energia após a empresa se comprometer a vender a futura produção a um preço na época de 78 reais por megawatt-hora, um dos mais baixos já vistos em licitações para projetos de energia no Brasil.
A Norte Energia agora alega que esse lance agressivo no leilão só foi possível porque a empresa contava que não teria restrições à produção ou que, se houvessem, seria compensada por isso.
A empresa pede que a Aneel adote instrumentos regulatórios "que assegurem não somente a compensação econômico-financeira" pelas restrições, "como também a prevenção para que não continuem ou se repitam", principalmente porque ela estima que o sistema de transmissão só terá capacidade para escoar a produção da usina sem problemas após 2023.
"Essa grave restrição de transmissão impõe e imporá inúmeros e pesadíssimos ônus a esta Norte Energia, implicando em grave desnaturação das características originalmente estabelecidas para a operação da UHE Belo Monte", escreveu a empresa.
Procurada, a Norte Energia não comentou o conteúdo dos documentos enviados à Aneel. A agência não respondeu um pedido de comentário sobre o caso.
A construção de Belo Monte, que envia energia do Norte para o Sudeste do país, onde se concentra o consumo, partiu do princípio de que a produção seria escoada por três linhas, duas delas em ultra-alta tensão, e por reforços no sistema que seriam realizados por Abengoa e Isolux.
Mas, como as espanholas não concluíram suas obras, há uma limitação não prevista originalmente para a produção da usina, segundo a Norte Energia, o que gera impacto principalmente na época de cheias do Xingu.
A empresa estima que conseguiu despachar apenas 5 mil megawatts no período de chuvas deste ano, contra 7,65 mil megawatts previstos antes.
Mesmo quando o último linhão de transmissão associado a Belo Monte entrar em operação, o que é previsto para dezembro de 2019, a limitação continuaria, e a hidrelétrica poderia entregar um máximo de cerca de 9 gigawatts, contra 11,2 gigawatts de sua capacidade máxima, disse a Norte Energia.
O problema, embora limitado a uma época do ano, é crucial para Belo Monte, uma usina desenhada desde o início para produzir com força total no período de chuvas da região Norte, uma vez que as características da região implicam em uma geração muito baixa no restante do ano.
"No segundo semestre, Belo Monte tem uma 'secura' total, tem risco até de não gerar nada. Ela é muito sazonal. Ela tem capacidade de gerar até a potência toda no primeiro semestre e no segundo praticamente não gera nada", disse à Reuters uma fonte com conhecimento da estratégia de Belo Monte.