Economia

Retomada desigual: só 4 de 14 setores já recuperaram perdas, aponta estudo

Forçados pela crise, os empresários tomaram crédito, cortaram funcionários e ampliaram a ociosidade de suas fábricas durante a pandemia

Economia: início da retomada tem sido extremamente desigual (Leo Caldas/Exame)

Economia: início da retomada tem sido extremamente desigual (Leo Caldas/Exame)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 14 de outubro de 2020 às 13h07.

Última atualização em 14 de outubro de 2020 às 13h20.

O impacto negativo na economia provocado pela covid-19 parece começar a se dissipar. Mas o início da retomada tem sido extremamente desigual. Estudo realizado pelo Itaú Unibanco, obtido com exclusividade pelo Estadão, indica que hoje apenas quatro dos 14 setores analisados conseguiram superar a freada brusca gerada pela pandemia no nível de atividade do país.

Por esse termômetro da retomada, apenas o agronegócio, algumas áreas da construção civil, o setor de alimentos e nichos que operam com tecnologia, como os aplicativos de entrega e empresas de vendas online, convivem hoje com demanda acima ou similar às registradas no início do primeiro trimestre — antes, portanto, da adoção de medidas de restrição.

No meio do caminho, no entanto, já há setores que ensaiam recuperação, como o de vestuário e de eletroeletrônicos, mas ainda sem conseguir se reorganizar para dar conta da demanda, que nesses casos esquentou antes do esperado pelo mercado.

Forçados pela crise, os empresários tomaram crédito, cortaram funcionários e ampliaram a ociosidade de suas fábricas, esperando por longa e duradoura queda nas encomendas. Mas após chegar ao "fundo do poço", em abril, o consumo voltou a dar sinais de aquecimento em maio, em boa parte beneficiado pelo dinheiro do auxílio emergencial. Isso pegou as empresas com estoques baixos e capacidade limitada de reação, já que naquele momento operavam com 50% a 60% da capacidade do primeiro trimestre.

"O mercado foi pego de surpresa. E o resultado é que, temporariamente, a demanda por itens como celulares, geladeiras e produtos têxteis supera a capacidade de produção, o que pode levar a riscos temporários de desabastecimento, com impacto imediato no aumento de preços", afirma o economista do Itaú Unibanco Pedro Renault, responsável pelo relatório.

Descendo até o ponto mais frio do termômetro da recuperação, aparecem a cadeia de turismo, as companhias aéreas e o ramo automotivo. "Nossa conclusão é que, neste momento, o Brasil vive uma retomada assimétrica na atividade econômica, depois de chegar ao 'fundo do poço' por volta de abril. Mas é uma retomada que, apesar de surpreender pela velocidade, é ainda repleta de dúvidas", afirma o economista.

Recuperação

O agronegócio lidera a recuperação. O setor, na verdade, não viu crise na pandemia, favorecido por uma combinação de robustez da demanda global — puxada principalmente pela China —, desvalorização do real, que se aproxima de 40% neste ano, e safra recorde na produção de grãos.

Na sequência, a indústria e varejo de alimentos para consumo em casa tiveram um segundo trimestre de crescimento forte ante 2019 principalmente em itens básicos, como massas e biscoitos. Os dois segmentos foram beneficiados pelo auxílio emergencial, que deverá injetar 321,8 bilhões de reais neste ano na economia, com foco nas pessoas mais vulneráveis.

"Entre os setores quentes, também nos chama a atenção a construção civil, com uma recuperação puxada principalmente pela demanda habitacional, tanto em venda de imóveis novos quanto na reforma dos imóveis antigos, com impactos fortes na demanda da indústria de materiais de construção", aponta a pesquisadora Silvia Matos, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

Para ela, a aceleração das reformas durante a pandemia é também reflexo do auxílio emergencial. "Nas classes mais baixas, esse tipo de recurso extra é muito direcionado para a melhoria da habitação. E esse movimento não foi compreendido lá atrás pelo mercado", afirmou a economista.

Minha Casa Minha Vida

Da mesma forma, a aquisição de imóveis novos também ficou concentrada nos produtos mais econômicos, que integram a faixa do Minha Casa Minha Vida. Dados do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP) apontam que, na capital paulista, as vendas já superam os níveis registrados antes da pandemia.

Em agosto, segundo o Secovi-SP, foram vendidos 6.350 apartamentos novos, 46,3% mais do que em julho passado e 35% acima de agosto de 2019. Já no acumulado dos 12 meses encerrados em agosto, foram vendidas 48.885 unidades, alta de 17,1% ante os 12 meses anteriores.

Acompanhe tudo sobre:AgronegócioComércioConstrução civileconomia-brasileiraIndústriaPandemia

Mais de Economia

Reforma da Previdência: o que pode mudar na aposentadoria de servidores se Congresso unificar regras

Os argumentos de Haddad e Tebet para convencer Lula da necessidade de cortar gastos

Moody's: Argentina levará tempo para atingir “grau de investimento"

Benefícios fiscais estaduais quase triplicam em cinco anos e devem atingir R$ 267 bi em 2025