Mansueto Almeida: saída de secretário do Tesouro Nacional poderia abrir a torneira dos gastos públicos? (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 14 de junho de 2020 às 19h50.
Última atualização em 15 de junho de 2020 às 11h58.
A notícia de que o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, está de saída do governo joga ainda mais pressão sobre a crise fiscal brasileira, afirmam analistas ouvidos pela Exame. Mansueto já teria afirmado ao ministro da Economia, Paulo Guedes, que deixará o governo entre julho e agosto e deverá ir para a iniciativa privada após cumprir uma quarentena de seis meses.
A notícia de sua saída foi antecipada pelo jornal O Globo e depois confirmada neste domingo por diversos veículos de imprensa. Mestre em Economia pela USP e doutor em políticas públicas Pelo MIT, Mansueto é o maior fiador do ajuste fiscal dentro do governo.
O secretário, quadro herdado por Bolsonaro da equipe de Michel Temer, já negociava a saída do governo desde o fim de 2019. Sua saída será efetivada num momento de pressão total sobre as contas públicas, acelerada pela pandemia do coronavírus e pela crise política que fez o presidente Jair Bolsonaro se aproximar do Centrão (o bloco de partidos fisiológicos conhecidos por trocar apoio por cargos em governos de diferentes orientações ideológicas).
"A pressão fiscal em cima do Ministério da Economia só vai aumentar por conta da pressão do Centrão e dos militares, por causa de investimento público", diz Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados. "Mansueto só ficaria se houvesse um sinal crível de de forte ajuste fiscal para os próximos anos, o que claramente não teremos. São muito preocupantes as dificuldades fiscais que teremos pela frente, com um ministério se enfraquecendo a olhos vistos".
O déficit primário esse ano deve chegar a 700 bilhões de reais, ou 7% do PIB, segundo Mansueto, com dívida bruta de 94% no final do ano. Ano passado o déficit foi de 61 bilhões de reais, ou 0,9% do PIB. A situação é ainda mais dramática dada a prevista queda de 6% no PIB por causa da crise do coronavírus.
Segundo Vale, a saída de Mansueto, se confimada, coloca em xeque a política econômica de Paulo Guedes. "O ministro já tinha um projeto frágil por conta do excesso de ambição da época da eleição. Pouca coisa relevante foi aprovada além da reforma da previdência. Agora, fica ainda pior com as pressões que virão", diz Vale.
Em entrevista ao site Brazil Journal, publicada neste domingo, Mansueto afirmou que sua saída não muda o compromisso do governo com o ajuste fiscal que, na sua opinião, depende da posição do presidente, de Guedes, e do apoio no Congresso. "O ajuste fiscal não se esgotará nesse governo. O próximo presidente terá que continuá-lo ao longo de todo o seu mandato", disse..
Uma dúvida é como a saída de Mansueto afeta a euforia da bolsa. "Ele já estava querendo sair há um tempo, e parece que fará uma transição coordenada. O mercado pode até querer dar o benefício da dúvida que Guedes vá conseguir colocar um nome relevante alinhado à política fiscal responsável para não ter stress em curva de juros ou dólar", diz Bruno Lima, analista de renda variável da Exame Research. "Se entrar alguém pior que ele, seria mostrar de que o viés gastador, de aproveitar a pandemia para abrir a torneira, defendido pelo Centrão, ganhou força. Aí pode haver uma piora no cenário. Mas Bolsonaro vem dando toda a sinalização de que está alinhado com Paulo Guedes".
"Como a situação fiscal está sob pressão, a questão é quem vai substituí-lo, uma vez que é esperado um aumento da taxa de juros. Portanto, essa pessoa vai ter que gerir os impactos dos juros no longo prazo. E isso, obviamente, cria um certo desconforto", diz André Perfeito, economista-chefe da corretora Necton.
Celso Toledo, economista da consultoria LCA, diz que a saída de Mansueto se soma a uma série de baixas recentes do governo. “As pessoas que deixam o governo ou que são demitidas tendem a ter competência média maior do que o conjunto que fica. Não vimos uma substituição para melhor nem no Ministério da Educação. Fica a impressão de que competência é um problema”. O próximo da lista, o último grande esteio do governo para o mercado financeiro, é o próprio Guedes.