Energia: até 2034, a previsão é somar ao menos R$ 597 bilhões em investimentos em novas plantas de geração e redes de distribuição (Adobe Stock)
Agência de notícias
Publicado em 31 de julho de 2025 às 07h02.
Última atualização em 31 de julho de 2025 às 14h40.
Apontado como protagonista na transição energética global, o Brasil verá sua matriz elétrica ganhar, nos próximos anos, um cardápio ainda mais variado de fontes renováveis. Parques solares, eólicos e usinas de biomassa a partir da cana-de-açúcar vão dividir o protagonismo com a chegada de projetos de hidrogênio e baterias de armazenamento de energia.
Até 2034, a previsão é somar ao menos R$ 597 bilhões em investimentos em novas plantas de geração e redes de distribuição, segundo projeções da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME).
E o Brasil vai chegar ao fim desta década com uma mudança na composição de energia verde em projetos de geração, reduzindo a fatia hoje dominante de hidrelétricas. Dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) indicam que as fontes eólica, solar e de biomassa vão subir dos atuais 41,4% do total da capacidade instalada para 41,7% até 2029, ultrapassando a geração hidráulica, que vai recuar de 44,8% para 40,4% nesse mesmo período.
O avanço das renováveis será puxado principalmente pelos projetos solares, com grandes parques e o uso de placas nos telhados das casas, a chamada microgeração distribuída, segundo o ONS. Para especialistas, porém, a expansão renovável traz desafios para a resiliência das operações, já que, quando não há sol, o sistema precisa recorrer a usinas hidrelétricas e termelétricas a gás para garantir segurança energética, sobretudo nos momentos de pico de consumo, no início da noite.
No ano em que o Brasil vai sediar a COP30, em Belém, a EPE destaca que a matriz energética renovável representa “um ativo para atração de investimentos”, com oportunidades de captação internacional diante de companhias de olho na redução da pegada de carbono.
Do investimento total previsto no país, a geração centralizada (hidrelétricas, parques solares e eólicos e pequenas centrais hidrelétricas) vai somar R$ 352 bilhões, seguida de R$ 117 bilhões em projetos de geração distribuída, como a solar nos telhados e de biomassa, além de R$ 129 bilhões em transmissão.
Crescem também os projetos de armazenamento de energia através de baterias — que devem ganhar um leilão específico este ano e hoje são um dos principais focos de interesse das empresas —, além da eólica em alto-mar. Em outra frente, o hidrogênio vem ganhando força para gerar energia a partir de fontes solar e eólica, de acordo com especialistas.
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— As hidrelétricas sempre foram nossa grande bateria e continuam sendo fundamentais, mas têm cada vez uma participação menor pela complexidade de implantação de projetos — diz Filipe Bonaldo, head A&M Infra no Brasil.
— Além de solar e eólica, as baterias são fundamentais e vão fazer cada vez mais parte do sistema. O hidrogênio virá mais a longo prazo, porque a tecnologia é ainda pouco conhecida e o custo de aquisição é alto.
Esse salto dialoga com a previsão de crescimento de consumo de energia esperado para os próximos anos. O ONS estima avanço da carga de energia de 14,1% para os próximos cinco anos. Já a EPE prevê que a população brasileira deverá crescer a uma taxa média anual de 0,3% ao longo da próxima década, enquanto o número de domicílios subirá 1,2% ao ano, aumentando a demanda por energia. A projeção é de crescimento médio anual do PIB de 2,8% até 2035, diz o MME.
O diretor de Planejamento do ONS, Alexandre Zuracato, ressalta que, com a crescente participação de fontes renováveis no atendimento ao Sistema Interligado Nacional (SIN), é importante seguir com a agenda de leilões de energia, sobretudo para atender a momentos de maior consumo.
Em janeiro e fevereiro, houve cinco recordes de consumo de energia. Com o maior uso de fontes intermitentes, como solar e eólica, a previsão é que já neste ano pode haver momentos de déficit de potência. É que no fim da tarde, período de alto consumo, a geração solar recua.
— Com relação ao atendimento de potência (para picos de consumo), os resultados mostram um aprofundamento do déficit estrutural para atendimento ao requisito de potência. A recomendação é que sejam feitos leilões anuais para contratar recursos para aumentar a oferta do atributo potência — afirma Zucarato.
