Economia

Se condenados pelo STF, bancos podem processar governo

Julgamento de processos envolvendo correção das cadernetas de poupança entre 1987 e 1991 pode levar os bancos a buscarem indenizações


	Caixa em uma agência bancária: grandes bancos têm afinado o discurso de que não podem ser condenados por terem apenas obedecido a lei
 (Akos Stiller/Bloomberg)

Caixa em uma agência bancária: grandes bancos têm afinado o discurso de que não podem ser condenados por terem apenas obedecido a lei (Akos Stiller/Bloomberg)

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Da Redação

Publicado em 21 de fevereiro de 2014 às 17h35.

São Paulo - O julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de processos envolvendo correção das cadernetas de poupança entre 1987 e 1991 pode levar os bancos a buscarem indenização do governo, afirmaram representantes do setor à Reuters.

Para evitar esse desfecho, o governo vem agindo em diversas frentes, mantendo encontros com representantes dos bancos, acionando a Advocacia Geral da União (AGU) e mantendo intenso corpo a corpo com o STF, tentando explicar-lhes os possíveis impactos de uma decisão amplamente favorável aos poupadores.

Os quatro processos coletivos, que demandam diferenças de correção monetária de depósitos que não repassaram integralmente as perdas com a inflação nos planos Cruzado, Bresser, Verão, Collor I e Collor II, deveriam ser apreciados pelo Supremo na semana que vem, mas na quinta-feira o julgamento foi adiado, ainda sem nova data.

Com a proximidade do julgamento, os grandes bancos têm afinado o discurso de que não podem ser condenados por terem apenas obedecido a lei ao aplicarem índices de correção da poupança mais baixos do que os usados até então.

De forma preliminar, os bancos a cada trimestre vêm fazendo provisões para eventuais perdas por ações individuais, mas não para as coletivas. Ao mesmo tempo, governo têm feito intenso corpo a corpo sobre o Supremo. O Banco do Brasil chegou a contratar como advogado ex-ministro do STF Eros Grau para defendê-lo na disputa.

Se o STF entender que os índices aplicados estavam errados, os bancos terão que devolver aos poupadores a diferença, mas não há consenso sobre os valores. Isso porque há variáveis ​​jurídicas fundamentais envolvidas no tema para as quais não há jurisprudência consolidada, afirmou a equipe do Credit Suisse liderada por Marcelo Telles, em relatório a clientes.


Não há consenso também sobre o alcance das ações civis públicas, a definição dos beneficiários e do período de cálculo de juros de mora. O impacto também vai depender de quantos poupadores vão efetivamente requerer indenização, percentual que os bancos estimam ser elevado.

Consultados, os bancos afirmaram que o assunto deve ser comentado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que não se manifestou até a publicação desta reportagem.

De R$23 bi a R$ 340 bilhões

Segundo estudo da área econômica do governo, os valores podem chegar a 150 bilhões de reais. Tais montantes assustam o governo não apenas porque os bancos estatais seriam os mais afetados. Do montante estimado, só a Caixa Econômica Federal ficaria com cerca de um terço. Outra parte relevante ficaria com o Banco do Brasil.

Os bancos temem que a conta seja ainda maior. Um estudo contratado pela Febraban para a consultoria LCA concluiu que, dependendo da decisão dos juízes, a conta pode ir de 23 bilhões a até 341 bilhões de reais. Para efeito de comparação, esse teto é mais do que o patrimônio líquido somado dos cinco maiores bancos no país --BB, Itaú Unibanco, Bradesco, Santander Brasil e Caixa.

Após ter visto o estudo da LCA, o próprio Credit Suisse revisou sua previsão anterior, de uma conta de até 26,5 bilhões de reais a ser paga pelos bancos, para 33 bilhões. As provisões feitas pelos bancos até agora, de cerca de 8,3 bilhões de reais, miram apenas ações individuais, afirmou o Credit.

Mas esse ainda pode não ser o final da história. Fontes do setor financeiro privado disseram à Reuters que os bancos poderiam acionar judicialmente o governo requerendo indenização, caso sejam condenados.

Por isso, o governo vem fazendo intenso corpo a corpo, não só com os bancos e com investidores estrangeiros, que vêm manifestando preocupação com o tema. Nesta sexta-feira, o presidente da Febraban, Murilo Portugal, reúne-se com representantes da Advocacia Geral da União, do Ministério da Fazenda e do Banco Central para discutir o assunto.


Além disso, o Ministério da Fazenda tem se encontrado frequentemente com ministros do Supremo para mostrar-lhes que a decisão pode criar até riscos ao sistema financeiro.

"Terrorismo"

Enquanto isso, para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), responsável por ações coletivas que reivindicam o ressarcimento aos poupadores, os bancos e o governo estão fazendo "terrorismo" para tentar influenciar os juízes sobre potencial risco ao sistema financeiro do país, caso decidam a favor dos poupadores. Pelas contas da entidade, a perda dos bancos seria de "apenas" 8,4 bilhões de reais, no máximo.

"Tivemos que desconstruir esse número astronômico que apresentaram para influenciar os ministros do STF", disse à Reuters a presidente do Conselho Diretor do Idec, Marilena Lazzarini.

Segundo ela, os bancos já conseguiram derrubar mais de mil ações ao conseguir que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) reduzisse, de 20 para 5 anos o prazo prescrição para propor execução individual. Isso invalida ações criadas após 1994, ano em que a maioria dos casos foram abertos.

"Além disso, mesmo com ganho de causa no STF, os poupadores terão que entrar com ação individual para provar que têm valores a receber", disse Marilena.

De todo modo, o adiamento da apreciação do assunto pelo STF dará aos bancos e ao governo um respiro. Não apenas por dar-lhes mais tempo, mas principalmente porque um evento importante na semana que vem pode mudar o rumo das coisas.

No dia 26, data em que o tema entraria na pauta do Supremo, o STJ vai julgar uma questão que poderá reduzir os valores devidos aos poupadores que têm processos tramitando na Justiça.

O STJ vai definir a partir de quando devem incidir juros de mora, se a partir da citação do réu ou quando o autor do processo entrou com a execução. Na prática, isso pode dar uma diferença de quase 200 por cento, calcula o Idec, que pediu que o caso seja retirado da pauta até o julgamento do STF.

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