Economia

Taxar seguro-desemprego para bancar programa é "tirar leite de vaca magra"

Programa Verde Amarelo promove desoneração da folha para quem contratar jovens, financiado por taxa de 7,5% sobre quem recebe seguro-desemprego

Desempregados: previsão do governo é que a medida gere um saldo líquido de 1,8 milhão de novos postos de trabalho até 2022, número visto com desconfiança. (Rich Press/Bloomberg)

Desempregados: previsão do governo é que a medida gere um saldo líquido de 1,8 milhão de novos postos de trabalho até 2022, número visto com desconfiança. (Rich Press/Bloomberg)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 12 de novembro de 2019 às 17h42.

Última atualização em 26 de novembro de 2019 às 10h02.

São Paulo — O programa Verde Amarelo, criado via Medida Provisória (MP) pelo governo federal nesta segunda-feira (11) para estimular a contratação de jovens entre 18 e 29 anos que nunca tiveram emprego formal, foi visto com ceticismo por economistas ouvidos por EXAME.

A visão geral é que o programa pode ter um impacto positivo, mas limitado, para estimular a contratação deste contingente, que tem o dobro da taxa de desemprego da população como um todo.

Uma das críticas, destacadas com ironia por políticos da oposição nas redes sociais, é que o financiamento do programa será feito através de uma nova taxação de 7,5% dos trabalhadores que recebem seguro-desemprego. O período também passa a contar para cálculo da aposentadoria.

"É uma péssima ideia, pois essa população já está em situação de vulnerabilidade social e com baixo rendimento. É como tirar leite de vaca magra", diz Daniel Duque, pesquisador da Escola Brasileira de Economia e Finanças (EPGE), da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

A expectativa é que a arrecadação com essa medida seja na faixa de R$ 11 bilhões em 5 anos, o que seria suficiente para compensar as medidas de desoneração para quem contratar o jovem.

A contribuição para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) cairá de 8% para 2%, e o valor da multa poderá ser reduzido de 40% para 20%, decidida em comum acordo entre o empregado e o empregador.

Os empregadores também não precisarão pagar a contribuição patronal para o Instituto Nacional do Seguro Social (de 20% sobre a folha), as alíquotas do Sistema S e do salário-educação. As medidas valem para novos contratos até 2022.

"É uma tentativa torta de fazer a coisa neutra do ponto de vista fiscal, que força um efeito redistributivo", disse Gabriel Ulyssea, professor-assistente de Economia na Universidade de Oxford e especialista em trabalho.

A visão não é consensual. O economista Marcelo Neri, da FGV Social, diz que é preciso acompanhar os dados e vê o teste como válido, já que o programa é temporário: "É um cobertor curto, o que significa que precisa tirar de algum lugar que, no caso, é o seguro-desemprego."

Ele diz que a medida vai na direção certa, já que o Brasil está precisando de um empurrão no mercado e os jovens é um bom lugar pra começar. "Esse grupo perdeu muito nos últimos anos e é o futuro do país"

Para além das boas intenções, a dúvida é se o programa terá efetividade. A previsão do governo é que a medida gere um saldo líquido de 1,8 milhão de novos postos de trabalho até 2022, número visto com desconfiança.

"Tipicamente essas políticas têm algum efeito sobre o emprego, mas não muito forte, e assim que o beneficio acaba o efeito desaparece", diz Ulyssea.

Marcos Lisboa, presidente do Insper, nota que a história mostra que, de forma geral, políticas de intervenção no mercado de trabalho que visam um objetivo único não são muito eficazes. "É muito caro do ponto de vista do bem-estar social para pouco resultado", diz.

Um estudo publicado em 2017 pelo economista David Mckenzie, do Banco Mundial, que avaliou várias intervenções similares em outros países, encontrou pouco impacto sobre empregos e salários.

A questão-chave é se os encargos trabalhistas atacados pelo governo operam, no momento, como um dos principais obstáculos para a contratação.

Ulyssea diz que a questão principal da empregabilidade do jovem, aqui e no resto do mundo, é que ele não tem referências anteriores para poder provar a sua qualidade, o que deixaria o empregador hesitante em contratar.

No entanto, esse problema já teria sido atacado pelas novas modalidades de contrato temporário e intermitente da reforma trabalhista. Além disso, o mercado de trabalho brasileiro tem um problema estrutural de falta de demanda devido ao baixo crescimento.

Lisboa lembra do fracassado "Meu Primeiro Emprego" que a ex-presidente Dilma lançou em 2016, no auge da crise. "Um empresa que está com seu quadro completo não vai contratar mais pessoas por conta dessa medida. Elas não criam emprego do nada. O emprego vem quando a economia está crescendo. Não tem mágica", diz Lisboa.

A política correta nesse sentido deve mirar no longo prazo, segundo ele. "O jovem é pouco produtivo no Brasil, porque aprende pouco na escola", diz.

Para Duque, a ideia do governo pode ainda afetar negativamente a produtividade do Brasil — já bastante baixa — no curto prazo, à medida que pode incentivar uma maior contratação de jovens em detrimento de trabalhadores mais velhos.

O risco é mitigado por algumas restrições: a nova forma de contratação está limitada a 20% do total de empregados e vale só para contratos de remuneração até o teto de 1,5 salário mínimo.

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