Economia

Sem ajuste fiscal, Selic vai a dois dígitos, diz Delfim

Para Delfim, a presidente Dilma Rousseff deveria buscar o déficit nominal zero


	"Tem de esquecer o superávit primário. Temos de ir para o déficit nominal zero. O que interessa é o déficit fiscal", diz Delfim
 (Carol do Valle /VEJA)

"Tem de esquecer o superávit primário. Temos de ir para o déficit nominal zero. O que interessa é o déficit fiscal", diz Delfim (Carol do Valle /VEJA)

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Da Redação

Publicado em 13 de junho de 2013 às 07h48.

São Paulo - O Banco Central (BC) terá de elevar os juros para uma taxa de dois dígitos para combater a inflação, caso o governo não contribua com um ajuste fiscal (redução de gastos públicos), afirmou o ex-ministro da Fazenda e do Planejamento Antônio Delfim Netto. "Se deixar tudo na mão do BC e se ele for cumprir o seu papel, isso vai gerar uma recessão muito mais profunda do que em qualquer outra condição", disse.

Para Delfim, a presidente Dilma Rousseff deveria buscar o déficit nominal zero (ou seja, uma economia suficiente para pagar todas as despesas do governo, incluindo os juros da dívida), pois um controle rigoroso das contas públicas é fundamental para restaurar a credibilidade da política econômica. Essa estratégia, avalia, contribuiria para reduzir os juros futuros e estimularia os investimentos.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Por que o sr. defende uma política fiscal austera e déficit nominal zero?

Porque só a política monetária (taxa de juros) é incapaz de controlar essa inflação. Os juros sozinhos impõem um custo social gigantesco, muito maior que o necessário. Mas o governo está mudando. Ele deixou o dólar flutuar um pouco mais, acabou aceitando a ideia de que precisa de uma política monetária um pouco mais ativa. Falta um complemento fundamental que é uma mudança radical no entendimento da economia brasileira.

Há muitas críticas de economistas que acreditam que o governo vai gerar um superávit primário (economia para pagamento dos juros da dívida pública) menor que 2% do PIB neste ano.

Tem de esquecer o superávit primário. Temos de ir para o déficit nominal zero. O que interessa é o déficit fiscal.

O que ocorreria se a presidente Dilma Rousseff anunciasse agora que vai buscar o déficit nominal zero?

Se ela disser "eu vou buscar o déficit nominal zero nos próximos três anos", o efeito ocorre hoje, pois ela tem credibilidade. E estamos nas vésperas de recuperar a credibilidade. Está na mão dela fazer isso. O governo precisa fazer com que todos os gastos avancem menos que o PIB, sobretudo despesas correntes. Graças aos enormes truques contábeis, ninguém mais acredita em nada. A tal quadrangulação fiscal realizada no fim do ano foi a gota que derrubou a água do copo.

E isso melhoraria o sentimento dos empresários para investir e rebaixaria os juros futuros?

E criaria também um ambiente favorável para as novas concessões públicas, como estradas, aeroportos, ferrovias. A presidente é uma mulher inteligente, preparada e pragmática. Tudo o que ela fez está correto. A forma de fazer você pode discutir. Ela agiu bem na mudança das regras da poupança, na desoneração de impostos federais da folha de pagamento, no acordo do aumento salarial do serviço público. Só que na execução tem muito atrito. Daqui a dois anos tudo isso estará no lugar certo e vai ajudar o crescimento.


A adoção do déficit nominal zero pode ocorrer no curto prazo?

Sim. O mercado tem a percepção de que a situação fiscal no Brasil é uma esculhambação. Há uma crença no mercado, que não é a minha opinião, de que o governo já não sabe mais qual é o déficit público que está criando. Para o mercado, o governo faz tanto truque, mexe com tanta coisa, que não tem mais credibilidade. É preciso encontrar um caminho claro e transparente que não tenha mais truque.

Essa percepção ruim sobre a política fiscal colaborou para que a Standard & Poor’s mudasse a perspectiva do Brasil de estável para negativa.

A decisão da Standard & Poor’s reflete esse pensamento do mercado, que é exagerado. O governo mexeu tanto que as pessoas adquiriram uma percepção de que o sistema está caminhando mal. Não adianta insistir que a situação não é essa, pois as pessoas respondem à situação na qual elas acreditam.

Por que o BC aumentou o ritmo da alta de juros pela primeira vez no governo Dilma?

O BC adotou essa postura para cortar a demanda mesmo. Mas vai cortar a demanda privada, quando o que tem de ocorrer é a redução da demanda pública. E, na medida em que isso não acontece, sobe o custo da dívida, que eleva o déficit público. A solução para o problema é fiscal. O Tombini vai aumentar os juros para onde eles terão de ir. Só que, se tiver que subir os juros sem o ajuste fiscal, a Selic vai aumentar para dois dígitos, seguramente. Se deixar tudo na mão do BC, e se ele for cumprir o seu papel, isso vai gerar uma recessão muito mais profunda do que em qualquer outra condição.

Nesse contexto, o crescimento do País de 2,5% neste ano estará de bom tamanho?

Eu acho que deve ser por aí mesmo. Mas o ano não está acabado.

O BC disse na ata da última reunião do Copom que o caminho do dólar é de fortalecimento. O sr. Concorda?

É de fortalecimento mesmo, o que tem consequências, como a queda do preço das matérias-primas. E sobem os juros nos EUA. Ou seja, a direção do investimento estrangeiro vai mudar. Os EUA são um elefante na sala. Ele mexe o rabo e quebra quatro ou cinco peças de louça, e nós somos uma louça que está lá na sala. Hoje é o momento próprio para fazer essa inversão: dar para o setor externo aquela convicção que existia há três anos de que o Brasil é um país no qual as oportunidades de investimentos são as mais seguras.

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