Assim, as empresas buscam diversificar fontes. A Enel aposta cada vez mais em projetos de geração por meio da Enel Green Power, seu braço de geração renovável. Desde 2019, a companhia mais do que dobrou sua capacidade instalada no país, passando de 3,3 gigawatts (GW) para mais de 6,6 GW. Deste total, mais de 3,5 GW são eólicos, além de 1,8 GW de fonte solar e cerca de 1,3 GW de hidrelétrica.
Recentemente, a Enel iniciou a operação de dois parques eólicos na Bahia e de um solar em Minas Gerais, o primeiro no Sudeste.
Outra gigante ampliando investimentos é a Eletrobras. Segundo Robson Campos, vice-presidente de Engenharia de Expansão da empresa, o foco é crescer em fontes renováveis e na descarbonização do portfólio. Hoje, soma mais de 44 GW de capacidade instalada, sendo mais de 97% oriundos de fontes limpas.
— Avançamos no desinvestimento em térmicas. Ao mesmo tempo, entregamos o Parque Eólico Coxilha Negra (RS), com R$ 2,4 bilhões em investimentos. Estamos conduzindo o maior programa de modernização de ativos de geração da nossa história. (A hidrelétrica de) Tucuruí (TO) conta com investimentos de R$ 1,25 bilhão até 2029. Nas usinas do Rio São Francisco, os aportes são superiores a R$ 2 bilhões.
A Eletrobras investe ainda em transmissão. Serão, diz Campos, R$ 6,7 bilhões destinados à construção de sete novas subestações e 19 linhas, ampliando o portfólio em mais de 2 mil quilômetros até 2027. Do total de novas linhas, 18 estão sendo implantadas no Nordeste, região estratégica para a geração de renováveis e que tem papel fundamental no envio de energia para outras regiões do país por meio do SIN, afirma ele.
O Complexo Ventos de Santa Eugênia, maior projeto da empresa fora da Europa, já opera com 14 parques eólicos e 91 aerogeradores. sendo ampliado com a adição de usinas solares e um sistema de armazenamento de baterias. Além disso, o Complexo Eólico Brotas de Macaúbas, localizado no mesmo estado, está recebendo a instalação de uma planta solar.
— Só na Bahia, os investimentos ultrapassaram R$ 3,3 bilhões. O Brasil é um país prioritário para a transição energética global. Suas condições naturais e estruturais o colocam em posição estratégica para liderar o avanço das fontes renováveis nas próximas décadas — diz Diogo Scussel, vice-presidente de Operações Estratégicas da companhia.
Para ele, o armazenamento de energia em baterias será cada vez mais importante para garantir a eficiência e a flexibilidade do sistema elétrico brasileiro, porque permitem armazenar energia excedente gerada durante o dia e liberá-la nos horários de maior demanda, como o fim da tarde, quando a geração solar naturalmente cai.
A Acelen, controlada pela Mubadala Capital, do fundo soberano dos Emirados Árabes, dona da refinaria da Bahia, firmou uma joint-venture com Perfin e Illian para construir um parque solar em João Dourado (BA). No total, foram investidos R$ 530 milhões, conta Luiz de Mendonça, CEO da companhia.
O executivo aponta desafios. É que embora o governo venha implementando arcabouço regulatório, as matrizes energéticas renováveis precisam de cenário previsível e estável para que os investimentos sejam feitos, argumenta:
— O Brasil tem avançado nisso, como a Lei do Combustível do Futuro, importante para a descarbonização do setor aéreo nacional, além de incentivar a pesquisa, produção, comercialização e o uso do combustível sustentável de aviação (SAF), a criação do Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten) e da Lei do Mercado de Carbono.
Bruna Correia, sócia de Energia do BMA, ressalta a importância da produção de hidrogênio verde, oportunidade estratégica para armazenar o excedente de energia renovável e atender a setores de difícil eletrificação, como transporte pesado e indústrias.
— Projetos como o hub de Pecém, no Ceará, são exemplos de como o Brasil pode se consolidar como um exportador relevante de hidrogênio para mercados globais. Já o uso de baterias e outras tecnologias de armazenamento de energia pode ser a chave para assegurar uma oferta contínua e confiável — diz.
— Esses avanços ainda enfrentam barreiras significativas, como altos custos, ausência de regulação específica e limitações na infraestrutura, o que exige políticas públicas claras para escalabilidade e atração de investimentos.