Economia

Selic a 6% mostra BC confiante e pronto para próximo corte

Selic renovou sua mínima histórica nesta quarta; corte de 0,5 p.p. surpreendeu parte do mercado, que esperava redução menor, de 0,25 p.p.

Banco Central (Ueslei Marcelino/Reuters)

Banco Central (Ueslei Marcelino/Reuters)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 31 de julho de 2019 às 19h38.

Última atualização em 31 de julho de 2019 às 20h20.

São Paulo - O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), surpreendeu parte do mercado ao cortar em 0,50 ponto percentual (p.p.) a taxa básica de juros da economia, a Selic, que renovou sua mínima histórica, a 6% ao ano.

Parte dos economistas e analistas esperava um redução menor, de 0,25 ponto percentual, por conta, sobretudo, do discurso cauteloso que a autoridade monetária vinha adotando.

A Selic estava inalterada desde março de 2018. O anúncio desta quarta-feira (31) foi o terceiro sob o comando de Roberto Campos Neto.

Na leitura de Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, com a decisão, o BC mostra que vê uma melhora importante no balanço de risco de inflação e mostra confiança. “É como se ele dissesse que não precisa ir devagar, pois confia na sua estratégia”.

O impacto do corte na economia, no entanto, deve ser marginal: “impacta de alguma forma o mercado de crédito, a confiança do empresário, mas nossa fraqueza é muito mais estrutural do que por demanda”, diz Zeina.

A decisão da instituição foi acertada, segundo Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “De fato, as expectativas eram de uma inflação sob controle, sem se desviar da meta mesmo no cenário de corte de taxa, como se viu no relatório de inflação de junho”.

No comunicado oficial, o Copom ressaltou que as expectativas de inflação para 2019, 2020, 2021 e 2022 no Boletim Focus estão sempre abaixo do centro da meta, respectivamente, em torno de 3,8%, 3,9%, 3,75% e 3,50%.

Para o Vale, o comitê abre espaço para um novo corte de 0,5 p.p. na próxima reunião e talvez um possível 5% sendo alcançados esse ano. “A reforma da previdência ajuda nessa possibilidade, mas o que mais influencia na decisão do BC segue sendo um IPCA muito sob controle e a atividade ainda em recuperação muito frágil”, diz.

O comitê abre espaço para um novo corte, mas sem compromisso, segundo análise de Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs. "De uma forma astuta, o Copom sugeriu cortes de taxa adicionais, mas sem amarrar as próprias mãos ou sinalizar um compromisso firme para entregar mais cortes", diz.

A queda dos juros por si só não deve incentivar a economia, segundo André Perfeito, economista chefe da Necton, “mas trará efeitos benignos para a inflação de ativos, notadamente bolsa se valores e títulos públicos”, diz.

Inflação controlada

Em junho, o IPCA, que mede a inflação oficial no país, ficou em 0,01%, a menor taxa do ano até agora. 

Já nos últimos 12 meses, atinge 3,37%, abaixo do centro da meta estipulada pelo pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), de 4,25%. O intervalo de tolerância para a taxa de inflação vai de 2,75% a 5,75%.

Em relação à Selic, o Boletim Focus espera que a taxa termine o ano de 2019 em 5,5%.

Veja o comunicado do Copom na íntegra:

Em sua 224ª reunião, o Copom decidiu, por unanimidade, reduzir a taxa Selic para 6,00% a.a.

A atualização do cenário básico do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:

Indicadores recentes da atividade econômica sugerem possibilidade de retomada do processo de recuperação da economia brasileira. O cenário do Copom supõe que essa retomada ocorrerá em ritmo gradual;

O cenário externo mostra-se benigno, em decorrência das mudanças de política monetária nas principais economias. Entretanto, os riscos associados a uma desaceleração da economia global permanecem;

O Comitê avalia que diversas medidas de inflação subjacente encontram-se em níveis confortáveis, inclusive os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária;

As expectativas de inflação para 2019, 2020, 2021 e 2022 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 3,8%, 3,9%, 3,75% e 3,50%, respectivamente; e

No cenário com trajetórias para as taxas de juros e câmbio extraídas da pesquisa Focus, as projeções do Copom situam-se em torno de 3,6% para 2019 e 3,9% para 2020.

Esse cenário supõe trajetória de juros que encerra 2019 em 5,50% e permanece nesse patamar até o final de 2020. Também supõe trajetória para a taxa de câmbio que termina 2019 em R$/US$ 3,75 e 2020 em R$/US$ 3,80.

No cenário com juros constantes a 6,50% a.a. e taxa de câmbio constante a R$/US$ 3,75*, as projeções situam-se em torno de 3,6% para 2019 e 2020.

O Comitê ressalta que, em seu cenário básico para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Por um lado, (i) o nível de ociosidade elevado pode continuar produzindo trajetória prospectiva abaixo do esperado. Por outro lado, (ii) uma eventual frustração das expectativas sobre a continuidade das reformas e ajustes necessários na economia brasileira pode afetar prêmios de risco e elevar a trajetória da inflação no horizonte relevante para a política monetária.

O risco (ii) se intensifica no caso de (iii) reversão do cenário externo benigno para economias emergentes.  O Comitê reconhece que o balanço de riscos para a inflação evoluiu de maneira favorável, mas avalia que o risco (ii) ainda é preponderante.

Considerando o cenário básico, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, pela redução da taxa básica de juros para 6,00% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenário básico e balanço de riscos para a inflação prospectiva e é compatível com a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante para a condução da política monetária, que inclui o ano-calendário de 2020.

O Copom reitera que a conjuntura econômica prescreve política monetária estimulativa, ou seja, com taxas de juros abaixo da taxa estrutural.

O Copom reconhece que o processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira tem avançado, mas enfatiza que a continuidade desse processo é essencial para a queda da taxa de juros estrutural e para a recuperação sustentável da economia.

O Comitê ressalta ainda que a percepção de continuidade da agenda de reformas afeta as expectativas e projeções macroeconômicas correntes. Em particular, o Comitê julga que avanços concretos nessa agenda são fundamentais para consolidação do cenário benigno para a inflação prospectiva.

Na avaliação do Copom, a evolução do cenário básico e, em especial, do balanço de riscos prescreve ajuste no grau de estímulo monetário, com redução da taxa Selic em 0,50 ponto percentual. O Comitê avalia que a consolidação do cenário benigno para a inflação prospectiva deverá permitir ajuste adicional no grau de estímulo.

O Copom enfatiza que a comunicação dessa avaliação não restringe sua próxima decisão e reitera que os próximos passos da política monetária continuarão dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto Oliveira Campos Neto (Presidente), Bruno Serra Fernandes, Carlos Viana de Carvalho, Carolina de Assis Barros, Fernanda Feitosa Nechio, João Manoel Pinho de Mello, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso e Paulo Sérgio Neves de Souza.

*Valor obtido pelo procedimento usual de arredondar a cotação média da taxa de câmbio R$/US$ observada nos cinco dias úteis encerrados na sexta-feira anterior à reunião do Copom.

 

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