Vista do Congresso, em Brasília: PL que isenta IR pode ser votado nesta semana com trecho que tributa dividendos ao exterior — e pode diminuir apetite de investidores estrangeiros (Leandro Fonseca/Exame)
Editor de Macroeconomia
Publicado em 15 de julho de 2025 às 15h04.
Parte do setor produtivo demonstra grande preocupação com um item do projeto de lei que amplia a isenção do Imposto de Renda (IR), cujo relatório foi apresentado na semana passada pelo deputado federal Arthur Lira (PP-AL): a tributação de 10% dos dividendos de empresas e pessoas físicas que fazem remessas ao exterior.
Nesse grupo se enquadram multinacionais e empresas estrangeiras com investimentos no Brasil que, na prática, poderiam pagar mais impostos caso o PL seja aprovado da forma como está. A proposta pode ser votada na comissão especial que trata do tema — e no plenário da Câmara — nesta quarta-feira, 16.
"Há um problema e um grande risco no texto: a criação de um tributo novo sobre dividendos de investidores estrangeiros", diz Pablo Cesário, presidente-executivo da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca).
No Brasil, as empresas precisam pagar o Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ), em média de 25%, e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), em média de 9%. Essa carga tributária média é de 34% — sem levar em conta benefícios fiscais diversos que possam diminuir a chamada alíquota efetiva.
Além da IRPJ e CSLL, o texto prevê 10% de tributos para os dividendos que sejam remetidos ao exterior.
Segundo Cesário, a proposta original do governo criou um mecanismo para garantir que a tributação não superasse os 34% de carga tributária total. "Mas o relatório tirou isso. Então, o que nós temos neste momento, apesar das indicações em contrário, é que se criou uma alíquota adicional de 10% sobre tributos de renda para investidores estrangeiros", afirma.
"Isso é muito relevante na medida que, na ausência de poupança interna, os investimentos estrangeiros são o motor da economia brasileira."De acordo com o presidente-executivo da Abrasca, 59% dos recursos na bolsa brasileira são estrangeiros e há muitos investimentos estrangeiros diretos em companhias que não passam por bolsa.
"Há uma grande preocupação. Houve um aumento da entrada de investimentos estrangeiros esse ano de R$ 26 bilhões na bolsa. O Brasil tem conseguido captar recursos de investimentos no exterior, tem sido um dos campeões nisso, mas o aumento de tributação ameaça essa tendência", afirma Cesário.
Para ele, é preciso alertar as companhias e os investidores de que essa nova tributação é um aumento de carga tributária sobre as empresas. "E vai no sentido contrário de competitividade global, de reduzir as alíquotas corporativas. Isso deve, sim, ter um impacto na decisão de investimento de investidores estrangeiros", afirma.
Em geral, empresas que fazem remessa ao exterior obedecem a tratados cujos métodos visam evitar bitributação nos países envolvidos. Há duas formas de se fazer isso. A primeira é a isenção ou cobrança parcial do imposto de dividendos vindos, ou remetidos, ao exterior. Outra forma é o país do investidor cobrar imposto, mas permitir descontar o que já foi pago no Brasil — em sistema de crédito.
Segundo Gustavo Haddad, sócio do Lefosse Advogados, os impactos serão variados para empresas de diferentes países. Em primeiro lugar, aponta, o argumento do governo de que seria possível "creditar" a tributação em outros países não é necessariamente verdadeiro.
Um levantamento feito pelo Lefosse mostra efeitos distintos para três grupos de países. Na Europa continental, nações como Alemanha, França, Espanha e Reino Unido, não oferecem crédito do imposto brasileiro porque não tributam dividendos recebidos de subsidiárias no exterior — conhecido como princípio de territorialidade.
"Para esse primeiro grupo, o imposto de 10% vai ser um custo adicional para o investidor não residente", diz Haddad.
Outro grupo, de países em desenvolvimento como China, Índia, Coréia e Argentina, há tributação de dividendos recebidos do exterior e o "crédito" pode ser pedido.
"Para esse grupo de países, e vários desses países têm tratado para evitar a tributação com o Brasil, será possível creditar o imposto brasileiro. Mas tem que lembrar que é sempre até o limite do imposto incidente no país de origem", diz. "Ou seja, vai depender muito da situação concreta de cada empresa investidora ou de cada investidor."
Outro caso é o dos Estados Unidos, que representam mais de 20% dos investimentos estrangeiros. Segundo Haddad, do Lefosse, o país adota desde 2017 um regime misto — que segue o princípio da territorialidade mista.
"Nesse caso, vai depender muito da situação da subsidiária brasileira e da investidora americana. Em alguns casos, vai poder tomar um 'pedaço' do crédito do imposto brasileiro. Mas em muitos casos não poderá", afirma Haddad.
"Tenho clientes multinacionais americanas que, pela regra americana, não se tributa o lucro da subsidiária brasileira porque tem uma exceção nos EUA. Tenho sentido uma preocupação das multinacionais americanas com essa incidência dos 10% de imposto, porque efetivamente isso vai reduzir o montante líquido de lucro que a multinacional americana vai receber."