Mercado: uma das principais causas de tantas pessoas ainda trocarem com frequência de emprego são os benefícios que encontram, como o seguro-desemprego
Reuters
Publicado em 7 de fevereiro de 2017 às 17h52.
São Paulo - A recente disparada do desemprego no Brasil não foi suficiente para reduzir na mesma proporção a rotatividade de mão de obra no mercado de trabalho, que se mantém no patamar de uma década atrás e prejudica o ganho de produtividade das empresas.
Uma das principais causas de tantas pessoas ainda trocarem com frequência de emprego são os benefícios que encontram, como o seguro-desemprego, mesmo após investidas do governo para atacar fraudes e dificultar seu acesso.
A rotatividade do mercado de trabalho encerrou dezembro passado em 4,71 pontos percentuais, recuando ao mesmo patamar de 2007, calculou a consultoria Tendências a pedido da Reuters com base nos dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho.
Nesse período, no entanto, as taxas de desemprego estavam bem diferentes. Em 2007, segundo a consultoria Tendências, o desemprego médio simulado para a Pnad Contínua --a pesquisa do IBGE tem dados somente a partir de 2012-- era de 9,2 por cento, bem abaixo dos 11,5 por cento do ano passado.
O auge da rotatividade, no início desta década, quando o Brasil tinha situação de pleno emprego, rondou os 7 pontos percentuais.
"É curioso que, apesar do desemprego mais elevado, a rotatividade não tenha recuado tanto", afirmou a economista da Tendências e responsável pelo cálculo, Alessandra Ribeiro.
O cálculo da rotatividade leva em conta a soma da quantidade de trabalhadores admitidos e desligados do Caged em relação ao total de brasileiros empregados com carteira de trabalho assinada.
Em dezembro, por exemplo, o Brasil teve 869 mil admissões, 1,331 milhão de desligamentos, para um estoque de 46,689 milhões de trabalhadores.
Para o conjunto da economia brasileira, a elevada rotatividade faz com que as empresas fiquem menos competitivas, o que se torna mais um entrave para o crescimento do País.
"A elevada rotatividade gera um comportamento ruim nos agentes da economia. Na maioria dos casos, há menos capacitação dos trabalhadores e as empresas se dispõem a ensinar menos", afirmou o gerente-executivo de Pesquisas da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato da Fonseca.
"Esse quadro dificulta o crescimento, a economia e a melhora da produtividade do país."
Os especialistas encontram na legislação trabalhista a principal explicação para a elevada rotatividade no emprego do país, mesmo após as mudanças legais feitas ainda no governo da ex-presidente Dilma Rousseff para dificultar o acesso aos benefícios, como do seguro-desemprego, e reduzir o custo fiscal.
"Com os benefícios do FGTS e do seguro-desemprego, em alguns casos, passa a ser uma vantagem para o trabalhador deixar a empresa", diz o professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA), da Universidade de São Paulo (USP), José Pastore.
Hoje, quando uma empresa demite um funcionário sem justa causa, tem de pagar multa de 40 por cento sobre o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) ao trabalhador.
No caso do seguro-desemprego, atualmente o brasileiro precisa trabalhar o mínimo de 12 meses dos últimos 18 com carteira assinada para ter acesso ao benefício pela primeira vez. Antes, eram necessários apenas seis meses.
O mercado de trabalho também está na pauta do governo do presidente Michel Temer que, segundo uma fonte com conhecimento sobre o assunto, estuda novas medidas que envolvem os benefícios, como seguro-desemprego.
O governo também enviou ao Congresso projeto de lei para uma reforma trabalhista, como a prevalência do negociado entre empregados e patrões. Centrais sindicais já manifestaram oposição às medidas.
"Apesar de algumas medidas adotadas pelo governo, enquanto a multa de 40 por cento do FGTS permanecer para os casos de demissão, ainda não está claro se a rotatividade vai ser reduzida quando o mercado de trabalho reaquecer", afirma o professor do Insper Sergio Firpo.
Formada em artes cênicas, Jeniffer Luderitz, de 30 anos, ilustra bem o grupo de trabalhadores que resolve deixar o emprego para se manter com a renda vinda dos benefícios. No fim de 2016, ela pediu para ser demitida de uma rede de cinema.
"Sentia que fazia o trabalho de duas pessoas e pedi para que eles me mandassem embora. Com a renda do seguro-desemprego, consigo me manter por cinco meses, mas espero arrumar um emprego novo até lá", afirmou ela, enquanto esperava na fila para receber seu seguro-desemprego.
No geral, os trabalhadores que mais trocam de empregos são os que têm poucos anos de estudo e de menor renda, o que dificulta ainda mais a produtividade almejada pelas empresas.
Isso ocorre porque o valor mais baixo pago pelo seguro-desemprego é de um salário mínimo, o que permite ao trabalhador praticamente manter a estabilidade da renda mensal mesmo sem emprego.
Levantamento feito pela CNI no ano passado mostrou que 20 por cento dos trabalhadores que cursaram até a 4ª série do Ensino Fundamental tiveram mais de dez trabalhos com e sem carteira de trabalho assinado na sua trajetória profissional.
Entre os brasileiros com curso superior, eram apenas 8 por cento nessa situação.